Outubro de 2010
Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ISSN 1806-2776
 
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MONOGRAFIAS

Divulgação científica e desenvolvimento regional
A experiência do Núcleo de
Jornalismo Científico da UFMS

Por Greicy Mara França, Antônio Carlos Sardinha e Lairtes Chaves Rodrigues Filho*

RESUMO

A Agência de Jornalismo Científico surge no contexto na necessidade da divulgação científica para o desenvolvimento do Estado e das pesquisas, dentro de um espaço estratégico de comunicação, com pautas e linguagem adequada; que não apenas seja um centro de referencia e divulgação na relação jornalistas-pesquisadores, mas também na relação ciência-sociedade.

Imagens: Reprodução

Divulgar a ciência através do jornalismo científico é garantir o acesso da sociedade às inovações e acontecimentos que implicam no desenvolvimento local. O que se propõe aqui é uma estratégia de comunicação específica para dar visibilidade para a pesquisa científica e geração de novas tecnologias e a inovação à luz da popularização do conhecimento produzido no Estado. A agência também desenvolve campanhas e ações de educação para a população na área da saúde, prevenção de doenças, preservação ambiental e alfabetização científica.

PALAVRAS-CHAVE: Jornalismo Científico / Divulgação Científica / Desenvolvimento

1. Introdução

O Estado de Mato Grosso do Sul tem se desenvolvido em matéria de pesquisas científicas que alcançam desde os contextos mais teóricos até aplicações em manejo ambiental e genético. Entretanto vê-se que não existe divulgação destas importantes pesquisas que configuram não apenas o presente, mas o futuro do desenvolvimento científico, sócio-econômico e político do Estado.

As inovações técnicas de produção e reprodução da informação têm determinado parte do conjunto de aptidões necessárias ao comunicador para a produção de conteúdo informativo. Se antes o processo de mutação da tecnologia de produção e da distribuição da informação se estendia lentamente durante séculos, hoje a mudança é quase cotidiana.

Para o usuário comum, que muitas vezes nem percebe quanta tecnologia utiliza em seu cotidiano, isso geralmente se reflete em maior comodidade. Porém, para os profissionais de informação essa vertiginosa aceleração tecnológica é muitas vezes motivo de ansiedade.

Não é tarefa fácil manter-se minimamente atualizado em relação aos recursos de equipamentos, tecnologias e softwares cada vez mais inovadores e robustos, e mais difícil ainda é explorar com inteligência e criatividade as possibilidades desses recursos.

É comprovado na literatura o alto o índice de subutilização de tecnologias que, em tese, podem colaborar com uma necessária democratização do acesso à informação.

Atualmente, o mundo vive em uma Sociedade da Informação, onde a exclusão está no conhecimento adquirido pelas pessoas. A presente sociedade está baseada em tecnologias de informação e de comunicação que envolvem a aquisição, o armazenamento, o processamento e a distribuição da informação por meios eletrônicos, como rádio, televisão, telefone e computadores, entre outros.

Essas tecnologias não transformam a sociedade por si só, mas são utilizadas pelas pessoas em seus contextos sociais, econômicos e políticos, criando uma nova comunidade local e global: a Sociedade da Informação, que, em síntese, supõe que sejam observados princípios e metas de inclusão e eqüidade social e econômica, de diversidade e identidade culturais, de sustentabilidade do padrão de desenvolvimento, de respeito às diferenças, de equilíbrio regional, de participação social e de democracia política (MCT, 2000).

O Programa Sociedade da Informação, criado em 15 de dezembro de 1999, tem como objetivo fomentar ações para a utilização de tecnologias de informação e comunicação, contribuindo para que a economia do país tenha condições de competir no mercado global e para que todos os brasileiros façam parte da Sociedade da Informação.

Para tanto, as responsabilidades sociais são divididas entre o governo, a iniciativa privada e a sociedade civil, sendo que as sete linhas de ação estratégica para o Brasil são: Mercado, Trabalho e Oportunidades; Universalização de Serviços para a Cidadania; Educação na Sociedade da Informação; Conteúdos e Identidade Cultural; Governo ao Alcance de Todos; P&D, Tecnologias-chave e Aplicações; e Infraestrutura Avançada e Novos Serviços.

Após uma análise do desempenho da Ciência & Tecnologia ao longo dos últimos anos, é possível perceber avanços significativos nas pesquisas científicas desenvolvidas em Mato Grosso do Sul – tanto no aspecto do número de projetos quanto no volume de recursos empregados nesta área. Há, contudo, um descompasso entre o fortalecimento da C&T e o reconhecimento público dos esforços empreendidos pelo Estado neste campo. A raiz deste problema é a falta de uma prática cotidiana de tornar a pesquisa como pauta do noticiário.

2. Fundamentação teórica

Segundo Hall Et. Al. (1973/1993), a identificação e a contextualização é um dos processos mais importantes, através do qual os acontecimentos são ‘tornados significativos’ pela mídia Um acontecimento só faz sentido se for possível colocar num âmbito de conhecidas identificações sociais e culturais. A ciência enquanto conhecimento sistêmico posiciona-se em evidência como agente do desenvolvimento nas mais diversas esferas; entretanto, para aqueles que dela subsistem ou integram: os pesquisadores.

A população tende a não se identificar com a produção do conhecimento científico e da tecnologia, importando-se apenas com a tecnologia de prateleira, pronta para o consumo. Resultado: A pauta científica não encontra espaço como acontecimento significativo no interesse da sociedade de massa.

Conforme Traquina (2005), o jornalismo é sobremaneira um ato político e, possui como função social, a produção de notícias e o tratamento de informações que resultem em impacto, alteração de realidade e alteração de consciência, na formação do pensar crítico.

Em contrapartida, o próprio Traquina (2003) afirma que, o papel educacional da mídia torna-se primordial na construção de uma sociedade dita, da informação. Ensinar ao cidadão que o desenvolvimento de seu locus depende e inter-relaciona-se à produção científica, em todas as abordagens, qualifica-se como necessidade no mundo globalizado, influenciado porventura pela atuação da mídia global.

C & T tem conseqüências comerciais, estratégicas, burocráticas, e igualmente na saúde pública; não nas margens, mas no âmago desses componentes essenciais do processo político. Democracia participativa requer cultura científica do eleitorado, para que este seja capaz de apoiar, ou não, as propostas e decisões de seus representantes, e de endossar ou não sua eleição. (...) o acesso às informações sobre C & T é fundamental para o exercício pleno da cidadania e, portanto, para o estabelecimento de uma democracia participativa, na qual grande parte da população tenha condições de influir, com conhecimento, em decisões e ações políticas ligadas a C & T. (Cf. OLIVEIRA, 2002:13).

Possibilitar à população o acesso a informações científicas, não apenas relaciona-se ao jornalismo enquanto ato político de formação de consciência e qualificação da atuação do cidadão, como também se configura como garantia do direito humano à informação e a comunicação. Sem informação e transparência o povo é impedido de exercer o poder estatal, do qual é o único titular (Constituição Federal, art. 1º, parágrafo único). O direito à informação, segundo Weichert (2006) o direito à informação, compreende:

a) o direito de informar;

b) o direito de se informar; e

c) o direito de ser informado, ou o direito à verdade.

A UNESCO compreende como desafio na área de comunicação e informação, nas políticas em Ciência e Tecnologia a nível global, aprimorar a estrutura dos centros de formação de jornalistas e as ferramentas à disposição das redações para a qualificação da cobertura e, especificamente, como desafios para o país, o baixo envolvimento dos públicos-alvo na definição das políticas a eles dirigidas, informação em linguagem e conteúdos inapropriados não atingem os públicos-alvo específicos (especialmente jovens). Grandes desafios na disseminação adequada da mensagem sobre temas sensíveis (como HIV/Aids) para populações específicas.

É dentro dessa perspectiva que foi pensada a proposta de construção do Núcleo de Jornalismo Científico pelo Departamento de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. A proposta de criar um programa de popularização da ciência no estado, a partir do ensino e da pesquisa em jornalismo, estrutura-se tendo como base a implantação de um núcleo que permita transformar a pesquisa científica em pauta no jornalismo regional, contribuindo para a superação dos desafios técnicos e éticos por parte do jornalismo, em busca de uma cobertura qualificada para os temas ligados à ciência e tecnologia. (Cf. FRANÇA; SARDINHA, 2008:03).

Propiciar o espaço para a divulgação do desenvolvimento científico em Mato Grosso do Sul, é um ato político e de garantia dos direitos, tornando real o compromisso e o posicionamento da universidade dentro desse processo de desenvolvimento.

A promoção da educação científica da população pela atuação da mídia, dentro do compromisso social do jornalismo, qualifica-se como agente da conscientização coletiva no desenvolvimento regional; interferindo na educação de massa que induz a valorização da tecnologia como processo tecnicista, concreto na tecnologia de consumo imediato.

Fig 1. Interface do site do Núcleo de Jornalismo Científico, disponível em: www.cienciaenoticia.com.br.

3. A relação ensino-pesquisa-extensão

A Agência de Jornalismo Científico integra de maneira direta o “tripé” universitário ensino-pesquisa-extensão, considerando que ao mesmo tempo em que é laboratório de ensino da prática jornalística e relaciona-se a disciplina curricular de Jornalismo Científico, oferecida ao sétimo semestre do curso de comunicação social – Habilitação em Jornalismo; posiciona-se como núcleo de pesquisas e estudos comparativos na abordagem das pautas relacionadas à ciência e tecnologia no estado; utilizando-se da mesma deixa para atuar como espaço de divulgação da produção científica e do desenvolvimento tecnológico no e do estado, oferecendo informações e alfabetização (senão consciência) científica a população; e espaço de relacionamento e aproximação do pesquisador com a sociedade na apresentação-divulgação e, prospectiva valorização, de seu trabalho para o desenvolvimento sócio-econômico, cultural, educacional e tecnológico de Mato Grosso do Sul.

Para atingir a comunidade, a Agência capacitará professores de ciências de escolas públicas no uso das matérias do site no ensino da disciplina, agindo no desenvolvimento e na alfabetização científica de alunos e docentes; além de realizar campanhas de preservação ambiental e prevenção de doenças com o apoio de profissionais das respectivas áreas.

4. Da implantação à prática

Inicialmente, durante o processo de implantação do Núcleo de Jornalismo Científico, a equipe era composta por:

Fig. 2. Entrevista com o Grupo de Pesquisa em Educação e Mercado da UFMS.

Professora Drª. Greicy Mara França – coordenadora do projeto e pesquisadora; Prof.ª Dr.ª  Daniela Cristiane Ota – pesquisadora; Prof. José Márcio Licerre – pesquisador; Jornalista Msc. David Trigueiro dos Santos – pesquisador; Jornalista Antonio Carlos Sardinha – pesquisador; Jornalista Tarcísio Saldívar Silveira – pesquisador; Acadêmico Lucas Marinho Mourão – iniciação científica e acadêmica Fernanda Lopez Athas – iniciação científica.

O projeto ainda contava com a participação de profissionais de outras áreas ligadas à construção de softwares e consultores em áreas como gestão de conteúdo.

Hoje, com o Núcleo implantado, e em etapa de finalização do Laboratório de Jornalismo Científico, partiu-se para a segunda fase do projeto: a construção da Agência de Jornalismo Científico, da qual a equipe compõe-se da Prof.ª Dr.ª Greicy Mara França, coordenadora e pesquisadora, Prof.ª Dr.ª. Daniela Ota, colaboradora; Jornalista Ocimar Santiago, editor-chefe; Acadêmico Lairtes Chaves Rodrigues Filho, bolsista de extensão e repórter; Acadêmico Ronaldo Aquino, bolsista-permanência e repórter; Acadêmica Mayara Martins, repórter.

Além de estabelecer-se como pioneira na elaboração de notícias científicas especializadas que cumprem o papel de jornalismo científico, divulgação científica e popularização da ciência; o Núcleo é vanguarda na pesquisa em comunicação científica e ambiental, agindo diretamente sobre o Pantanal, o desenvolvimento científico na região de fronteira e em todo o estado.

O conteúdo tem atualização semanal. Além de apresentar o tratamento jornalístico sobre pautas do cotidiano da produção científica local, a proposta é sugerir em pautas os caminhos para o acesso às fontes de informação.

A difusão científica está inserida em um cenário de desafios para o fazer jornalístico que presume a qualificação da cobertura para temas ligados à C&T, a partir de estratégias que começam com a formação de uma cultura científica por meio da imprensa. Em plena sociedade da informação, a tarefa exigida dos jornalistas é contribuir para a popularização do saber científico por meio de um trabalho que inclui não só a divulgação, mas a gestão de conhecimento que incorporado ao cotidiano da sociedade abre precedentes para um processo ainda mais amplo de desenvolvimento local pautado pela lógica da democratização e participação pela via do conhecimento acumulado e produzido pelas políticas públicas de financiamento científico. (Cf. FRANÇA; SARDINHA, 2008:12).

5. Considerações finais

A cobertura de ciência e tecnologia não apenas perpassa pela produção jornalística de qualidade, como remete diretamente ao desenvolvimento regional de todos os setores da sociedade.

Pela experiência da Agência de Jornalismo Científico, ainda em execução, e portanto submissa as alteridades do processo, percebemos a necessidade da região pela informação científica bem elaborada, de modo a atingir desde a esfera da divulgação das pesquisas como forma de feedback para a sociedade, até o jornalismo científico especializado, que oferece crítica e reflexão com todos os critérios e métodos do jornalismo em sua produção.

Ao atuar na consultoria científica de comunicação na realização das campanhas de saúde, age necessariamente no âmbito da popularização da ciência, como estratégia de promover a saúde pela prevenção.

Ao atuar na pesquisa de comunicação científica e ambiental, atua da disseminação científica entre os pares, no caso de publicações e apresentações das pesquisas em congressos e eventos.

O Núcleo de Jornalismo Científico, não apenas possibilita a integração de ensino-pesquisa-extensão como laboratório de curso, mas também atua das quatro esferas da relação mídia-ciência.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBOSA FILHO, A.; CASTRO, C.; TOME, T. Mídias digitais: convergência tecnológica e inclusão social. São Paulo: Paulinas, 2005.

BORDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Difel, 1989.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 out. 1988.

FRANÇA, G. M.; SARDINHA, A. C. “Núcleo de Jornalismo Científico: implantação de programa para a popularização da ciência”. In: XXXI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Natal/RN, 2-6 set. 2008.

HALL, S. (1973). “The social production of news: mugging in the media”. In: COHEN, S.; YOUNG, J. (Ed.). The manufacture of news. London: Constable & Beverlly Hills, 1993. Apud: TRAQUINA, N. (Op. Cit.).

OLIVEIRA, F. Jornalismo científico. São Paulo: Contexto, 2005.

TRAQUINA, N. O estudo do jornalismo no século XX. São Leopoldo: Unisinos, 2001.

___________. Teorias do jornalismo – porque as notícias são como são. Florianópolis: Insular, 2005. Vol. 1. 2ª Ed.

UNESCO. United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. “Desafios e estratégias em comunicação e informação no Brasil”. Unesco, S/r, S/d. Disponível em: http://www.unesco.org/pt/brasilia/communication-and-information. Acesso em: 12 mar. 2010.

VILAS BOAS, S. Formação & informação científica: jornalismo para iniciados e leigos. São Paulo: Summus, 2005.

WEICHERT, M. A. “Informação (direito à)”. S/r, 2006. Disponível em: http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-index.php?page=Informa%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 15 mar. 2010.


*Greicy Mara França é doutora em comunicação social e professora adjunta da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Antônio Carlos Sardinha é jornalista graduado pela UFMS e mestrando em comunicação pela UNESP. Lairtes Chaves Rodrigues Filho é jornalista graduado pela UFMS e bolsista de extensão.

 

 







Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro | ISSN 1806-2776 | Edição 13 | Outubro | 2010
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