Novembro de 2011
Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ISSN 1806-2776
 
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MONOGRAFIAS

A cobertura dos fenômenos pluviométricos
no jornalismo impresso do Piauí

Por Jhussyenna Reis de Oliveira
e Marcos Antônio de C. M. Teixeira*

RESUMO

Reprodução

O presente estudo baseia-se na caracterização da abordagem jornalística sobre o período chuvoso na cidade de Teresina, Piauí. O Jornal O Dia, com sede na própria capital, foi utilizado como amostra na pesquisa por ser o mais antigo jornal diário do estado, fundado em 1° de fevereiro de 1981.

A pesquisa foi estruturada em Levantamento Bibliográfico e Pesquisa Documental, com a aplicação do Método da Análise de Conteúdo nessa segunda etapa. O período analisado compreende os anos de 1980 a 2006, sendo utilizadas todas as matérias publicadas no primeiro trimestre de cada ano pelo fato desses meses concentrarem os maiores índices pluviométricos.

Constatou-se que a abordagem comporta-se no geral, de forma neutra e superficial, à medida que o conteúdo é reduzido a dados informativos que não conduzem o leitor a associar o problema das chuvas/enchentes/inundações a uma questão propriamente ambiental. Essa abordagem deficiente acaba compactuando com o ciclo crítico também identificado na pesquisa, no qual o período chuvoso é evidenciado por suas conseqüências catastróficas e ações governamentais apenas de contenção imediata que logo saem de pauta e são esquecidos pela sociedade até que voltem a significar ameaça recomeçando, assim, o ciclo.

PALAVRAS-CHAVE: Fenômenos Pluviométricos / Jornalismo Impresso / Piauí

1. Introdução

As cidades são a representação material de uma história marcada por revoluções. Seus elementos carregam a marca de cada árvore derrubada, cada corpo d’água extinto, cada exemplar de espécie morta. Durante muitos anos os elementos naturais mantiveram-se em silêncio, respondendo apenas esporadicamente com um ou outro acontecimento.

Entretanto, com o crescimento intenso das populações e avanço da urbanização os problemas ambientais começaram a se manifestar acompanhando as mudanças tecnológicas que impunham um ritmo acelerado. Nesse sistema gradativo, a comunicação de massa figura como força básica de construção social que possui um poder específico de dissipar informações imprescindíveis aos diversos grupos sociais tanto em âmbito local como global.

Cornu (1998) diz que “informar é tratar uma informação visando torná-la significativa para outras pessoas, no sentido corrente, isso compreende ao mesmo tempo um conteúdo e uma forma, bem como sua transmissão, sua comunicação”. Partindo desse pressuposto, o presente trabalho fundamentasse no fato da informação ser um elemento chave na construção de uma consciência ambiental, bem como ressalta-se aqui os desafios do jornalista frente à temática ambiental que se concretiza a cada dia como essencial ao interesse público à medida que seus impactos são ampliados afetando inclusive a saúde e o tão sonhado “progresso” das diferentes populações.

A pesquisa objetivou analisar a abordagem do conteúdo ambiental no jornalismo piauiense a partir da cobertura de fenômenos pluviométricos pelo Jornal O Dia nos anos de 1980 a 2006. O período foi fundamentado no fato dessas três últimas décadas representarem uma explosão dos temas ambientais no cenário global, acompanhado dos intensos processos de urbanização e caracterização espacial da cidade de Teresina, que além de capital do Piauí também abriga a sede do jornal selecionado. Vale ressaltar que o jornal O Dia é o mais antigo entre os jornais diários que circulam atualmente no Estado, fundado em 1° de fevereiro de 1951, o que lhe atribuiu ao longo do tempo, tradição e certa credibilidade em todo o território piauiense.

O levantamento bibliográfico acompanhou toda a estruturação do trabalho conferindo-lhe maior argumentação e configuração das idéias expostas, seguido de uma fase experimental que compreendeu a análise exploratória de 2873 matérias publicadas pelo jornal com temas ambientais das quais 1145 abordaram informações relacionadas a chuva/enchente/inundação. Esse tripé é a base dos fenômenos pluviométricos que deu margem ao recorte temático proposto na pesquisa, justificado ainda, por serem esses fenômenos visivelmente os mais importantes no cenário urbano.

Isso porque à medida que seus impactos ambientais foram freneticamente intensificados pelos conflitos políticos e sócio-econômicos eles vão moldando a organização espacial das cidades, com ênfase à capital piauiense. Para tanto, estabeleceu-se ainda que o período chuvoso mais concentrado no primeiro trimestre de cada ano seria o alvo da coleta de dados.

2. A apropriação midiática da temática ambiental

À medida que a informação é explorada apenas pelo alarmismo, concentrado nos níveis físico e biológico dos fatos, encobre-se todo o foco social que permeia cada situação. Isso contribui para a formatação catastrófica tão freqüente nos notícias sobre o meio ambiente, fato que resulta ainda no distanciamento do espectador de uma reflexão mais crítica da informação que lhe é transmitida.

Não é preciso muito resgate histórico para perceber que foi a crise que levou o meio ambiente até a mídia, isso porque em uma sociedade capitalista e imediatista como a nossa, somente duas coisas realmente são importantes: os bens e a continuidade dos bens. Isso significa que os fatores ambientais nunca foram relevantes o bastante para suplantar as necessidades econômicas e desenvolvimentistas dos indivíduos e das próprias nações. Até mesmo as grandes catástrofes ambientais, como a explosão do reator de Chernobyl, são evidências de como as políticas públicas são impulsionadas quase que unicamente pelo crescimento econômico, em detrimento, muitas vezes, do bem-estar da coletividade. Sabe-se que as perdas que caracterizam uma catástrofe geralmente se iniciam pelas vidas, em segundo plano pelos recursos naturais, mas no final sempre acabam eclodindo na esfera econômica.  

Existe uma dupla agressão nos ecossistemas: uma, é a do consumo ostentatório, do desperdício, dos descartáveis, do lixo excessivo; a outra a do subconsumo, das condições miseráveis de vida. Assim, a questão Ambiental faz questionamentos diante do crescimento econômico sustentado sobre as desigualdades sociais. Nesse contexto, temas como miséria, fome, condições subumanas de moradia, são temas tão ambientais quanto, poluição, devastação das florestas, biopirataria e extinção de espécies animais (ALVES, 2002, pg.05).

De acordo com a autora acima pode-se perceber que a comunicação de informações ambientais exige uma atenção específica, demanda pesquisa e conhecimento. Vale ressaltar que esses requisitos não significam que o jornalista irá imprimir sua ideologia nas matérias, mas que o mesmo oferecerá informações de qualidade e real importância na compreensão e reflexão dos fatos, ou seja, informações suficientemente apuradas capazes de despertar no público questionamentos, contribuindo para um debate saudável.

Porém, dentro desse modelo ideal tão ambicionado no jornalismo, é importante não perder de vista uma característica básica da mídia: ela é antes de tudo, uma grande agência mercadológica. Beltrand (2004) reforça que o jornal ou outro veículo jornalístico de massa é uma indústria que visa o lucro como qualquer outra, sendo os jornalistas seus funcionários. Diante disso, tem-se que a notícia, o mais comum produto jornalístico, possui uma finalidade básica: ser vendida. Para tanto, com a caracterização dessa nova vertente jornalística, o jornalismo ambiental, novas linhas de produção e posturas tiveram que ser incorporadas como alguns termos de caráter ambiental até então desconhecidos:

Sustentabilidade, ecologicamente correto, responsabilidade social, defensivos agrícolas (ao invés de agrotóxicos ou venenos), natural, integral, biodiversidade, área verde, natureza, saudável, transgênicos, geneticamente modificado, mutação genética, orgânico, aquecimento global, camada de ozônio e tantas outras, são palavras que foram incorporadas pelos redatores e podem ser usadas em qualquer ocasião, pois pouca gente sabe o que na verdade elas realmente significam, ao contrário de assuntos que dominam o noticiário como: economia e inflação, política e políticos, esporte e times de futebol (LESTINGE, 2008, p.32).

Assim, a introdução dos conteúdos ambientais no jornalismo exige uma atenção especial, desde a coleta da informação, produção da notícia até sua transmissão ao espectador. Este, por sua vez, também passa a ser visto de outra maneira, pois ao se tratar de meio ambiente todos os tipos de públicos devem compor o público-alvo, afinal as informações ambientais independem de classe, raças, sexo, nacionalidade e até mesmo grupo cultural, pois todos necessitam de ambientes saudáveis para garantir sua sobrevivência.

Isso significa que os temas ambientais devem ser direcionados ao cidadão.

Alves (2002) acredita que a imprensa brasileira dificilmente trata dos problemas ambientais com a profundidade e clareza necessária na pauta das discussões públicas. Para a autora, geralmente, os temas ficam sujeitos a enfoques superficiais ou distorcidos que esporadicamente destacam-se sob a forma das "Ecocatástrofes", através do terrorismo de manchetes de uma "natureza na UTI.", ou seja, ressaltam a ecologia sob a face do medo veiculado.

No Brasil, percebe-se que a imprensa tem suas pressões redobradas, devido a riqueza natural que possui, afinal os olhos de todo o globo encontram-se voltados para o “pulmão do mundo”, denominação originada dentro da própria mídia que erroneamente associou a Floresta Amazônica à produção ou ciclagem de oxigênio com proporções globais – idéia essa, que mesmo sem base científica, foi difundida e ainda permanece no imaginário social da maior parte dos cidadãos.  

Um fator que merece também destaque é a percepção. Esta é uma ferramenta cotidiana do jornalismo que nem sempre é valorizada à altura. E em se tratando da representação midiática do meio ambiente, a percepção assume um patamar bem mais significativo pelo fato da mídia trabalhar com a resignificação das coisas o que implica diretamente no grau de sensibilidade despertado ou não no seu público.

O conhecimento intervém em todo processo de significação do mundo e de apropriação da natureza. O saber, como objeto de estudo, rompe o binômio ecológico-cultural para analisar o processo mental de apropriação do mundo e da natureza. No saber de cada cultura inscreve-se a simbolização do meio, o valor econômico das plantas, as relações sociais e a divisão do trabalho, as formas de solidariedade e reciprocidade de coesão social e identidade cultural (LEFF, 2001, p. 279-280).

Como demonstrado pelo autor acima, a significação é uma etapa do próprio conhecimento. Sendo ela bem expressa, bem direcionada, pode despertar uma interpretação apurada do real valor das coisas e das próprias pessoas. Se o conhecimento não for o fim da informação, o jornalismo não exercerá o papel de educador que lhe é implícito.

Para Lestinge (2008) estudar o conteúdo da mensagem jornalística representa um poderoso instrumento para se entender um dos elos na formação do processo da cadeia decisória de atitudes individuais (grifo nosso) o que, por conseguinte irá refletir com forte impacto no ambiente. Isso porque as forças ideológicas claramente são as bases das civilizações desde os primórdios da história do homem, onde, atualmente é a comunicação de massa é o principal elemento formador de consenso.

Segundo esse mesmo autor, “pode-se forjar um consenso pela maneira como determinado assunto é tratado na mídia pelo uso das palavras, pela repetição do tema e várias outras técnicas, sobre o qual a população não tem uma opinião formada por falta de informação ou interesse” o que torna mais urgente o conhecimento não apenas dos conteúdos trabalhados, mas a forma como são transmitidos à população.

Quando não há formação, a informação acaba perdendo o seu real sentido o que representa grave risco quando os dados manipulados são de caráter científico e/ou ambiental. Segundo o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (1992) “A educação ambiental requer a democratização dos meios de comunicação de massa e seu comprometimento com os interesses de todos os setores da sociedade. A comunicação é um direito inalienável e os meios de comunicação de massa devem ser transformados em um canal privilegiado de educação, não somente disseminando informações em bases igualitárias, mas também promovendo intercâmbio de experiências, métodos e valores”.

A informação, portanto, deve estar dirigida para a conscientização dos cidadãos, a fim de assegurar a total compreensão dos processos e conflitos inerentes nos níveis nacionais e internacionais, e sua capacitação para participar dos processos de tomada de decisão.

3. Procedimentos metodológicos

A pesquisa foi delineada com base na Pesquisa Documental, complementada pelo Levantamento Bibliográfico. Para a coleta de dados, explorou-se o acervo do Arquivo Público de Estado do Piauí, que contém todos os exemplares do Jornal O Dia (OD) aqui utilizados. O método selecionado foi a Análise de Conteúdo (AC), que consta de uma “técnica de pesquisa para a descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação”, segundo definição formulada em 1952 pelo estudioso Bernard Berelson. (DUARTE E BARROS, 2005).

A análise de conteúdo aqui utilizada seguiu as etapas definidas pela francesa Laurence Bardin (2006). Segunda a qual a técnica nasceu nos Estados Unidos no início do século XX, sendo essencialmente voltada para análise de material jornalístico. De acordo com a clássica definição da autora pode-se estruturar a análise em procedimentos como a organização, codificação, categorização, a inferência e o tratamento informático, as quais devem estar organizadas em torno de três pólos cronológicos: pré-análise, exploração do material e tratamento e interpretação dos dados. Na pré-análise ocorre a seleção dos documentos que serão pertinentes ao estudo através de uma leitura superficial, chamada Leitura Flutuante. Para essa seleção foi utilizada a tabela abaixo:

Tab. 1. Modelo de Ficha de Quantificação.

JORNAL “O DIA” - QUANTIFICAÇÃO

ANO __________ / MÊS_____________

DIA
MATÉRIA
LOCALIZAÇÃO
     
     
     
     
     
     

FONTE: Elaborado pelas autoras, 2010.

A exploração do material é a análise propriamente dita, onde as matérias selecionadas passam por um processo de codificação. (Tabela 2). E, posteriormente, ocorre o tratamento informático dos dados, já com o auxílio do computador.

Tab. 2. Modelo de Formulário de Codificação.

FORMULÁRIO DE CODIFICAÇÃO
Jornal: O Dia Ano: Mês:
Título: Página:
1. Presença de Ilustração
Sim Não Fotografia Desenho Gráfico Box Outro
2. Gênero Predominante
Nota Notícia Reportagem Artigo científico Outro
3. Origem
Editorial Opinião Empresarial Governo Outro
ANÁLISE DO TEXTO
4. Abrangência da informação
Local – Teresina Local - Piauí Regional - Nordeste Nacional - Brasil Internacional
5. Conotação da Mensagem
Mensagem de chuva com caráter metereológico Mensagem de chuva do foco social Mensagem de chuva com outra conotação:
6. Conteúdo da Mensagem – predominante
O Fenômeno natural relacionado à economia O Fenômeno natural relacionado à política O Fenômeno natural relacionado à calamidade pública Outro:
ANÁLISE DE FOTO
7. Origem da imagem
Local – Teresina Local - Piauí Regional - Nordeste Nacional - Brasil Internacional
8. Quantidade de fotos (       )
9. Conteúdo da Mensagem – predominante
O Fenômeno natural relacionado à economia O Fenômeno natural relacionado à política O Fenômeno natural relacionado à calamidade pública Outro:

FONTE: Elaborado pelas autoras, 2010.

4. Resultados e discussão

4.1. Caracterização Geral

Na primeira etapa da pesquisa foi possível identificar os temas ambientais presentes nas matérias do primeiro trimestre de cada ano dentro do período analisado. (1980 a 2006) Assim, os temas depois de listados foram agrupados em 10 categorias (Tabela 3), conforme a análise exclusiva de notícias, notas, reportagens ou artigos não incluindo textos publicitários de nenhuma espécie. Isso porque o objetivo da pesquisa está centrado na abordagem jornalística somente.

Tab. 3. Categorias identificadas de 1980 a 2006.

Representação Categoria Temática Frequência
C 1 Chuva 1145
C 2 Infraestrutura 446
C 3 Preservação 297
C 4 Água 226
C 5 Lixo 203
C 6 Seca 160
C 7 Fauna 127
C 8 Degradação 116
C 9 Flora 113
C 10 Clima 40

FONTE: Elaborado pelas autoras, 2010.

A partir desse novo agrupamento é mais nítido verificar a distribuição dos temas ambientais abordados pelo jornal ao longo das décadas estudadas. Conforme a Figura 1 comprova-se a presença abundante de matérias com a categoria C1 , sendo a mesma a de maior interesse nessa pesquisa, já que engloba os textos sobre chuva, enchentes e inundações.

Fig. 1. Categorias Temáticas (valores em percentual).

A categoria C2 apresenta-se em segundo lugar com um bom número de textos, esse grupo inclui informações envolvendo infra-estrutura, saneamento e energia. No geral, textos que noticiaram problemas na infra-estrutura urbana, ligados, portanto, direta e indiretamente ao meio ambiente. Nos textos sobre energia, destaca-se a cobertura do racionamento energético que recebeu ênfase em todo o país, em um primeiro momento, na década de 80 e voltou a se repetir já nos anos de 2001 e 2002.

Na categoria C3 os textos incluem informações de preservação, cobertura de movimentos ecológicos, reportagens sobre educação ambiental onde se destaca as ações de uma Organização Não-Governamental (ONG) local, a Furpa (Fundação do Rio Parnaíba), com realização de programas e projetos inclusive uma Campanha de Reflorestamento das Margens do Parnaíba que ganhou bastante repercussão. Foram observados ainda nesse grupo, textos abordando a Amazônia e os parques ambientais da cidade de Teresina com destaque ao Parque Zoobotânico, bem como os demais Parques Nacionais do Estado. As informações sobre esses parques caracterizam-se ora por retratar problemas de infra-estrutura, ora ressaltar sua beleza e importância.

Nos textos que trataram de legislação ambiental, os órgãos citados foram o IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente) e SEMAR (Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí). Vale ressaltar que os mesmo começaram a aparecer com maior freqüência nos jornais de 1990 a 2006, sendo que apenas a partir de 2001 começaram a inserir vocábulos como Impacto Ambiental e RIMA (Relatório de Impacto Ambiental). Por fim, incluíram-se nesse grupo as matérias que abordaram a beleza cênica, ou seja, ressaltam as belezas naturais seja do ponto de vista turístico ou como patrimônio da sociedade.

Na C4 as informações retratam a água em diversos aspectos, destacam-se aqueles relacionados à economia, problemas de falta de água mais ligados ao semi-árido e projetos de abastecimento na capital e nas demais cidades do Estado. A categoria C5 engloba, em geral, os textos ligados aos resíduos sólidos tratados sempre com a denominação popular “lixo”, o foco são os problemas de sujeira da cidade, em especial em locais mais pobres e sem infra-estrutura adequada. Houve ainda a presença de poucas matérias que retrataram a reciclagem ou reutilização de materiais.

C6 são matérias que noticiam a situação da seca com ênfase ao sertão nordestino, incluem informações de ações governamentais sobre a situação das famílias atingidas pela problemática, abastecimento com carros pipas, informações sobre a situação dos agricultores e a safra nesse período. Enquanto C7 e C9 retratam fauna e flora respectivamente de forma direta, com ênfase a pesquisa envolvendo espécies ainda inexploradas ou a utilização econômica das mesmas. Na categoria C8 têm-se questões envolvendo diversos problemas relacionados à degradação natural como casos de poluição, desmatamento, desertificação, assoreamento, queimadas, crimes ambientais e exploração de recursos naturais cujo cenário vai desde o local ao nacional.

As matérias sobre clima (grupo C10) retratam desde assuntos como a polêmica Mudança Climática Global de caráter mais internacional, quanto o fenômeno do efeito estufa, terremotos, maremotos, nevascas e outros fenômenos climáticos bem diferentes da realidade local. Vale citar ainda alguns textos ligados à alta temperatura, já estes abordados sempre em caráter local, caracterizados basicamente pela pura informação sobre as condições de temperatura da capital em termos de previsão meteorológica com ressalvas de suas influências no cotidiano da população.

De acordo com Rabelo et. al. (2005) inicialmente pode-se agrupar as notícias referentes ao meio ambiente em dois grupos: o que trata da temática ambiental de maneira direta, com elaboração de cadernos especiais e destinando espaços específicos para as notícias e o segundo, mencionando os temas de maneira indireta, com assuntos ambientais compondo editorias como polícia, comportamento, economia, entre outras. No OD, não existe uma seção específica para o tema meio ambiente, o que é positivo até certo ponto, tendo em vista que o tema é totalmente transversal, portanto, segmentá-lo pode ser perigoso.

Os temas presentes ao logo desses 26 anos apresentam uma particularidade interessante. Na década de 80 os textos sobre infra-estrutura superam aqueles com o tema lixo, porém ambos estão de certo modo equiparados, em 90 o quadro se inverte e a partir de 2000 ambos têm seus índices igualados e o tema água ganha maior espaço. Isso ocorre, porque na década de 80, a cidade encontrava-se em princípio de urbanização, de um modo geral os problemas de infra-estrutura física eram muito mais abrangentes acompanhados da situação de saneamento da cidade.

Já nos anos 90, a ênfase é a sujeira, pois a infra-estrutura já havia evoluído de certo modo deixando, entretanto serviços de limpeza urbana deficientes; e em 2000 não surpreende a temática da água ganhar notoriedade tendo em vista a tendência nacional (e mundial) de voltar às preocupações de todos os seguimentos sociais a esse recurso que é vital e finito.

4.2 A abordagem dos Fenômenos Pluviométricos

Partindo agora a análise do grupo C1, no quesito localização, o índice de irregularidade das seções em que as matérias estavam inseridas foi muito grande, destacando-se as 300 matérias constatadas na capa, sendo que as demais se apresentaram distribuídas irregularmente não só pelas diversas seções do jornal, mas também em seus diferentes cadernos. Vale ressaltar que as que se apresentaram na capa, geralmente, ganharam um destaque muito grande, tomando quase toda a folha, além de acompanhadas por manchetes bastante enfáticas, raramente apareciam como pequenas notas de capa.

Observou-se o crescimento do gênero Reportagem, que apesar de singelo, é também de grande importância, pois a reportagem foi considerada nesta pesquisa como um texto mais trabalhado, mais elaborado que demanda tempo, pesquisa e leitura do profissional de jornalismo o que nos leva a concluir que resultará em um texto mais rico.

De fato, ao jornalista, pesa a responsabilidade direta da construção dos sentidos que chegam ao leitor, no caso da mídia impressa. Entretanto, havemos de considerar também o perfil da sua agência de notícias, condições de tempo e espaço destinado a determinado tema no veículo e a própria demanda pública para o assunto:

A capacidade de extrapolar o factual e expressar o contextual possibilita aos jornalistas escolherem a amplitude da abordagem da realidade que pretendem desenvolver em suas notícias, sem abrir mão dos fatos. Isso significa que a factualidade é imperativa no jornalismo, mas o quanto os jornalistas vão se empenhar para reconstituir em seus textos as conexões do factual com o contextual é uma decisão profissional (BENEDETI, 2006, p.18).

De acordo com o autor acima, não desconsiderando as pressões as quais o jornalista está sujeito, mas ressaltando sua enorme responsabilidade social, uma deve ser a essência de seu trabalho: os fatos. O jornalista não deve abrir mão da investigação, da pesquisa, das muitas versões, das fontes. Antes, deve mergulhar em seu projeto, trabalhar com afinco na construção de um texto coerente que contribua positivamente para levar a melhor informação ao seu público, e a reportagem inspira tudo isso.
O conteúdo das mensagens não surpreendeu (Figura 2), tendo como essência as calamidades públicas diante de desastres, deslizamentos, perda de patrimônio, disseminação de doenças e mortes por soterramentos, afogamentos e outros acidentes. As mensagens ligadas à economia, que prevaleceram em segundo lugar caracterizaram-se por prejuízos não apenas às lavouras, como a relação com o próprio comércio local.

Fig. 2. Conteúdo das Mensagens (1980-2006).

Nas matérias houve um predomínio pela realidade local na análise individual de cada período, principalmente considerando como local tanto os textos sobre a cidade de Teresina quanto os que retrataram o Piauí. Considerando, ainda, apenas os textos sobre a capital têm-se um índice de 49% do total das matérias analisadas, o que reforça essa proposição. Na abordagem do cenário teresinense destacam-se as matérias sobre calamidade pública, protagonizadas por determinados pontos da cidade. Baseado na classificação de zonas adotada pela SEMPLAN (Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação) tem-se a Zona Norte da cidade com maior ênfase na abordagem das matérias do jornal quanto aos transtornos causados pelas chuvas, em seguida as zonas Leste, Sul, Centro e Sudeste da cidade.

A Zona Norte da cidade é, portanto, desde os anos 80 caracterizada como a mais afetada pelas chuvas e enchentes, cujos bairros mais citados foram o Poti Velho e o Mocambinho, além dos bairros Primavera, Mafrense, Nova Brasília e Alvorada. Sabe-se que na zona norte, no bairro Poti Velho existe uma grande concentração de argila, que propicia a confecção de tijolos artesanais, peças decorativas e rústicas, como também artefatos úteis como filtros e potes para reservar água potável. O Pólo Cerâmico é, portanto, um dos setores econômicos da capital do qual depende grande parte das populações do norte de Teresina. (SEMPLAN)

Na área do Poti Velho (Foto 12) a atividade dos oleiros possui registros todos os anos, devido à inviabilidade da produção proveniente das inundações o que acarreta pauta garantida ao jornal como foi possível constatar. Além disso, essa questão também ganha as pautas do jornal devido as ações do governo para sanar o problema. Dos casos retratados ressaltam-se ainda algumas das principais avenidas da cidade, que sofreram inundações e transtornos no seu tráfego como a Avenida Miguel Rosa, José dos Santos e Silva, Maranhão e Centenário. Por outro lado, além dos bairros já citados tem-se ainda a forte ênfase às vilas e favelas da cidade, como a Vila Paraíso, Vila da Paz, São Francisco, Firmino Filho e Irmã Dulce.

Fig. 3. Matéria de 20 de fevereiro de 1992.

Outro aspecto observado foi a ilustração das matérias. A fotografia é um elemento indispensável ao texto jornalístico sendo um recurso de grande riqueza quando bem trabalhada. Notou-se nesse quesito que a fotografia no que tange ao material estudado (C1) apresentou um crescimento gradativo dentro dessas matérias, com 31%, 64% e 65%, respectivamente em 80, 90 e nos anos de 2000 a 2006.

Tratando da questão de imagens é interessante citar Campos (2006), ele estudou a veiculação jornalística das informações de conteúdo ambiental a partir do fotojornalismo tendo como base o Folha de São Paulo, considerado o maior jornal do país. Quando considera o papel da imagem dentro do jornalismo ambiental, o autor defende que “não se pode prescindir da imagem, enquanto documento, neste tipo de jornalismo científico porque a imagem, juntamente com a boa apuração, será a grande aliada do texto persuasivo”.

O trabalho questiona se o tema tem sido trabalhado de acordo com sua relevância e se as notícias representadas contribuem para evolução no comportamento da sociedade diante do meio em que vivem. O autor mostrou que nem sempre o jornal utilizou a imagem nas notícias ambientais e quando o fez, foi unicamente com o caráter ilustrativo acarretando prejuízos a função educativa da informação. Portanto, o aumento da valorização da fotografia dentro das matérias ambientais é de extrema importância para a preservação dessa função educativa, inclusive, citada pelo autor.

51% das matérias na categoria C1 apresentaram ilustração, sendo que a mesma incluí fotos, gráficos, desenhos e demais formas de ilustração, cujas quantidades por matéria variam de acordo com o gráfico a seguir:

Fig. 4. Quantidade de Fotografias (1980-2006).

Nesse sentido, é válido citar Bonfiglioli (2006, p. 77 e 78) quando defende que narrativas ambientais, em que a noção de tragédia é transmitida pela evidência de significantes identificados genericamente como dor, sofrimento, perda, são mais facilmente significadas e dão a sensação de que o entendimento da imagem é imediato, como se o observador estivesse vivenciando o fato. (Figuras 5 e 6).

Fig. 5. Matéria de 24 de janeiro de 2004.

Fig. 6. Matéria de 10 de março de 1987.

5. Considerações finais

Paralelo ao ciclo natural das chuvas diagnosticou-se aqui um ciclo crítico social que pode ser divido em três etapas: Período Pré-chuvoso, Período Chuvoso e Pós-chuvoso. O período Pré-chuvoso ocorre basicamente no início do ano, quando o auge das matérias é a economia e a política, o governo exaltando planos de investimentos ao lado de agricultores ansiosos. Durante o Período Chuvoso, o destaque são as áreas de risco, acidentes e deslizamentos de encostas, infra-estrutura comprometida e safras prejudicadas.

Uma pauta certa, nesse período é a situação dos oleiros do Bairro Poty Velho, que anualmente necessitam de apoio devido a impossibilidade de produzir durante as chuvas. Por fim, o período Pós-chuvoso é certamente o mais longo, caracteriza-se pelos milhares de desabrigados sem alternativa, movimentações da sociedade civil em solidariedade e planos emergenciais do governo. Nesta última fase, a saúde pública ganha também maior enfoque na mídia, uma vez que as águas cessam e as doenças trazidas por elas começam a se manifestar, causando superlotamentos nos hospitais e maior demanda de medicamentos.

Esse ciclo se repete ao longo dos 26 anos pesquisados, de forma quase homogênea, e torna-se preocupante pois é bem nítido que os problemas ocasionados são sempre os mesmos e as áreas afetadas também. Através da cobertura jornalística nota-se que as alternativas públicas encontradas são sempre imediatistas agindo apenas quando o problema já está instalado. Projetos rápidos que cessam junto com as águas e não modificam a situação nem em caráter social, tampouco ambiental, pois uma vez que as áreas afetadas são sempre as mesmas haverá com o passar dos anos, maior desgaste físico dessas áreas.

Quanto a cobertura jornalística propriamente dita, percebe-se que abordagem é geralmente superficial a medida que se detém a expor dados e não foi identificada nenhuma abordagem que envolvesse o caráter ambiental do problema. Ou seja, o leitor não pôde associar em momento algum (nas 1145 matérias) que a situação vivida diante dos fenômenos pluviométricos, antes de qualquer coisa, é uma questão sócio-ambiental. Assim também, vale ressaltar que de acordo com as conseqüências ocasionadas pelas chuvas é que as matérias se posicionam, deixando a temática para traz assim que o período mais quente se aproxima.

Diante dos aspectos levantados pela análise, concluímos que para encarar a nova conjuntura ambiental que já se reflete por meio de catástrofes nas várias regiões do globo, o jornalista precisa estar bem mais preparado. A pauta “ambiental” precisa ser mais respeitada ainda dentro das redações. Fica a sugestão, não apenas para o jornal analisado, mas para qualquer empresa jornalística, a possível implantação de um PGA (Programa de Gestão Ambiental), cuja função básica é gerenciar as atividades da empresa balizando-as nos fins sustentáveis. O ponto estratégico no PGA é a própria educação ambiental, que visa a mudança de comportamento dos profissionais da empresa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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___________Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global. Conferência da Sociedade Civil na RIO 92. Rio de Janeiro, de 3 a 14 de junho de 1992. Disponível em: http://www.ufpa.br/npadc/gpeea/DocsEA/TratadoEA.pdf.

*Jhussyenna Reis de Oliveira é tecnóloga em Gestão Ambiental pelo Instituto Federal de Ciência, Educação e Tecnologia do Piauí (IFPI) e graduanda do curso de Comunicação Social da Universidade Estadual do Piauí (UESPI). Marcos Antônio de C. M. Teixeira é mestre em Geografia e professor do IFPI.

 

 







Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro | ISSN 1806-2776 | Edição 14 | Novembro | 2011
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