Outubro de 2010
Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ISSN 1806-2776
 
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ARTIGOS

Relátorio MacBride – 30 anos
Concentração midiática, mídia alternativa e Internet

Por Laércio Torres de Góes*


RESUMO

A concentração dos grandes meios de comunicação e as desigualdades sociais e tecnológicas, acentuadas pela globalização, já foram temas do “Relatório MacBride – um mundo, muitas vozes”, [1] publicado pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), em 1980. Muitas das avaliações do relatório, apesar de terem passados três décadas, são atuais e pertinentes e merecem ser revisitadas. Este artigo busca demonstrar a atualidade do Relatório, principalmente, analisando a concentração midiática e o fortalecimento da mídia alternativa através das possibilidades oferecidas pela Internet.

Reprodução

Edição francesa do relatório.

PALAVRAS-CHAVE: Relatório MacBride / Concentração Midiática / Mídia Alternativa

 1. Introdução

O documento foi elaborado pela Comissão Internacional para Estudos dos Problemas da Comunicação, presidida pelo irlandês Sean MacBride, fundador da Anistia Internacional, prêmio Nobel e prêmio Lênin da Paz. O grupo era formado por 16 integrantes com representação de todos os continentes e composto em maioria por membros vindos de países do terceiro mundo ou em vias de desenvolvimento, incluindo personalidades como Gabriel Garcia Márquez, Juan Somavía e Betty Zimmerman.

O Relatório MacBride nasce em um contexto de crescente questionamento da ordem vigente internacional, principalmente, em relação à concentração midiática dos fluxos de comunicação. Em 1976, realizou-se em Colombo, capital do Sri Lanka, a quinta conferência dos países não-alinhados quando foi lançada definitivamente a ideia de uma “nova ordem mundial da informação e comunicação” (NOMIC), como um complemento indispensável para o surgimento da “nova ordem econômica mundial”, incorporada em 1978 aos programas da Unesco e da Assembleia das Nações Unidas (MATTELATT, 2001).

O alvo principal das discussões sobre os desequilíbrios comunicacionais dos países não-alinhados foram as quatro agências de notícias que concentram boa parte das informações destinadas ao público mundial. As duas principais agências europeias, a Agence France Presse (AFP) e a britânica Reuters, e as duas agências americanas, a Associated Press (AP) e a United Press International (UPI). As acusações contra estas agências desencadearam uma série de ataques na imprensa ocidental, mesmo na mídia comercial dos países do Terceiro Mundo, que interpretaram como um perigo à liberdade de imprensa e uma ameaça ao princípio do livre fluxo da informação (MATTELART, 2001).

Depois de mais de dois anos de trabalho, no Relatório MacBride constatou-se que o fluxo de informações se dava de forma ordenada e concentrada nos sentidos Norte/Sul e Oeste/Leste – explicitando a divisão do mundo em termos de pobreza e ideologia. Era primeira vez que um documento, legitimado por uma instituição das Nações Unidas, dava visibilidade aos desequilíbrios estruturais no campo da comunicação e propunha algumas sugestões para solucioná-los. Foi a primeira visão estrutural crítica sobre a ordem cultural e comunicacional emitida por uma instituição internacional e também a primeira a tratar os problemas de comunicação em sua dimensão histórica (MATTELART, 2005; 2006).

 O documento focava a exclusão midiática de grupos, comunidades, povos e regiões e fazia um diagnóstico sobre a problemática da comunicação no mundo contemporâneo, propondo soluções utópicas para reduzir as desigualdades tecnológicas, os desequilíbrios informativos e as carências do conhecimento existentes no planeta (MELO, 2005). Além disso, legitimava as demandas de uma nova ordem mundial da informação e da comunicação, desafiando as lógicas de concentração do poder informacional e a falta de igualdade nas transferências de tecnologia (MATTELART, 2006).

O Relatório MacBride conclui apresentando à comunidade internacional onze princípios básicos, tidos como fundamentais para a consolidação de uma nova ordem internacional da informação. São eles:

(1) Fim dos desequilíbrios e desigualdades que caracterizam a situação vigente;

(2) eliminação dos efeitos negativos de determinados monopólios, públicos ou privados, e a excessiva concentração de poder;

(3) remoção dos obstáculos internos e externos para um livre fluxo e mais ampla e equilibrada disseminação das informações e ideias;

(4) pluralidade de fontes e canais de informação; liberdade de imprensa e de informação;

(5) liberdade para os jornalistas e todos os profissionais nos meios de comunicação;

(6) liberdade inseparável da responsabilidade;

(7) preparação dos países em desenvolvimento para buscarem melhoras em suas próprias nações, sobretudo no que diz respeito à aquisição de equipamentos próprios;

8) capacitação de pessoal, recuperação da infraestrutura, além de tornarem os meios de informação e de comunicação sintonizados com suas próprias aspirações e necessidades;

(9) compromisso sincero dos países desenvolvidos para ajudar os demais a alcançar esses objetivos;

(10) respeito à identidade cultural de cada povo e ao direito de cada nação para informar o público internacional sobre seus interesses, aspirações e respectivos valores sociais e culturais;

(11) respeito aos direitos de todos os povos para participar de intercâmbios de informação, baseando-se na igualdade, justiça e benefícios mútuos e, respeito aos direitos da coletividade, assim como de grupos étnicos e sociais, para que possam ter acesso às fontes de informação e participar ativamente dos fluxos de comunicação.

Não satisfeitos com as conclusões do relatório, os Estados Unidos, de Ronald Reagan, e o Reino Unido, de Margaret Thatcher, reagiram fortemente taxando-o de meramente político e se retiraram da Unesco em 1985. Com o predomínio das ideias neoliberais e a oposição dos americanos e britânicos, a Unesco foi desqualificada como fórum competente para sinalizar os problemas mundiais da comunicação e ficou sem recursos suficientes para implementar as metas prioritárias da NOMIC. Mesmo assim, a essência da avaliação do Relatório MacBride continuou sendo preservada por entidades culturais e não-governamentais atuantes em várias partes do mundo (MELO, 2008).

Muitas das avaliações do relatório, apesar de três décadas de publicado, são atuais e pertinentes e merecem ser revisitadas, principalmente, com o fortalecimento da mídia alternativa através das possibilidades oferecidas pela Internet. Há muitos pesquisadores que consideram que deva ser reabilitado pelo seu caráter premonitório (MASMOUDI, 2005). Melo (2008) constata uma reavaliação do documento em nossos dias quando há um reagrupamento de forças que antes estavam unidas no bloco dos países não-alinhados. Existe um reforço do multilateralismo com a criação do G-20 e a articulação do eixo Sul-Sul, impulsionados pela diplomacia brasileira, sinalizando uma “ordem internacional alternativa” (MELO, 2008).

2. A concentração midiática e o Relatório MacBride

As assimetrias resultantes da oligopolização das indústrias de informação e entretenimento permanecem. Os Estados Unidos ficam com 55% das receitas mundiais geradas por bens culturais e comunicacionais; a União Europeia, com 25%; Japão e Ásia, com 15%; e a América Latina, com apenas 5%. A mídia global está nas mãos de alguns conglomerados, que veiculam dois terços das informações e dos conteúdos culturais disponíveis no planeta. São proprietários de estúdios, produtoras, distribuidoras e exibidoras de filmes, gravadoras de discos, editoras, parques de diversões, TVs abertas e pagas, emissoras de rádio, revistas, jornais, serviços online, portais e provedores de Internet, vídeos, videogames, jogos, softwares, CD-ROMs, DVDs, equipes esportivas, megastores, agências de publicidade e marketing, telefonia celular, telecomunicações, transmissão de dados, agências de notícias e casas de espetáculos (MORAES, 2004).

Desde a publicação do Relatório MacBride, a atuação das agências de notícias continua com a mesma força e abrangência. São organizações que atuam e operam globalmente na produção, venda e distribuição de material jornalístico. Um pequeno grupo que funciona como cartel e é responsável pela seleção e organização das informações para os meios de comunicação (jornais, rádio, redes de televisão e provedores online), instituições financeiras, governos e indivíduos ao redor do mundo. As grandes agências desempenham o papel, de certo modo, de selecionador (gatekeeper) de notícias mundial (BOYD-BARRETT; RANTANEN, 1998).

Estudos sugerem que as agências ocidentais fornecem mais de 75% das notícias sobre os países em desenvolvimento, o que forçam estes países verem as questões da perspectiva ocidental (RAMPAL, 1995, Apud: FAHMY, 1995). Boa parte das notícias internacionais flui verticalmente das nações desenvolvidas para aquelas em desenvolvimento através das agências de notícia ocidentais (FAHMY, 2005). Wu (2000, Apud: FAHMY, 2005) constata em suas pesquisas que, na maioria dos países, a cobertura das notícias internacionais gravita em torno das poucas nações poderosas.

A cobertura das notícias internacionais parece ser reflexo e constituinte do sistema global, que é latentemente estruturado pelas culturas, economia e política do mundo. Assim, o conteúdo e o volume do fluxo das notícias são influenciados por fatores comerciais, tamanho territorial, laços culturais, recursos de comunicação e a distância física (WU, 2000; 2003).

As agências de notícias de âmbito nacional, que restringem a cobertura jornalística a seus países, atuam globalmente na geração e troca de informações dentro de um sistema mundial de mídia que era controlado por quatro grandes agências privadas ocidentais (Big-Four): Agence France-Presse (AFP), Associated Press (AP), United Press International (UPI) e Reuters - e pelas duas principais agências estatais - Itar-Tass (Rússia) e Xinhua (China). As agências nacionais frequentemente servem como funis das notícias locais para as grandes agências mundiais, que estão concentradas nos países mais desenvolvidos do mundo. É um mercado hierárquico, em que um pequeno número de agências globais fornece notícias aos clientes de todas as partes do mundo, incluindo as agências nacionais (BOYD-BARRETT; RANTANEN, 1998).

Nos últimos anos, há mudanças no cartel de fornecimento internacional de notícias para os jornais impressos e na web, portais, TVs e rádios, com atuação mais marcante da AFP, AP, Reuters e World News Television. Além disso, a agência espanhola EFE tem aumentado crescentemente a sua penetração e a Xinhua, a agência estatal chinesa, contribui significativamente com o volume de notícias envolvendo o boom econômico daquele país (SILVA JR., 2006).

Embora a agência russa Itar-Tass fosse considerada uma das cinco maiores agências de notícia do mundo, não competiu seriamente com as grandes agências ocidentais desde a dissolução da União Soviética (RANTANEN, BOYD-BARRETT, 2004, Apud: HORVIT, 2006). Desde seu início, a Itar-Tass tem sido vista como uma máquina de propaganda, transmitindo a notícia que reflete os interesses do governo.  Mesmo com a queda do comunismo, é vista ainda como uma agência de notícia oficial do governo russo apesar das reformas nos anos 80 que a aproximou mais do papel desempenhado pelas agências ocidentais (ALLEYNE; WAGNER, 1993, Apud: HORVIT, 2006).

Como Itar-Tass, a agência de notícia estatal chinesa Xinhua foi estabelecida como uma porta-voz oficial do partido comunista que controla o governo. Hoje, jornalistas da agência que trabalham fora da China têm imunidade diplomática. Por a Xinhua tentar competir com a crescente economia de mercado da China, a agência tem produzido conteúdos com mais credibilidade e menos tendencioso (FAISON, 1996, Apud: HORVIT, 2006). Igualmente às outras grandes agências de notícia, a Xinhua tem também aumentado a sua presença na Internet.

Para muitos críticos, as grandes agências de notícias ocidentais atuam nas perspectivas, suposições e interesses de seus jornalistas, da administração e das nações desenvolvidas do Norte em que estão sediadas (RAUCH, 2003, Apud: HORVIT, 2006). Além disso, a cobertura dessas organizações dominantes de notícias não é objetiva, mas reproduz estereótipos e apresenta mais os interesses dos países ricos do que dos países em desenvolvimento (ALTSCHULL, 1994, Apud: HORVIT, 2006).

Em sua análise sobre o cruzamento da economia política das agências de notícias e a troca de informações no ciberespaço entre 2001 e 2006, Paterson (2006) concluiu que as notícias online têm repetido as desigualdades ou limitações do jornalismo internacional produzido pela mídia tradicional, havendo pouca diversidade de informação na web, apesar do senso comum esperar o contrário. Diferentemente do que afirmou Baldessar (2008), de que a nova configuração de acesso às informações através das redes eletrônicas não confirmaria mais as conclusões do Relatório MacBride sobre a lógica do fluxo informativo centro/periferia. Nos últimos anos, o fluxo de notícias internacionais tem aumentado aparentemente a diversidade do conteúdo original, mas na realidade tem diminuído ou permanecido estático.

O autor define alguns portais de notícias na Internet como os cibermediários, que reproduzem conteúdo das agências de notícias, muitas vezes, com pouca edição. Grandes produtores de conteúdo como a Time Warner (CNN interativo) ou Microsoft/General Eletric (MSNBC), atuam na maioria das vezes como cibermediário.

Outro fenômeno observado por Paterson é da indústria dos agregadores de notícias contidos nos sites do Yahoo, Altavista, Google e Excite, onde alguns poucos produtores de conteúdo originais fornecem notícias internacionais, apesar da pretensão desses agregadores de ser fonte de diversidade (PATERSON, 2006).

Segundo Paterson (2006), Yahoo foi o primeiro portal a desenvolver um relacionamento estratégico com a Reuters na década de 90 para fornecimento de notícias, um modelo copiado depois amplamente. Outro modelo foi a combinação de produção de conteúdo original (escrito pelos próprios jornalistas do portal) com o conteúdo das agências de notícias. Nesta categoria se incluem meios tradicionais como o BBC ou The New York Times. Para complicar a questão da homogeneização das notícias na web, pesquisas têm demonstrado que a maioria dos usuários consome notícias apenas de algumas fontes, principalmente, da mídia tradicional.

Na realidade, o surgimento da Internet, apesar de ampliar de forma extraordinária o acesso a informação, aumentou ainda mais a concentração da produção de conteúdo (texto, áudio e vídeo) das agências de notícias. As consequências desta concentração são a homogeneização dos conteúdos, pouca diversidade nas informações e agendas semelhantes nos grandes portais de notícias, fenômenos que Silva Jr. (2003) definiu como os homogeneidade, repetitividade e previsibilidade no estudo sobre a Agência Folha e Agência Estado. De um lado há a potencialidade das agências de notícias de alimentação de conteúdos e, de outro, há o apetite pela assimilação e disponibilização de notícias pelos portais jornalísticos da Internet (SILVA JR., 2004).

Os conglomerados multimídia globais Associated Press e Reuters dominam o fluxo de notícias internacional também no ciberespaço, o que Paterson denomina de duopólio. As tecnologias digitais tornaram a produção das agências de notícia mais eficiente e a convergência tecnológica permitiu o acesso fácil em novos mercados através da criação de produtos desenvolvidos para a mesma mídia tradicional, que há muito tempo têm dependido das agências (PATERSON, 2006).

Os profissionais desses sites noticiosos também exercem o papel de gatewatchers (BRUNS, 2005), observando o fluxo das notícias das agências de notícias e filtrando o conteúdo de interesse, muitas vezes sem fazer nenhuma edição. A análise dos dados da CNN, BBC e MSNBC revelou que menos de cinco parágrafos destes três serviços combinados não eram duplicações próximas ou exatas dos parágrafos escritos pelas agências de notícias (PATERSON, 2006).

A realidade da comunicação internacional demonstrada pelo Relatório MacBride, que ainda podemos constatar na contemporaneidade, se caracterizava por três principais aspectos: uma enorme concentração internacional e nacional da capacidade de produzir, circular e consumir produtos comunicativos; existência de uma série de disparidades mundiais, regionais e nacionais; e a transnacionalização acelerada do setor midiático (RUIZ, 2005).

A industrialização tende a estimular a concentração da comunicação, mediante a formação de monopólios ou oligopólios, em matéria de coleta, armazenamento e difusão da informação. A concentração age em três direções: a) integração horizontal e vertical de empresas que agem no setor informativo e recreativo; b) participação de empresas pertencentes a ramos industriais diferentes e interessadas na expansão dos meios de comunicação social (cadeia de hotéis e de restaurantes, companhias aéreas, construtores de automóveis ou empresas de mineração interessadas na imprensa, na produção de filmes e até mesmo no teatro); c) fusão e interpenetração de diversas indústrias da informação criação de grandes conglomerados que abarcam vários meios de comunicação social. (UNESCO, 1983).

Quais os fatores que levam à concentração midiática? O relatório conclui que, embora às vezes se deva a razões ou a pressões políticas, nos principais setores da comunicação a concentração é provocada sobretudo pelas condições que regem a obtenção de benefícios nos mercados nacionais e mundial e a circulação de capitais. Naquele momento, já levava em conta também o surgimento das novas tecnologias como fator de integração vertical, como no caso das indústrias dos computadores, em que certas empresas não se contentam em realizar pesquisas e fabricar e vender máquinas, mas se encarregam ainda do funcionamento e da conservação desses sistemas, proporcionando inclusive os meios de programação. Como exemplo de concentração cita o jornalismo:

A concentração deriva de vários fatores, conforme indica o exemplo do jornalismo: a) as tendências fundamentais das economias de mercado; b) as tendências à homogeneização da informação, das mensagens e do conteúdo para atender às necessidades de certos poderes públicos; c) as pressões econômicas derivadas das mudanças técnicas, em matéria de edição e distribuição; d) a pressão da concorrência, no que se refere a obter rendas derivadas da tiragem e da publicidade; e) a concorrência entre os diversos meios de comunicação social; f) a uniformização dos “produtos culturais” em geral; g) a existência de jornais que não correspondem a uma necessidade econômica ou social precisa; h) o aumento dos gastos de produção e a redução das rendas publicitárias; i) a fusão organizada dos jornais; j) os acordos administrativos, as medidas de fomento de caráter financeiro e as normais fiscais que existem em detrimento das empresas independentes; l) os erros de gestão; m) a informação e a recessão gerais; n) a falta de novas iniciativas, tanto no setor privado quanto no público; o) a inexistência de novos recursos financeiros. (UNESCO, 1983).

Neste contexto de concentração midiática, destacava-se, já naquela época, as empresas transnacionais. Os modelos de comunicação parecem muito com os que se aplicam em outros setores da vida econômica. O fenômeno conhecido com o nome de transnacionalização ou globalização afetou também o setor de comunicação. Desta forma foi feita a distinção entre os centros que controlam a produção e os serviços e os mercados periféricos que os absorvem:

Em resumo, a indústria da comunicação é dominada por um número relativamente pequeno de empresas que englobam todos os aspectos da produção e da distribuição, situam-se nos principais países desenvolvidos e cujas atividades são transnacionais. A concentração e transnacionalização são as consequências, talvez inevitáveis, da interdependência das diversas tecnologias e dos diversos meios de comunicação, do custo elevado do trabalho de pesquisa e desenvolvimento, e da aptidão das firmas mais poderosas, quando se trata de introduzir-se em qualquer mercado. Essas tendências existem em muitas outras indústrias, mas a comunicação constitui um setor especial. Às empresas transnacionais cabe uma responsabilidade especial no mundo atual, já que a sua posição dominante em matéria de informação faz delas um elemento da estrutura que determina o desenvolvimento dos modelos econômicos e sociais. Os meios de comunicação transnacionais exercem uma influência capital sobre as ideias e as opiniões, sobre os valores e os estilos de vida e, por conseguinte, sobre a evolução, para o bem ou para o mal, de todas as sociedades. (UNESCO, 1983).

Uma das principais consequências desta concentração, avaliou o Relatório MacBride, é a homogeneização dos conteúdos, que tem como grandes fornecedores as agências de notícias, meios que ilustram como as atividades de empresas nacionais (ou de cooperativas) e que adquiriram um caráter transnacional:

Embora na maioria dos países haja hoje uma ou várias agências nacionais de imprensa, essas agências frequentemente dispõem de recursos humanos, materiais e técnicos insuficientes, motivo pelo qual sua produção de informação tem que ficar complementada por uma contribuição externa. Essa é uma das razões pelas quais os meios de comunicação social desses países ainda dependem, em grande parte, das notícias selecionadas e transmitidas por importantes agências estrangeiras. (UNESCO, 1983).

3. Novas tecnologias e o Relatório MacBride

Sobre as transformações e a possibilidade de democratizar a comunicação com as novas tecnologias, o Relatório MacBride foi premonitório. Como saída para melhorar a uniformidade que caracteriza os meios de comunicação, o documento indica que as descobertas das novas tecnologias permitiriam uma diversificação e individualização maior das mensagens, ou seja, uma maior segmentação e personalização dos conteúdos. E em relação aos jornais profetizou:

Outro progresso, provavelmente muito próximo, consistirá em adaptar a produção a cada leitor concreto, que terá um terminal de computador. Como a maioria das notícias do dia são armazenadas já em computadores ligados às agências de notícias, em princípio seria possível que, em vez de receber um jornal corrente, o assinante tivesse acesso diretamente às notícias. Daria instruções ao computador mediante uma série de palavras-chave para procurar a informação contida na memória e receberia o seu “jornal” pessoal, que só conteria notícias do seu interesse (...). Os fabricantes produzem um material cada vez mais “inteligente”. Com surgimento da unidade portátil, afastada e independente, o jornal se transformou numa rede de minicomputadores com um vasto repertório de possibilidades. Tudo indica que prosseguirá a automatização da indústria do jornalismo, permitindo maior diversificação do serviço oferecido aos assinantes. (UNESCO, 1983).

Sobre o desenvolvimento digital propriamente dito, houve a expectativa de mudanças na difusão em massa da informação, que levou a entrar na era da informatização da comunicação, com a interconexão dos computadores mediante a telecomunicação, formando redes integradas autônomas. Interessante notar como o documento antecipou, cerca de uma década antes, as transformações que as novas tecnologias trariam para o funcionamento dos diversos tipos de mídia, através da Internet, apesar desse novo meio ainda não existir na época como conhecemos hoje:

A combinação da informática e da telecomunicação (interconexão de computadores mediante a telecomunicação, ou telemática) também abre possibilidades imensas. Até agora, essas duas tecnologias eram quase totalmente independentes uma da outra, o emprego de uma delas pela outra era puramente fortuito. A tendência atual leva ao estabelecimento de vínculos cada vez mais estreitos entre a tecnologia dos computadores e as instalações de transmissão de dados (...). O laço entre os computadores e os sistemas de telecomunicação deu nova dimensão e significação cada vez mais global à capacidade da humanidade de manejar e utilizar os dados. Esse fenômeno se manifesta de maneira crescente em todos os países, inclusive em muitos dos que ainda não dispõem de tecnologia muito avançada (...). Multiplicam-se as iniciativas encaminhadas a estabelecer, nos planos nacional e internacional, redes integradas de informação. (UNESCO, 1983).

Os avanços tecnológicos, por si só, como assinala o Relatório e como bem sabemos hoje com a Internet, não democratizam o acesso às informações, pois não estão ao alcance de todos ou de todas as regiões, mas “oferecem um potencial considerável para diversificação das mensagens ou maior democratização da comunicação”:

Devido à modernização das tecnologias de comunicação, o controle popular torna-se ao mesmo tempo mais vital e mais difícil. O estabelecimento e desenvolvimento de sistemas de informação em grande escala e de bancos de dados conduzem à acumulação de massas enormes de dados de importância essencial nos setores social, econômico e político. O acesso a essas fontes de informação pode naturalmente ficar limitado aos que as controlam ou pode se estender a um amplo público de usuários potenciais. O público deve exercer pressão para atingir uma participação democrática mais ampla nas decisões relativas à difusão do conteúdo da informação para se opor à concentração do controle da comunicação (...). Em suma, os processos técnicos podem chegar a ser obstáculos ou ameaças para a democratização da comunicação. Mas, ao mesmo tempo, esses novos serviços podem conduzir também a algumas estruturas descentralizadas e mais democráticas. (UNESCO, 1983).

Atualmente, com a Internet, os movimentos sociais manifestam-se em torno de direitos que consideram fundamentais. Uma vez que a Internet torna-se um meio importante de comunicação e organização da sociedade, é óbvio que os movimentos sociais também a usem para atuar, informar, recrutar, organizar, dominar e contradominar. A comunicação de valores e a mobilização em torno de significados tornam-se fundamentais (CASTELLS, 2003).

Pelo seu baixo custo, facilidade de operacionalização e poder de distribuição, os movimentos sociais podem divulgar e defender na web suas ideias e denunciar as mazelas da sociedade nacional e transnacional. Cohen e Rai (2000, Apud: CASTELLS, 2003) identificam seis importantes movimentos sociais que se engajaram numa forma global de coordenação e ação: movimentos pelos direitos humanos, pelos direitos das mulheres, pelo trabalho, ambientalista, religioso e pela paz. É uma rede transnacional, que demonstra a pluralidade da sociedade civil como modo de associação e solidariedade (COHEN, 2003):

E, de resto, envolvem a interação direta em grupos locais. Só que suas estruturas de comunicação lançam mão de modo cada vez mais frequente dos novos meios eletrônicos, permitem o entrelaçamento de atores “locais” e “não-locais”, que se conectam e discutem no ciberespaço por meio de troca de mensagens instantaneamente recebidas e respondidas. A internet facilita a expansão das interações comunicativas em escala planetária. A meu ver, a rede é uma nova forma de pluralidade que torna possível uma nova forma de conexão social, novas formas de ação coletiva e uma “solidariedade entre estranhos” mais ampla que as anteriores. Não me refiro à “ação coletiva” ou à conexão realizada unicamente pela internet, como uma campanha por correio eletrônico ou as conversas em salas de bate-papo. Estou pensando na articulação de grupos locais que se inter-relacionam por intermédio da rede virtual de computadores e se comunicam em parte através da nova mídia eletrônica. É essa combinação que constrói um todo maior que a soma de suas partes. (COHEN, 2003).

A necessidade de formar coalizões globais e o embasamento em redes globais de informação tornam os movimentos extremamente dependentes da Internet, que fornece a base material que permite os movimentos sociais engajarem-se na produção de uma nova sociedade, transformando por sua vez a própria Internet, que de uma ferramenta de organização das empresas, torna-se um instrumento de transformação social (CASTELLS, 2003). Além disso, permite a articulação de projetos alternativos locais através de protestos globais, que acabam aterrissando em algum lugar, como Seattle, Washington, Praga etc., que se constituem, se organizam, se desenvolvem a partir da conexão global de movimentos locais e de vivências locais (CASTELLS, 2004). São os chamados movimentos antiglobalização. Não tem uma organização profissional permanente, uma estrutura de comando ou um programa comum:

Existem no mundo todo centenas, milhares de organizações e indivíduos que convergem em alguns protestos simbólicos, para depois dispersar e focalizar suas próprias questões específicas – ou simplesmente desaparecer, para serem substituídos por novos contingentes de ativistas recém-surgidos (...). Sua influência, já mensurável em termos de uma significativa mudança de atitude em instituições da importância do Banco Mundial, vem da capacidade de suscitar questões, e forçar um debate, sem entrar numa negociação, pois ninguém pode negociar em nome do movimento (...). O movimento antiglobalização não é simplesmente uma rede, é uma rede eletrônica, é um movimento baseado na Internet. E como a Internet é o seu lar, não pode ser desarticulado ou aprisionado. (CASTELLS, 2003).

Na concepção de Gohn (2003), o movimento antiglobalização nega a forma como a ordem capitalista instituída vigente se reproduz e não a ordem em si. É movido pela busca de soluções alternativas aos problemas sociais e à própria preservação da vida no planeta, e não para a sua destruição. Apresenta-se, no início do Século XXI, como uma das principais novidades da arena política e no cenário da sociedade civil, pela sua atuação em redes com extensão global.

Como reconhece Gohn (2003), os recursos tecnológicos são as grandes armas estratégicas utilizadas na organização e mobilização do movimento e a Internet tem sido o principal instrumento de comunicação na elaboração de suas agendas. O uso das tecnologias de comunicação e informação complementa e aumenta as oportunidades para a construção do conhecimento e a ação política direta.

Dentro de uma leitura gramsciana, o ciberespaço na atualidade seria o ambiente onde as ideias contra-hegemônicas dos movimentos sociais encontram instrumento, divulgação e penetração na sociedade civil para exercer a sua luta. A sua importância estaria na ruptura da unidirecionalidade da comunicação; a pluralidade e diversidade de informações e pontos de vistas que a web oferece; as novas possibilidades que o público tem de verificar, direta ou indiretamente, a veracidade da informação que está recebendo, e de tomar sua própria decisão. Na web, os movimentos sociais têm voz, não só em seus canais de comunicação próprios, mas também através da mídia alternativa que compartilham dos mesmos valores e ideias.

As novas tecnologias transformaram todo sistema de comunicação mundial, principalmente, para a mídia alternativa. A Internet, como uma infra-estrutura interconectada para múltiplas formas de comunicação, promove um período de convergência das tecnologias de mídia, proporcionando a transmissão fácil de textos simples bem como os meios de combinar e recombinar uma série de formatos de mídia e atores sociais, permite a distribuição de conhecimentos e recursos a quase todos os lugares do globo de maneira inédita (FORD; GIL, 2002). Na web, indivíduos e grupos independentes de todo o mundo podem comunicar-se para uma audiência de milhões de pessoas:

São muitos e variados os métodos de intercâmbio de informação que se tornam possíveis no ciberespaço da Internet, permitindo uma grande diversidade de funções, estratégias e estilos de comunicação. As formas populares e os fóruns de interação incluem websites pessoais e coletivos, grupos de discussão, email, sessões de bate-papo online, conferências, cadastros, quadro de avisos, mecanismo de busca e banco de dados. Esses e outros meios de comunicação online facultam novas e extraordinárias possibilidades, tais como distribuição de textos publicados e não publicados, exposições de arte multimídia, documentação de fatos e conversas de longa distância em tempo real a preços baixos. (FORD; GIL, 2002).

Moraes (2007), em sua pesquisa na qual analisa sites de mídia alternativa na web, descreve a Internet como um ecossistema digital caracterizado por arquitetura descentralizada, multiplicação de fontes de emissão, disponibilização ininterrupta de dados, sons e imagens, utilização simultânea e interações singulares que, em sua impressionante variedade de usos, permite a produção e difusão de informações com sentido contra-hegemônico — isto é, de questionamento do neoliberalismo e da ideologia mercantilista da globalização, bem como de denúncia de seus efeitos anti-sociais

4. Comunicação alternativa e o Relatório MacBride

Como sugestões para democratizar a comunicação, o Relatório MacBride sugeria o desenvolvimento econômico para garantir a disponibilidade de tecnologias apropriadas para o funcionamento das organizações midiáticas; o desenvolvimento político como forma de superar o autoritarismo, criando estruturas democráticas de poder; e o desenvolvimento educativo que proporcione conhecimentos suficientes para que a população possa consumir os produtos midiáticos, compreendê-los e aplicá-los na vida cotidiana (MELO, 2005).

Enquanto estes objetivos ideais não são alcançados, o documento indicou forma de romper a alta concentração midiática com o fortalecimento do direito de resposta, incremento da participação de leigos na produção e emissão de programas, estímulo à participação da coletividade na gestão midiática dos meios de comunicação e fomento da comunicação alternativa.

O Relatório denomina comunicação alternativa como comunicação de substituição e de contra-informação, que se aplica a uma série muito ampla de iniciativas, cuja característica comum é a oposição à comunicação oficial institucionalizada. Seria formada por grupos locais que querem combater o monopólio dos sistemas de comunicação verticais e centralizados, de partidos ou grupos políticos que empreendem diversas formas de comunicação de oposição, de dissidentes opostos ao sistema estabelecido, de minorias que estão desenvolvendo a sua capacidade de comunicação, de grupos que iniciam novas experiências ecológicas etc.:

O fato de dar mais importância ao conteúdo que à forma e a necessidade imperiosa de criar alguns canais de comunicação “horizontais” estimulam esses grupos a experimentar uma ampla série de meios. Os tradicionais (panfletos, folhetos, cartazes, jornais, prospectos, reuniões e festas) foram completados, sem serem substituídos totalmente, por meios e técnicas mais modernas (filmes de 8 mm, videocassetes, histórias em quadrinhos, notícias por telefone). Nos países industrializados, está progredindo a utilização dos meios eletrônicos de comunicação (rádio em frequência modulada, rádio e inclusive televisão “pirata” ou “pornô”) por diversos grupos como “alternativa de comunicação”. (UNESCO, 1983).

Como ocorre atualmente com a Internet, o Relatório já vislumbrava que as novas tecnologias abririam novos caminhos para a informação e permitiriam aos que eram “receptores passarem a ser participantes ou terem a ilusão de participar da comunicação”. Os grupos que se dedicam a este tipo de comunicação foram classificados em três categorias: oposição radical, de origem política, religiosa ou filosófica; movimentos de comunicação locais e comunitários; e os sindicatos ou outros grupos sociais que têm as suas próprias redes de comunicação. Há diferenças entre essas categorias, mas todas elas se opõem às formas social, cultural e politicamente hegemônicas da comunicação:

Quantitativamente – isto é, medindo-a segundo o conteúdo e a regularidade da comunicação ou o número de pessoas que a atinge – não pode pretender concorrer com os meios de comunicação de massas, o que não é, além disso, sua finalidade. Mas o repúdio radical da corrente vertical dominante, o fortalecimento da coesão de certos grupos e a capacidade que oferece para o desenvolvimento das redes horizontais dão-lhe uma importância que não se mede pelas cifras que servem de medida comum. (UNESCO, 1983).

Na primeira década do Século XXI, têm-se multiplicado as vozes que defendem o direito à comunicação e políticas públicas contra a concentração midiática.  Como avalia Mattelart (2005), a sociedade civil organizada se faz escutar cada vez mais nos debates internacionais e tem empregado “formas inéditas e permanentes de contrapoder democrático em nível nacional e local, construindo uma força ético-moral contra a apropriação indevida da esfera pública pelas lógicas da concentração político-financeira”.

Dentre as sugestões feitas pelo Relatório MacBride para se contrapor à alta concentração midiática, o desenvolvimento de uma comunicação alternativa é a que, principalmente com o surgimento da Internet, tem-se tornado uma realidade (MELO, 2005). O uso das tecnologias de comunicação e informação complementa e aumenta as oportunidades para a construção do conhecimento e a ação política direta. A publicação na Internet reduz custos e facilita a distribuição (ATTON, 2005). Na web, organismos sociais podem ampliar a circulação de conteúdos críticos, debater alternativas ao neoliberalismo e difundir reivindicações éticas (MORAES, 2004).

Se no ciberespaço se reproduz a concentração da produção dos conteúdos nas mãos das agências de notícias (UNESCO, 1983; WU, 2003; SILVA JR., 2004; PATERSON, 2006), na própria web se apresentam alternativas para uma maior diversidade na seleção e enquadramentos das notícias por sua facilidade de acesso, distribuição e custo, como as agências de notícias Adital, Carta Maior e IPS, e a apropriação de interfaces de fácil uso para uma aplicação jornalística, como os blogs. Estes exemplos demonstram alternativas viáveis como canais paralelos na irrigação do noticiário internacional e de meios de circulação não alinhados ao modelo de cobertura das agências de notícias tradicionais e redes internacionais (SILVA JR., 2004).

A publicação na Internet reduz custos e facilita a distribuição (ATTON, 2005). Os organismos sociais podem ampliar a circulação de conteúdos críticos, debater alternativas ao neoliberalismo e difundir reivindicações éticas (MORAES, 2004). O foco da irradiação de sentidos e ideologias foge do controle hegemônico de certos países, para se estender ao longo do ciberespaço, onde participam comunidades distintas de diversas regiões do mundo e com interesses heterogêneos.

Assim, a web tornou-se o palco da luta contra-hegemônica, onde movimentos insurgentes, sociais, políticos e culturais encontraram para se legitimar e alcançar suas bases sociais, fazendo reconhecer globalmente suas ações. Lá referenciam suas demandas, contam suas histórias, denunciam seus opressores e potencializam suas bases sociais de apoio. É no ciberespaço que suas histórias de luta estão registradas e onde suas experiências podem ser somadas às de outros movimentos. (URQUIDI, 2002). A “militância online” busca a disseminação de ideias e o máximo de intercâmbios.

No Brasil, destaca-se a ação do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) que, através de sua homepage, reinterpreta as informações divulgadas pelos jornais e redes de televisão brasileiras. Tem ainda a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi) que busca sensibilizar e mobilizar a mídia, a sociedade e o poder público para a promoção e defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente. Uma das linhas de ação é o monitoramento de mídia, com a clipagem de notícias sobre infância e adolescência de 116 jornais e revistas.

A partir das matérias publicadas, a Rede edita o boletim “A Criança e o Adolescente na Mídia”, um resumo com as principais notícias do universo infanto-juvenil e envia esses materiais para um mailing de mais de 15 mil contatos e publica-os em seu site. Outro movimento que se destaca, neste caso no México, é o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), que aderiu e atua ativamente via internet desde 1994 (PAIVA, 2001). 

5. Conclusões

Apesar de terem passados três décadas, infelizmente, o diagnóstico do Relatório MacBride continua atual em muitos sentidos. Mas também as suas propostas para a democratização da comunicação, apesar da alta concentração midiática, encontram em nosso tempo meios tecnológicos e oportunidades históricas e sociais para serem implementadas.

São ainda utópicas? Sim. Romper o poder e alcance dos grandes conglomerados de comunicação, com seus oligopólios mundiais, não será realidade apenas com o uso de comunicação alternativa através da Internet. Mas as condições estão dadas para uma maior organização da sociedade civil e surgimento de novas vozes, com novos pontos de vista e opiniões, interligados em rede de interesses e objetivos comuns.

Como bem destacou o Relatório MacBride, o ser humano tem direito à informação. Direito que deve ser buscado com pressões junto aos governos e parlamentos para aprovação de medidas que realmente incentivem e possibilitem uma verdadeira democratização da comunicação numa sociedade justa e plural. Como salientou Melo (2008), esperamos que o legado daqueles pioneiros que protagonizaram as batalhas comandadas por Sean MacBride possa ser um referencial neste início do século XXI para balizar ações, intervenções e realizações.


NOTAS

[1] MACBRIDE, S. Et. Al. Relatório MacBride: Um mundo, muitas vozes. Cidade do México: Fondo de Cultura Económica, 1987. Relatório completo (264 páginas) em espanhol, disponível para download na página da Unesco.


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*Laércio Torres de Góes é jornalista e mestre pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (UFBA), assessor de imprensa e professor de jornalismo da FacDelta (Unime Salvador).

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Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro | ISSN 1806-2776 | Edição 13 | Outubro | 2010
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