Novembro de 2011
Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ISSN 1806-2776
 
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ENSAIOS

[continuação]

12. Realismo

Frederick Forsyth, britânico, acatado pela crônica especializada como um dos jornalistas melhor informados sobre operações no submundo da espionagem, dos soldados da fortuna e terroristas, conquistou a primeira colocação no ranking dos autores que, já no final dos anos sessenta, fundamentavam seus romances aproveitando a proximidade existente entre a reportagem e a ficção. Ao contrário de Ian Fleming, que explorou até o limite do ridículo o Agente 007, Forsyth trabalha a partir de personagens díspares quanto às características físicas, psicológicas e métodos de ação.

O Dia do Chacal (1971), dentre as obras mais conhecidas de Frederick Forsyth, descreve os bastidores de um plano articulado pelos integrantes da Organização do Exército Secreto (OAS), que combatia a Independência da Argélia, para assassinar o Presidente da França, general Charles De Gaulle. A inspiração do escritor britânico surgiu com o relato publicizado do engenheiro agrônomo Georges Watin para compor a personagem principal (interpretado no cinema pelo ator britânico Edward Fox).

Forsyth ultrapassou certos limites e foi duramente criticado pelo próprio Watin, que, à sua maneira um tanto rude, fez o que pôde para desacreditar tanto aquele autor como a obra.

Disse ele: [26]

Não houve toda a sofisticação descrita no livro, talvez porque Frederick Forsyth só tenha falado comigo uma vez. Ele cometeu vários erros. Nunca fui mercenário. Na verdade, vendi as terras de minha família para financiar a Causa. Forsyth deixou-me a impressão de ser um inglês bêbado que, inclusive, inventou o codinome Chacal, já que os companheiros me chamavam de O Manco e os árabes me conheciam como O Diabo.

Apesar desse comentário adverso a livro reverberou intensamente junto à criativa imprensa francesa. Esta, por sua vez, aproveitou-se do fato de um exemplar ter sido encontrado no interior de um armário do apartamento ocupado em Paris (na Rue Toullier) por Illich Ramirez Sanchez – após as mortes, no dia 25 de junho de 1975, de dois agentes do Departamento de Segurança Territorial (DST) e de Michel Moukharbel (ex-companheiro de um autoproclamado Comando Boudhia) que o denunciara – para rebatizar aquele jovem venezuelano (até então praticamente desconhecido dos órgãos de inteligência e contraterrorismo) com o codinome que o notabilizou [27] por quase duas décadas.

Georges Watin relata o que aconteceu: [28]

Depois do fracasso no boulevard (refere-se ao Petit-Clamart, em Paris, onde o presidente escapou de um atentado planejado pelo tenente-coronel Jean-Marie Bastien Thiry), aOAS ficou reduzida a um pequeno grupo. Teríamos aí uma última chance. Soubemos que, em um dia de fevereiro de 1963, De Gaulle participaria de um desfile na Escola Militar de Paris. Havia um oficial simpatizante da OAS que vivia lá. E, do banheiro de seu alojamento, o ângulo de tiro era excelente para atingir o palanque presidencial. A missão seria praticamente suicida, porque mais de 8 mil militares estariam na Academia no momento do disparo. Comprei um rifle de alta precisão na Bélgica e consegui introduzi-lo na Academia.

No filme, o Chacal usava um par de muletas, uma das quais era o estojo do rifle. Nada disso aconteceu. Eu estava pronto para entrar na Academia, usando documentos falsos e um uniforme de oficial, cheio de medalhas. Foi a primeira vez na vida que vesti um uniforme (...) na hora de entrar na Academia, um de nossos homens sinalizou para que eu fosse embora. O oficial simpatizante gostava de beber e, na noite anterior, na cantina da Academia, disse a um grupo de militares que, em poucas horas, De Gaulle pagaria pela traição da Argélia. Havia no grupo um agente do serviço secreto militar, que deu mais bebida ao oficial. Ele terminou contando tudo. Mais uma vez, fui o único do grupo a não ser preso. Depois disso, a OAS praticamente acabou.

Já em O Dossiê de Odessa (1972), Forsyth narra a estratégia adotada por um jovem jornalista freelancer, Peter Miller (John Voight no cinema), para se infiltrar na Organização dos Ex-Elementos das SS — criada durante a Nêmesis do Terceiro Reich com o objetivo de proporcionar a fuga de oficiais superiores nazistas, bem como dos remanescentes das unidades especiais engajadas em operações de extermínio no Leste Europeu.

Auxiliado por uma equipe de agentes israelenses — empenhados na captura e justiçamento daqueles indivíduos —, não somente consegue identificar e localizar o vilão (Eduard Roschmann, ex-capitão SS travestido de industrial) como, por tabela, impede que cientistas alemães, com a ajuda de militares egípcios — em pleno Governo do presidente Gamal Abdel Nasser [uma das lideranças do Movimento dos Países Não Alinhados, juntamente com Josip Broz Tito, Ahmed Sekou Touré, Jawaharlal Nehru, e Kwame Nkrumah] —, lancem foguetes contendo ogivas bacteriológicas sobre Israel. O plano é desarticulado e as instalações de mísseis destruídas.

Dentre os escritores assinalados neste subtópico, David Cornwell, melhor dizendo, John Le Carré, apresenta — para o autor dessas linhas — maior desenvoltura no quesito ação psicológica, fundamentalmente na tetralogia iniciada com O Espião que saiu do frio (considerado pela crítica internacional um clássico do gênero), e seguida por O Espião que sabia demais, Sempre um colegial e A vingança de Smiley (outros romances incluem a personagem George Smiley, embora sem o mesmo destaque).

Sua obra, estruturada a partir do jogo traiçoeiro e multitentacular da espionagem, prende a atenção dos leitores pela sofisticação da trama e frieza das personagens. Contam-se pelos dedos as mortes, em meio à loucura da desinformação e outras armadilhas dos serviços secretos plantadas durante a Guerra Fria.

John Le Carré descreve inicialmente a tragédia do outrora poderoso Serviço Secreto Britânico, esfacelado por traições e deserções de agentes altamente classificados (a exemplo de Hadrian Russel “Kim” Philby, Anthony Blunt, Donald Maclean, Guy Burgess e John Cairncross, até a contrapartida soviética perpetrada pelo coronel Oleg Penkovsky), desacreditado pelas agências coirmãs ocidentais e transformado em mero “Satélite da CIA”. Desastre que ressaltou no esvaziamento de uma bem sucedida máquina de inteligência cultivada em mais de 200 anos.

O grande medo aquilatado por Le Carré (que recorre a algumas experiências por ele próprio vividas no Foreign Office) não está limitado às operações do Exército Republicano Irlandês, ou aos subterrâneos onde se ocultam frações radicais no Velho Continente. É insidioso, sutil, cerebral; estende-se para muito além das torres de vigia e das sentinelas, das cercas eletrificadas e minas antipessoais instaladas ao longo da terra de ninguém, junto do Muro em Berlim Oriental antes da debâcle soviética.

Perde-se nas estepes até chegar à misteriosa e isolada dacha na periferia da capital soviética, onde Karla, seu Graal Negro, o discreto e impenetrável chefe da Décima-Terceira Diretoria da Central de Moscou — mediante artifícios da  desinformação e da fraude —, não somente monitora por intermédio de um agente duplo o sistema de informações britânico, como tenta expor ao ridículo o conjunto dos  serviços de inteligência ocidentais.

É a habilidade de Karla, sua circunspecção monástica e o conhecimento próximo, diabolicamente próximo, das fraquezas de George Smiley, o triste (desglamurizado: baixo, gordo e usando óculos com lentes grossas, além de escandalosamente traído pela mulher) Executivo-Mor do Circus, que fascina os leitores.

A angústia provocada pelo terror invisível e onipresente perpassa nessa tetralogia de John Le Carré como um toque de classe: levíssimo e\ permanente na irradiação. Comenta-se que a personagem Karla teria sido inspirada no general Markus Wolf, durante décadas diretor da Stasi, o serviço de inteligência da Alemanha Oriental.

Entre as personagens criadas por Le Carré, algumas se destacam: Jerry Westerby, espião de fato e jornalista de ofício, que caminha na procura interminável de si mesmo enquanto persegue a ponta de um novelo que se estende de Hong Kong ao nevoeiro no interior da República Popular da China. À distância, sempre controlando os fios invisíveis que impulsionam as marionetes humanas, destaca-se Karla... o construtor de lendas.

Outros ficcionistas podem ser mencionados, a exemplo de Tom Clancy, autor de numerosos thrillers de ação e, na maioria, focados na luta da Agência Central de Inteligência dos EUA contra o terrorismo de Estado, a ameaça de um confronto derivada do roubo de um artefato nuclear e ao narcoterrorismo.

Ira Levin, por sua vez, obteve êxito com Os Meninos do Brasil. Nesse romance, ele desenvolve a seguinte trama: o Dr. Joseph Mengele, conhecido como o Anjo da Morte de Auschwitz (interpretado no cinema por Gregory Peck), reproduz in vitro num laboratório instalado no interior do Paraguai, os clones de 40 crianças com características físicas e psicológicas idênticas às de Adolf Hitler. É fácil mensurar os efeitos dessa experiência (se tais produtos da loucura vicejassem), bem como a conclusão do livro.

13. A construção das Personagens

Quem são, de fato, os expoentes do extremismo e como são construídos e desconstruídos, pelo aparato destrutivo das grandes potências e/ou por intermédio da ação sistemática e diuturna das mídias?

Eis as primeiras indagações.  As estratégias mais freqüentes, tanto aquelas emanadas pelas lideranças dos governos como as provenientes dos comandos das organizações para fixar — no imaginário coletivo — esses ícones do extremismo, têm início nas histórias de vida e/ou lendas sobre o passado e a participação desses homens e mulheres. Há que se destacar o recrutamento e a impregnação dos dogmas; os estágios nos centros de treinamento até a transformação alquímica da personalidade; o tempo de usinagem das ferramentas humanas estendendo-se ao batismo de fogo nos campos ou nas metrópoles.

Tome-se o exemplo dos futuros mártiresda Jihad Islâmica, filmados e fotografados quando desfilam nas ruas de algumas das capitais do Oriente Médio, trajando uniformes em tecido negro sobre os quais podemos ver coletes especiais com os bolsos externos repletos de dinamite ou tabletes de Semtex (explosivo plástico fabricado na antiga Tchecoslováquia), barbas cerradas, olhares fixos à frente. Tudo isso, bem antes dos atentados contra as Torres Gêmeas e o Pentágono e como contrapartida militar das ações empreendidas pela Coalizão liderada pelos Estados Unidos da América tanto no Iraque como no Afeganistão.

Mais uma sequência fílmica: início de dezembro, 1997. Os telejornais da época mostram um centro de treinamento para mulheres guerrilheiras no interior do Iraque. O número das combatentes, é impreciso; talvez o equivalente a uma companhia completa (150); elas estão vestidas de preto dos pés à cabeça e marcham seguindo a cadência dos tambores.

De repente as batidas cessam e os passos são interrompidos. Com o pé esquerdo à semelhança de uma falange, só que equipada com modernos fuzis de assalto, cada uma delas, ao menos na aparência, está pronta para atacar.

Tais imagens, a bem da verdade, são peças de propaganda em uma sociedade diferente da nossa, capaz de aceitar como justa e (até mesmo!) oportuna, a colocação de bombas equipadas com dispositivos de tempo em uma estação do metrô. Aqueles(as) soldados da morte supramencionados(as), em marcha ritmada e diante das multidões delirantes nada mais são do que instrumentos da vontade dos líderes, de governantes carismáticos ou apóstolos da tradição messiânica. Os objetivos dessas demonstrações?

Impressionar a Opinião Pública e alertá-la sobre os riscos a que estarão incorrendo os infiéis, caso as exigências das lideranças desses grupos não sejam acatadas.

De volta aos desfiles:

Precedidos por bandas marciais e com direito às honras da transmissão direta para todos os países (por intermédio das emissoras  que integram o sistema  de comunicação desses Estados Nacionais);  revigorados a todo instante por gritos de guerra, os desfiles  tropas representam grandes espetáculos teatralizados. 

Algumas explicações:

Em primeiro lugar o palco desse megateatro será preferencialmente um local descampado: as sequências mostram fedayin disparando rajadas de metralhadoras em alvos de madeira, cortando pescoços de galinhas e, em seguida, bebendo o sangue das aves recém-abatidas; manuseando com descontraída perícia serpentes peçonhentas e colocando-as em sacolas de lona; arremessando adagas em retratos ampliados de chefes de Estado inimigos.

Seguem-se as exibições relativas ao domínio e emprego dos engenhos de destruição: carros e ônibus são explodidos à distância, minas anticarro abrem crateras no solo e caixas dos Correios projetadas a dezenas de metros etc.

Essas demonstrações de perícia sugerem três focos de percepção:

1. ocupam o tempo dos analistas (e gastam as solas dos sapatos do pessoal da Inteligência);

2. atendem aos propósitos  sensacionalistas dos editores e chefes de reportagem e  

3. ampliam a  confiança dos que acreditam nesse tipo de  ações.

Em relação ao primeiro caso vale ressaltar que muitas centrais de Inteligência ainda são chefiadas por velhos operadores de campo, remanescentes do tempo em que cada porão, cada sótão, cada túnel secreto em Berlim, Praga, Viena, Budapeste ou Zurique, era disputado a ferro e fogo pelos ases da espionagem e da desinformação (de Allen Dulles a Marcus Wolf), que sempre almejaram aperfeiçoar os métodos destinados a superar as ameaças no âmbito interno (isto é, desarticular as redes clandestinas) e criar contramedidas destinadas a anular as ações inimigas no nascedouro.

Mesmo no Brasil, em que pese a proclamada índole pacífica do povo, os órgãos de Inteligência desenvolveram, principalmente ao longo dos governos militares (1964-1985), inúmeras atividades destinadas a:

1. monitorar as ações da  propaganda externa adversa ao País;

2.  oferecer contrapontos eficazes para fragmentar as iniciativas perpetradas em solo brasileiro e

3. identificar e prender os responsáveis.

Uma fonte protegida do Centro de Informações do Exército disse ao autor que, independentemente das operações de infiltração nos grupos de oposição tendentes à luta armada no território brasileiro, o extinto Serviço Nacional de Informações (SNI) mantinha em plena Universidade dos Povos (Patrice Lumumba), no coração de Moscou — sob sistema de revezamento — (mais de um casal) agentes que, seguindo uma agenda variável, enviavam relatórios pormenorizados sobre o cotidiano dos estudantes brasileiros. Sem entrar em detalhes sobre a identidade dessas pessoas, a mesma fonte acrescentou que, praticamente, todas as iniciativas planejadas contra o governobrasileiro originárias desses grupos na capital soviética foram detectadas ou anuladas.

Uma segunda ponderação:

O terrorismo é assunto de destaque em todos os países, e não pode ser minimizado ou esquecido. Qualquer ação perpetrada resulta em manchetes, especialmente se materializada num local de grande movimento (aeroporto, shopping center, praça pública, edifício de escritórios etc.).

Michel Wieviorka e Dominique Wolton, na ampla pesquisa que elaboraram sobre o terrorismo, suas implicações e o impacto dele derivado nas primeiras páginas dos diários, [29] comentam sobre a gênese desses episódios.

L’histoire du terrorisme médiatique commence avec les  premiers détournements d’avion operés par  des militants  se réclamants de la cause palestininienne. En decembre 1968  et en fevrier 1969, les fedayin du Front Populaire pour la Libération de la Palestine (FPLP) attaquent des avions de la compagnie israélienne El Al, à Athènes et à Zurich, et surtout, début septembre 1970, la même FPLP organise une série sans précédent d’actes de piraterie aérienne (...).

Os pesquisadores explicam que as operações supracitadas reverberaram intensamente no coração dos serviços de Inteligência ocidentais engajados na luta contra o terrorismo (aos quais também se juntaram, formando um mutirão discreto e eficaz, as associações de aeronautas e os pilotos das aeronaves civis, igualmente preocupados com a própria vulnerabilidade e a dos passageiros).

O êxito desses primeiros ataques inspirou outros modelos para a produção desse tipo de show macabro e encenado em quase todo o mundo, inclusive no Brasil. Aqui, o quase sequestro de uma aeronave da Cruzeiro do Sul, no Aeroporto Internacional do Galeão (hoje rebatizado Aeroporto Internacional Antonio Carlos Jobim, em homenagem ao grande músico brasileiro) foi abortado por uma equipe de comandos da Força Aérea. Durante a ação, um dos extremistas morreu com tiros na cabeça e três outros foram capturados. [30]

Situações assim, escreveram Wieviorka e Wolton, reúnem características parecidas com  uma superprodução cinematográfica: de um lado os terroristas, forçando as equipes dos jornais e das emissoras de televisão a posicionar as câmeras em ângulos que lhes sejam favoráveis, analisando prévia e cuidadosamente — as perguntas repassadas por escrito,  para que nenhuma resposta possa comprometer a ideologia da organização; de outro, os repórteres praticamente assumindo o papel de coadjuvantes durante as negociações realizadas sob tensão insuportável, seja nas pistas de pouso/decolagem, em pleno deserto, no convés de um transatlântico etc.

Nesses tempos de disputa, cada vez mais acirrada pela primazia do furo jornalístico em que as networks que não economizam recursos financeiros, veículos e equipamentos para produzir as melhores imagens e apresentar uma edição caprichada sobre os fatos, vez por outra acontecem situações normalmente incogitáveis; tais como o pagamento de elevadas quantias em moedas-fortes aos extremistas (logo transferidas por intermediários de confiança às contas secretas dessas organizações) como contrapartida à exclusividade na difusão.

Trata-se, este, de um pacto ao mesmo tempo temerário e imoral. Iniciativas assim deixam mal a Imprensa, pois, supostamente em nome da liberdade de manifestação e pensamento, colaboram financeiramente com o terrorismo e estimulam a reiteração dessas operações.

Durante esse jogo coadjuvado pelas mídias, podem vir a ocorrer situações incomuns.
Vejamos exemplos recentes:

Numa primeira os terroristas são apresentados diante das câmeras com os rostos mascarados; em outra, sem qualquer disfarce. Rostos cobertos por balaclavas, indicando a participação dos que preferem continuar no anonimato; ou não, a exemplo do próprio Carlos durante o ataque perpetrado contra a sede da Organização dos Países Produtores de Petróleo, em Viena [ver em seguida]; na segunda, o que perpassa é uma sensação ainda maior de suspense, com as autoridades, vítimas e a própria população local alertada sobre a periculosidade dos extremistas quando identificados.

Quando, no dia 21 de dezembro de 1975, consumada a invasão do edifício da Organização dos Países Produtores de Petróleo, em Viena, os cinegrafistas e fotógrafos obtiveram a confirmação de que o líder do grupo era Illich Ramirez Sánchez, tanto a Imprensa internacional, como o Governo da Áustria, concluíram que a iniciativa se estendia para muito além dos propósitos meramente publicitários; que se tratava de uma incursão planejada e executada por profissionais que não recuariam diante das pressões.

Examinado trinta e seis anos depois  este continua sendo um dos episódios mais representativo do terrorismo em solo europeu na década de setenta. Trinta e cinco pessoas, entre as quais onze ministros do petróleo dos países produtores,  ficaram como reféns e foram levadas a bordo de uma aeronave civil inicialmente para Trípoli (onde, diga-se de passagem, o comandante sequer obteve autorização de pouso) e dali rumaram para Argel.

Na capital argelina, calmo e desarmado, Carlos desceu do Boeing e conversou longamente com o Presidente Houari Boumedienne, que atuou como moderador. Após uma série de negociações, idas e vindas e ameaças, a crise foi resolvida. O sequestro dos ministros do petróleo faz parte da História e, portanto, seria desnecessário esmiuçá-lo.

Em se tratando de ações planejadas e violentas, para que possa vir a ser considerado isento o noticiário deve apresentar sempre três aspectos: o trabalho das equipes de segurança, a opinião dos sobreviventes e a audáciados extremistas.

A própria Opinião Pública, na maioria das vezes, funciona como influenciadora para essas organizações, reportando os funerais dos que tombaram na confrontação com as forças de segurança, registrando a queima nas vias públicas das bandeiras dos países inimigos, exibindo cartazes e posters com os retratos dos extremistas capturados ou mortos, difundindo proclamações e manifestos etc.

Outro tópico diz respeito à confirmação do envolvimento desse ou daquele indivíduo proeminente (seja chefe de Governo, jornalista, parlamentar, artista etc) com os braços do terrorismo.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com Saddam Hussein (Iraque) e (ainda acontece até o momento em que finalizávamos este volume) com Muhammar Kadhaffi (Líbia).

Hussein, único ex-chefe de Estado no Oriente Médio que se arriscou a uma confrontação militar com as potências ocidentais (muito especialmente os Estados Unidos da América), foi duas vezes  derrotado pelas forças da Coalizão capitaneadas pelos EUA. Terminado o primeiro conflito, ele continuou no Poder, mas o peso da derrota foi terrível: as potências vencedoras instituíram uma Zona de Exclusão Aérea ao sul e ao norte do País durante dez anos, até o início do segundo conflito, que resultou na morte de mais de um milhão de crianças pela fome e doenças.

Até o desfecho trágico que todos conhecemos, ele era interpretado como uma liderança no mundo árabe e, simultaneamente, um estimulador do terrorismo direcionado aos inimigos do Islã.

A Imprensa norte-americana chegou a compará-lo ao demônio porquanto (na primeira confrontação)ordenou o disparo de mísseis Scud (de fabricação soviética) contra Israel, destruindo prédios residenciais e estabelecimentos comerciais em Tel Aviv em represália aos bombardeios norte-americanos sobre cidades e vilas iraquianas.

Saddam Hussein, fato este comprovado perante a História, nunca pretendeu fazer de Israel seu alvo prioritário; sua intenção naquele conflito foi mostrar ao general Norman Schwarzkopf, comandante das forças da primeira Coalizão,  que nem mesmo o mais forte aliado dos EUA no Oriente Médio era  invulnerável. A prometida resposta nuclear israelense, defendida com estardalhaço pelas emissoras de televisão, foi contida por solicitação do presidente norte-americano.

Em que pese a inclinação dos falcões do Pentágono desejosos de esmagar as forças armadas iraquianas com o seu formidável aparato militar, o presidente George Bush foi alertado que, admitida a hipótese do uso de armamento nuclear,  seria deflagrada uma guerra total no Oriente Médio, com os aliados árabes rebelando-se contra a Coalizão e incluindo — na mistura explosiva daquele caldeirão — um condimento mais forte e militarmente imponderável: a República Popular  da China.

Por oportuno vale registrar que o tratamento dispensado por parte da imprensa brasileira àquele conflito foi sob muitos  aspectos tendencioso, com os órgãos de difusão enfatizando a precisão cirúrgica dos ataques com mísseis e bombardeios aéreos norte-americanos, ingleses e franceses e, ao mesmo tempo, minimizando as notícias procedentes de Bagdá; rotulando como criminosos os generais iraquianos que planejaram a retomada do território do Kuwait (país criado artificialmente sob a inspiração britânica) e deixando de publicar fotografias comprovando a utilização de bombas contendo fósforo branco nos raids contra as colunas de refugiados.

Uma delas — o autor recorda-se bem, pois respondia interinamente pela editoria Internacional do Jornal do Commercio — exibia o rosto e o tronco de um tanquista iraquiano semidevorados por napalm.

Quanto ao exemplo do chefe de Estado líbio é mais complexo. O coronel Muhammar Kadhaffi apresenta características diversas. Numa primeira fase ele defendia, publicamente, as ações terroristas contra os países que apoiavam não somente a política intervencionista norte-americana como a não-criação do Estado Palestino.

O dirigente líbio, em outra cartada de mestre, adquiriu reservadamente dezenas de toneladas de explosivos plásticos produzidos na Tchecoslováquia, e anunciou que seriam utilizados contra os inimigos do Islã.

Como se isso não bastasse, para reforçar sua imagem polêmica e incomodar ainda mais os inimigos, criou uma guarda pessoal composta exclusivamente por jovens fanatizadas. A morte de qualquer uma delas, num hipotético atentado contra Kadhaffi, significaria uma agressão ao coletivo das mulheres de todo o mundo.

O presidente líbio, apesar da propaganda adversa difundida no Ocidente, sabe explorar o marketing pessoal. Veste-se habitualmente de branco (ou quando muito marrom), sua bebida favorita é leite de camela e até recentemente costumava receber os chefes de Estado em visita ao país numa tenda ao ar livre, seguindo o velho estilo nômade (e também para dificultar tentativas de assassinato); suas tropas, ao menos aparentemente, eram bem treinadas e equipadas, enquanto a Líbia foi transformada num refúgio inviolável para um numeroso grupo de mercenários de toda a África e de outros tantos sabotadores contrários aos interesses do Islã.

Comparativamente a Saddam Hussein, o coronel Kadhaffi é extrovertido, conhece a linguagem e a extensão das mídias e a sua retórica reflete a preocupação maior da Causa Árabe e Pan-Africana. Tanto assim que, há alguns anos, mais de setenta por cento da ajuda humanitária em solo africano vinham sendo custeados pela Líbia.

Em contrapartida, a leitura que ainda se faz sobre Saddam Hussein é muito diferente. Seus trajes diários eram o uniforme de comandante em chefe das tropas; seu olhar, glacial e impassível diante das câmeras; a postura, marcial até a raiz dos cabelos; costumeiramente caminhava nas ruas cercado de generais e guarda-costas (o que não surpreende, face às tentativas para assassiná-lo, inclusive envolvendo pessoas da sua própria família). 

Em comum, Líbia e Iraque sofreram boicote econômico proporcionado pelos EUA e demais países aliados, na tentativa de esmagar a economia e instalar governos em moldes favoráveis aos interesses das potências ocidentais. Num primeiro momento as ações militares levaram à destruição do exército iraquiano, localização, captura,  julgamento e execução por enforcamento de Saddam Hussein; mais recentemente, por intermédio de revoltas populares que começaram em dezembro de 2010, além do colapso dos governos da Tunísia e do Egito, da criação de mais um país (Sudão do Sul).

Finalmente, uma rebelião popular colocou em xeque a longevidade (42 anos) do regime político na Líbia.

Milhares de civis e militares rebeldes e/ou leais a Kadhaffi foram mortos, enquanto o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovava, com cinco abstenções, inclusive do Brasil, o bloqueio aéreo daquele país e todo um conjunto de ações táticas (que ferem as normas elementares do Direito Internacional). A Capital, Trípoli, foi tomada pelos rebeldes, mas alguns bolsões de tropas leais ao governo resistiam.

Mesmo que Muhammar Kadhaffi seja capturado e levado ao Tribunal Internacional Penal (Haia); ou  seja morto pelos rebeldes; ou, ainda, que consiga obter o benefício do asilo em algum país africano, a situação na Líbia e, por extensão no Grande Maghreb permanecerá confusa devido à presença de combatentes das mais variadas tendências e grupos engajados na Jihad Islâmica.

14. Chavin de Huantar

À percepção sobre essas personagens engajadas no universodo extremismo corresponde uma contrapartida: a dos anti-heróis. A opção do Presidente peruano Alberto Fujimori (El Chino) é digna de registro. Ele protagonizou um papel singular e dificílimo em um momento que o seu governo enfrentava duras críticas por parte da oposição.

A reviravolta que o projetou de ator simplório a megastar para a mídia internacional, restituiu-lhe a popularidade que perdera (ao longo dos 126 dias de tensão após o ataque perpetrado pelo Movimento Revolucionário Tupac Amaru - MRTA -ao conjunto de prédios da Embaixada do Japão, em Lima).

De repente, sob o enquadramento irretocável das câmeras da CNN e das emissoras de televisão locais, viu-se, quando impulsionadas por uma explosão, partes do telhado da Embaixada foram projetadas para o alto; em seguida, novas detonações e as imagens — captadas de diversos ângulos: do nível da rua às coberturas dos edifícios próximos — mostram soldados e oficiais das tropas de elite (142 homens selecionados por sua perícia como atiradores) disparando armas automáticas, reféns sendo retirados por passagens laterais, ouvem-se gritos e militares e policiais uniformizados são filmados carregando feridos para as ambulâncias estacionadas nas imediações.

Terminou assim, em doze minutos contados pelo relógio, a Operação Chavin de Huantar, elaborada sob rigoroso sigilo com a ajuda de especialistas norte-americanos (e, comenta-se, israelenses). Os 14 guerrilheiros do Movimento Revolucionário Tupac Amaru foram liquidados e 71 (dos 72) reféns enclausurados, desde o dia 17 de dezembro de 1996, voltaram para as suas casas. O ataque dos 140 homens da Marinha, Exército e Polícia pôs fim ao exaustivo jogo de paciência entre os militares e os ativistas do MRTA.

O bem sucedido coup de main desferido pelo Presidente Alberto Fujimori projetou ainda mais o país junto aos Estados Nacionais declaradamente engajados na luta contra o terrorismo: Estados Unidos da América, Reino Unido, Alemanha, França, Itália Rússia e Israel.

Em relação a esse episódio, vale registrar a cobertura jornalística ininterrupta por parte das mídias desde que, na noite de 17 de dezembro de 1996, disfarçados como garçons, os guerrilheiros do MRTA driblaram a vigilância dos guardas e fizeram quase quinhentos reféns.

Os primeiros informes, repassados à Imprensa pelo próprio Fujimori imediatamente após o resgate dos primeiros reféns, entre os quais o embaixador da Bolívia, ressaltaram a ingenuidade e o descaso dos extremistas que, embora tivessem conhecimento (por intermédio de fontes externas) dos túneis que vinham sendo cavados pelas forças de segurança do governo, nada fizeram para diminuir o risco. Por exemplo, em vez de manterem rígido controle sobre os prisioneiros, divertiam-se jogando partidas improvisadas de futebol num dos salões da Embaixada, local exato em que foram surpreendidos pela violência da primeira explosão, atordoados com granadas de luz e fuzilados sem hesitação.

Alberto Fujimori agiu profissionalmente. Não pactuou com os terroristas e ganhou tempo para que as suas tropas treinassem (em local secreto); por fim, vitorioso no rápido confronto armado, conquistou novo triunfo, desta vez com a Imprensa, demonstrando timing perfeito diante dos jornalistas e conhecimentos minuciosos sobre a operação militar.

Sua performance:

  • Enquanto ainda eram ouvidos explosões e disparos intermitentes vindos do interior da Embaixada, o Chefe de Estado solidarizou-se com os soldados e oficiais que participaram da Operação Chavin de Huantar, e junto com eles cantou o hino nacional do país;
  • Vestindo colete à prova de balas, entrou em um dos túneis construídos pelas forças de segurança e percorreu, na companhia de militares e jornalistas, as instalações semidestruídas da Embaixada do Japão;
  • Convocou a Imprensa para uma entrevista coletiva durante a qual mostrou a maquete do complexo de prédios que serviu de modelo para os ensaios táticos das tropas especiais;
  • Exibiu à Imprensa internacional um vídeo dos exercícios praticados peloscomandos em local secreto, explicando o desenvolvimento de cada etapa;
  • Pronunciou discurso impactante diante das câmeras, no qual ressaltou o repúdio do povo peruano aos extremistas;
  • Compareceu, no dia seguinte à Operação, aos funerais do juiz da Suprema Corte do Peru e dos (dois) oficiais mortos durante o tiroteio;
  • Beneficiou-se perante a mídia internacional por conta do espetáculo derivado da bem sucedida ação militar, após combate duríssimo que, mal conduzido, certamente lhe custaria o mandato presidencial;
  • Aos repórteres da Imprensa estrangeira, mostrou-se desprovido de vaidades; como se fora uma pessoa simples que pouco tempo dispõe para cuidar das próprias roupas;
  • Passeou, em seguida, pelas ruas de Lima sentado no banco da frente de um carro sem escolta, distribuindo acenos aos transeuntes e recebendo cumprimentos de senhoras e crianças;
  • Sinalizou aos investidores estrangeiros sobre a retomada do equilíbrio político e econômico do seu país, superado o impasse provocado pela ação terrorista;
  • Projetou, simultaneamente, a imagem dos comandos peruanos como exemplos de competência e dedicação, equiparando-os às melhores forças de contrainsurgência do mundo no combate contra o terrorismo.

NOTAS

[1] Trata-se de conhecida manobra utilizada pelos Exércitos no combate à guerrilha. Consiste na mobilização e deslocamento de um numeroso contingente que — como se fora um martelo — pressiona o inimigo até que este, exausto e sem alternativas de fuga, é obrigado a fugir na direção de tropas ainda mais poderosas e bem armadas, estacionadas à frente, que funcionam como  bigorna.

[2] BADINTER, Robert. Terrorisme et Liberté, Le Monde, 19 out. 1977.

[3] BOURRICAUD, François. L’Osservatore Romano. Il terrorismo politico, 15 set. 1978.

[4] CAMUS, Albert. O homem revoltado, p. 221.

[5] FOLHA DE S. PAULO. SPITZCOVSKY, Jaime, entrevista cit..  Bomba Portátil – Alexander Lebed diz que Kremlin perdeu controle de maletas que funcionam como armas atômicas. General russo alerta contra terror nuclear.  

[6] FOLHA DE S. PAULO. SPITZCOVSKY, Jaime, entrevista cit. Bomba Portátil – Alexander Lebed diz que Kremlin perdeu controle de maletas que funcionam como armas atômicas. General russo alerta contra terror nuclear.

[7] O Globo. Sob a ameaça do terror químico, 26 nov. 1997, p. 38.

[8] WILKINSON, Paul. Terrorismo Político, p. 17.

[9] LAQUEUR, Walter. Jornal da Tarde. Por que o terror? 1 abr. 1978.

[10] ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - um relato sobre a banalidade do mal, p. 125.

[11] O Clube Breton, rebatizado depois como Sociedade dos Amigos da Constituição, arrendou inicialmente o refeitório de um antigo mosteiro jacobino nas proximidades do Jardim das Tulherias. Em seguida, ocupou todas as instalações. O apelido resultou dessa conjunção de fatores. Quanto aos associados, num primeiro momento eram tão somente deputados do povo; em seguida, esses quadros foram reforçados por intelectuais e burgueses. Em 1794 (Cf. Will e Ariel Durant, op. Cit., v. 11, p. 32), existiam na França 6800 clubes jacobinos, totalizando aproximadamente 500 mil pessoas.

[12] Quanto ao Grande Comitê, na sua fase mais representativa (isto é, durante o verão de 1793), era integrado por doze homens da classe média: Lazare Carnot, Robert Lindet, André Jeanbon Saint-André, Maximillien Robespierre, Louis Antoine Saint-Just, Georges Couthon, Bertrand Barère, Marie-Jean Hérault de Séchelles, Pierre Louis (cognominado Prieur de la Marne), Jean-Marie Collot d’Herbois, Jean-Nicolas Billaud-Varenne  e Claude-Antoine Prieur-Duvernois.

[13] DURANT.Will e Ariel. História da Civilização, v. 11, p. 62.

[14] Os girondinos integravam o grupo mais ativo da Assembleia Legislativa. Na sua quase totalidade, jacobinos de origem foram duramente perseguidos até 1795, quando o cenário político foi modificado.

[15] DURANT, Will e Ariel. História da Civilização, v.cit. p. 73.

[16] Nascido na Espanha, filho de um comunnard no exílio, Emile Henry foi aluno brilhante da École Polytechnique. Notabilizou-se na Imprensa europeia por haver colocado uma bomba diante dos portões dos escritórios da companhia de mineração Carmoux, e lançado — tempos depois — um petardo no Café Terminus, ambos em Paris. No primeiro atentado morreram vários policiais quando procuravam remover o dispositivo de acionamento; no segundo, uma pessoa não resistiu aos ferimentos e dezenas de outras foram atingidas pelos estilhaços. Preso, foi julgado e condenado à morte; antes, porém, de ser guilhotinado, redigiu um libelo no qual responsabilizava a sociedade burguesa pela violência desencadeada contra os trabalhadores, publicado na Gazeta dos Tribunais, edição de 27- 28 de abril de 1894.

[17] WOODCOCK, George. Os grandes escritos anarquistas, p. 58.

[18] WOODCOCK, George. Op. cit.  p. 41.

[19] GUÉRIN, Daniel. Anarquismo, p. 80.

[20] GUÉRIN, Daniel. Op. cit. p. 13.

[21] YALLOP, David. Até o fim do mundo, p. 104.

[22] FORSYTH, Frederick. Carlos, o Chacal. Folha de S. Paulo, 21 ago. 1994.

[23] BECKER, Howard. Uma teoria da ação coletiva, p. 53.

[24] LAQUEUR, Walter. O terrorismo pós-moderno. Foreign Affairs, número 2, p. 7.

[25] O Smersh era o Diretório Central da Contra-Espionagem das forças armadas soviéticas. Reporta Oleg Penkovsky em suas confissões que, em 1946, aquele órgão passou a integrar o MGB (rival soviético da CIA). O Smersh permaneceu ativo até 1947.
 
[26] O anoitecer do Chacal. IstoÉ, 19 mai. 1993, p. 5-7. O primeiro apelido, explicou Georges Watin, decorreu da paralisia que sofreu, quando criança, na perna esquerda; o segundo, da sua predileção em trabalhar com facas durante as sessões de interrogatório.
 
[27] O relato ditado a um repórter pelo próprio Carlos e veiculado com destaque na Imprensa europeia e norte-americana, não somente projetou seu codinome no cenário (e no imaginário) do terrorismo engajado, como forçou os órgãos de difusão a se preocuparem mais com a questão palestina. Por fim, serviu como sinal de alerta para os agentes dos órgãos de inteligência, uma vez que tinham pela frente um inimigo cruel e de pontaria infalível.

Eis como publicado originalmente no jornalAl  Watan  Al-Arabi:

No dia 27 de junho de 1975, a Polícia bateu no apartamento em que eu morava,  alugado por duas venezuelanas amigas minhas. Foi através delas que o libanês Michel Moukharbel descobrira onde eu estava. Algum dos meus quatro amigos que ali estavam abriu a porta. Os policiais entraram e perguntaram por Maya Lara. Respondi que ela havia viajado para a América do Sul e lhes ofereci um copo. Eles recusaram e pediram nossos passaportes. – Conhece Moukharbel? Perguntou o inspetor. Não conheço ninguém com esse nome, respondi. Mas ele diz que lhe conhece, e me mostrou a foto em que eu estava com Moukharbel  perto do apartamento. Eu perguntei: o que é que ele fez? Droga? Terrorismo?   Em seguida eu pedi que me mostrassem suas carteiras. Perguntei: Onde está o libanês? No carro estacionado lá embaixo. Posso vê-lo? Deve haver um mal entendido.
O investigador desceu a escada para ir buscar Moukharbel. Desde que percebi que era uma armadilha, preparei para lutar e sair. Quando o policial voltou com Moukharbel, eu fiquei horrorizado. Estava completamente mudado. Tinha um ar letárgico, conseqüência, sem dúvida, das torturas que lhe tinham aplicado. A uma pergunta do inspetor, respondeu: foi a ele que eu dei a mala (onde estavam guardadas armas de diferentes calibres e a munição correspondente). Tirei meu revólver. Era um revólver russo Tokarev 7.62. Acertei os dois policiais, ambos na cabeça. Sobrou Moukharbel. Ele veio na minha direção, com as mãos nos olhos. Ele sabia as regras do jogo: o traidor está condenado à morte. Ele estava diante de mim. Atirei no meio dos olhos. Ele caiu. Atirei de novo na têmpora. Saí do edifício, pulando da janela do terceiro andar.

[28]  WATIN, Georges. IstoÉ, art. cit. p. cit.

[29]  WIEVIORKA, Michel, WOLTON, Dominique. Terrorisme à la UNE, p. 42-43.

[30] Tiros em pneu de avião e fumaça impedem seqüestro. Jornal do Brasil, 2 jul. 1970, p. 7.


*José Amaral Argolo é advogado, jornalista e professor-associado do Quadro Permanente da Escola de Comunicação da UFRJ.

 

 

 







Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro | ISSN 1806-2776 | Edição 14 | Novembro | 2011
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