Novembro de 2011
Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ISSN 1806-2776
 
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MONOGRAFIAS

A adoção das tecnologias digitais
no jornal Tribuna do Norte

Por Kênia Beatriz Ferreira Maia e Luciane Fassarella Agnez*

RESUMO

A introdução de novas tecnologias no jornalismo produz modificações no fazer jornalístico.

Reprodução


Essas mudanças podem incidir no ambiente e nas formas de lidar com a rotina, refletindo não somente nos processos de produção, mas também nos de distribuição e consumo da informação.

As mutações pelas quais o jornalismo tem passado neste início do século XXI são reflexos dos questionamentos sobre seu papel social, necessidade de revisão de modelos de negócios e também indefinições diante das possibilidades trazidas pelas novas tecnologias da comunicação.

A proposta deste texto [1] é rever processos da rotina jornalística mediante a adoção de ferramentas multimídia e experiências de convergência entre plataformas impressa e online, com o auxílio de um estudo de caso da Tribuna do Norte, diário de maior circulação no Rio Grande do Norte.

PALAVRAS-CHAVE: Rotina Jornalística / Tecnologias Digitais / Jornalismo Impresso

1. Introdução

A partir do século XIX, quando o jornalismo saiu da produção artesanal e passou a se organizar em empresas, a informação assumiu paulatinamente a posição de um produto comercializável e a atividade jornalística foi aos poucos se profissionalizando, buscou-se de forma constante o emprego de novas técnicas e tecnologias capazes de aumentar a rentabilidade e a competitividade.  Na história recente, a informatização, que se tornou um processo crescente em todas as atividades industriais e oferta de serviços ocupou um lugar central no que se refere a mudanças no jornalismo. Nas redações, ela tomou impulso nos anos 1980.

Com a entrada dos microcomputadores, a informatização chegou aos escritórios, à administração e ao gerenciamento de dados. As redações jornalísticas, na quais se ecoavam os estalos das máquinas de datilografar, são invadidas pelo dedilhar silencioso dos teclados. Surgem então novos processos de edição de texto e imagem, de diagramação e impressão. Doravante, textos, imagens, áudios e vídeos são digitalizáveis, transformados num código binário universal. “Uma das grandes mudanças, talvez a mais importante desde a Antiguidade, que afeta do interior às técnicas de comunicação, é o crescimento do paradigma digital” (BRETON; PROULX, 2006, p. 99).

A primeira grande transformação ocasionada pela informatização se deu nos processos de produção jornalística. Com o desenvolvimento da internet comercial, na década de 1990, estende-se para a distribuição e o consumo dos produtos jornalísticos. Neveu (2006) mostra que a atividade jornalística foi afetada diretamente pelas tecnologias mais recentes, que encurtaram a distância entre os acontecimentos e seu relato jornalístico.

Também trouxeram os espaços pré-formatados e o desenvolvimento exponencial de produtores de informação. “O volume de informações tornadas tecnicamente disponíveis pela internet introduz também um fantástico desafio para o jornalista” (NEVEU, 2006, p. 166), já que, com a descentralização da web, cada indivíduo se torna um potencial produtor de conteúdo e o acesso a fontes de informação se amplia enormemente. Uma das consequências foi a dissolução do quase monopólio da mediação entre “mundo” e “acontecimentos” que os meios de comunicação detinham. Ao mesmo tempo em que as evoluções tecnológicas deixaram o jornalismo ainda mais próximo dos acontecimentos, permitindo diagramações e imagens mais atraentes e mais interação entre a mídia e o público, também impuseram novos desafios aos jornalistas e à mídia de informação.

Na relação entre comunicação e tecnologias, Marcondes Filho (2009) afirma que as novas tecnologias incidem de duas formas: virtualizam o trabalho e interferem nos conteúdos. A redação, acostumada com a materialidade do papel, do “objeto jornal”, passa a encarar a volatilidade das redes de computadores, o que, segundo o autor, tanto sobrecarrega o profissional de imprensa quanto o reduz cada vez mais “a si mesmo”.

Soma-se ainda o ritmo acelerado de produção, mudanças nas relações de trabalho e o aparecimento de novos desafios éticos. Já em relação aos conteúdos, o autor aponta que se sobressaem as novas linguagens e a depreciação de outras, como a supervalorização da imagem, inicialmente concebida pela televisão. “A técnica viabiliza uma melhor montagem cênica de notícias e acontecimentos, com efeitos como se fossem reais” (MARCONDES FILHO, 2009, p. 37).

Em resumo, a internet rapidamente se transformou em mídia, cedendo espaço para o surgimento de um novo formato noticioso, o webjornalismo. Nos seus primórdios, a internet tornou-se uma eficaz ferramenta para a produção de conteúdo jornalístico e logo passou a organizar e a estruturar todas as etapas: apuração, composição, edição e circulação.

Além disso, a efervescência das tecnologias da informação e da comunicação provoca na sociedade o surgimento de um fluxo caótico e descentralizado de informações, de manifestações individualizadas dos sujeitos, com crescimento das micronarrativas (em oposição à falência das grandes narrativas), confluência entre o público e o privado e a virtualização das relações. No campo do jornalismo, esses aspectos incidem tanto na forma, como no conteúdo, além de sua própria compreensão enquanto profissão e função social.

2. As fases do jornalismo na internet 

Assim que o jornalismo se fez presente na internet, diversos autores se concentraram em distinguir as etapas ou os modelos que a atividade vem adotando no uso das tecnologias digitais. Canavilha, de forma sintetizada, propõe apenas duas etapas: jornalismo online e webjornalismo/ciberjornalismo.

No primeiro caso, as publicações mantêm as características essenciais dos meios que lhes deram origem. No caso dos jornais, as versões online acrescentam a actualização constante, o hipertexto para ligações a notícias relacionadas e a possibilidade de comentar as notícias. No caso das rádios, a emissão está disponível online, são acrescentadas algumas notícias escritas e disponibilizam-se a programação e os contactos. As televisões têm também informação escrita, à qual são acrescentadas notícias em vídeo, a programação do canal e os contactos. Como se pode verificar, trata-se de uma simples transposição do modelo existente no seu ambiente tradicional para um novo suporte. Na fase a que chamamos webjornalismo/ciberjornalismo, as notícias passam a ser produzidas com recurso a uma linguagem constituída por palavras, sons, vídeos, infográficas e hiperligações, tudo combinado para que o utilizador possa escolher o seu próprio percurso de leitura (CANAVILHA, 2006, p. 2).

Para Barbosa (2002), haveria ainda um terceiro estágio, de transição. O primeiro é o “transpositivo”, no qual há uma transposição do texto publicado na edição impressa para a internet; em seguida, vem o “perceptivo”, no qual já ocorreria uma maior percepção dos veículos em relação aos recursos possibilitados pelas tecnologias, apesar de ainda haver características de transposição, mas potencializando os conteúdos publicados na web; e por fim, o “hipermidiático”, caracterizado pelo uso intensificado dos hipertextos, convergindo diferentes plataformas e formatos da notícia.

Esse terceiro estágio das mídias digitais seria denominado mais tarde pela autora como “jornalismo digital de terceira geração”, considerado mais abrangente ao englobar “os produtos jornalísticos na web, bem como os recursos e tecnologias disponíveis para a disseminação dos conteúdos para dispositivos móveis, como celulares, iPods, MP3, smarthphones, entre outros” (BARBOSA, 2007). As etapas não correspondem necessariamente a fases históricas e sucessivas, uma vez que se verifica atualmente a coexistência dos três modelos.

As duas últimas etapas exigem dos profissionais uma maior familiaridade com a tecnologia e o desenvolvimento não só de novas habilidades, mas também de novas concepções acerca do produto jornalístico. Já em 2004, Ferrari alertava que um jornalista teria de “escrever notícias para vários formatos de distribuição: internet via cabo, internet móvel (para os atuais celulares WAP), televisão interativa e outros que irão surgir nos próximos anos” (FERRARI, 2004, p. 40). Doravante, o relato jornalístico pode ser concebido em diferentes linguagens e formatos; mistura-se e alterna-se textos, imagens, vídeos, ilustrações gráficas ou simplesmente elabora-se materiais com números reduzidos de caracteres para microblogs, como o Twitter, ou, cria-se versão simplificadas para celular (WAP).

A convergência entre a hipertextualidade e a multimídia (reunião de recursos variados, como texto, som e imagem) é o que dá origem às chamadas hipermídias, ainda caracterizadas pela navegação aberta e capacidade de disseminação por suportes e plataformas diversas, graças à digitalização (LEMOS; PALÁCIOS, 2001, p. 132). A possibilidade de linkar blocos de texto, imagens, gráficos, vídeos, entre outros, cria uma maior flexibilidade para o leitor construir seu percurso de leitura do texto jornalístico.

Canavilha sustenta que não faz sentido utilizar o formato da pirâmide invertida na web, mas sim pequenos textos hiperligados, sendo o primeiro com a informação essencial e os demais para que o internauta conduza sua leitura. “A tradicional técnica ‘pirâmide invertida’ dá lugar a uma arquitectura noticiosa mais aberta, com blocos de informação organizados em diferentes modelos, sejam eles lineares ou complexos” (CANAVILHA, 2006, p. 5).

Na segunda metade da década de 1990, período de entrada dos grandes jornais na web, foi adotada a transposição dos conteúdos das versões impressas, com poucos recursos multimídia. Isso se deu porque a chegada das empresas jornalísticas na internet esteve mais relacionada com a pressa em ocupar o espaço digital do que com o desenvolvimento de conteúdos jornalísticos específicos para a web.

Atualmente, a mídia de informação faz estado de uma maior preocupação com a construção das narrativas hipertextuais com conteúdo multimídia. Superou-se a simples transposição de conteúdos das versões impressas para o meio digital, bem como a mistura de linguagens na mesma página, partindo para uma linguagem efetivamente digital. Ferrari enfatiza não só a questão da penetração e maior acesso a internet, como também as atrações que os conteúdos jornalísticos exercem sobre o internauta.

O potencial da nova mídia tornou-se primeiro instrumento essencial para o jornalismo contemporâneo e, por ser tão gigantesco, está começando a moldar produtos editoriais interativos com qualidades atraentes para o usuário: custo zero, grande abrangência de temas e personalização (FERRARI, 2004, p. 38).

Além da diversidade da multimídia, o jornalismo na internet permite uma série de formas de interação com a audiência que antes não era viável para as mídias. O próprio acesso às páginas e hiperlinks já caracteriza uma relação do leitor com o produto jornalístico, cabendo a esse a escolha pela trajetória do relato jornalístico. Mas outras formas de interação também são efetivas: por e-mail, comentários em notícias e reportagens, fórum, chats, sugestões de pautas, correção de informações, entre outros, abrindo opções para uma maior interferência do público no processo noticioso, por meio de tecnologias que facilitam e estimulam a produção e publicação de conteúdo, além da cooperação em rede. Há ainda a criação de um novo espaço: a blogosfera. A aproximação definitiva entre os blogs (ou os diários virtuais) e o jornalismo se deu a partir do11 de setembro, quando o público passa a ter maior acesso a eles na busca por relatos reais.

Carregados de “furos”, opiniões e um tom mais informal, os blogs passaram a frequentar, diariamente, o espaço nobre das principais páginas eletrônicas da rede. Também não são raros os casos em que esses “diários pessoais” acabam pautando, inclusive, o jornal do dia seguinte, por vezes citado como fonte de alguma “bomba” publicada pelas principais revistas impressas no fim de semana (BORGES, 2007, p. 46).

A mobilidade é outro fator que tem sido considerado nas diferentes fases de produção jornalística. Com a difusão das telecomunicações móveis (via netbooks, celulares ou qualquer outro dispositivo), associa-se os benefícios da técnica audiovisual e textual, com a capacidade interativa e de real conectividade entre os indivíduos, para se testar novas formas de construir o relato jornalístico. Estão hoje à disposição, na palma da mão, ferramentas de edição de texto, produção de imagens, áudio, navegação na web e acesso a banco de dados.

Estas ferramentas introduzidas na rotina de um jornalista multimídia ou jornalista móvel vai desencadear numa produção multiplataforma exigindo um profissional multitarefa com habilidade de lidar com diversas tecnologias digitais dentro de um fluxo de produção mais aberto e dinâmico que, por sua vez, forçará o profissional a responder com mais agilidade ao processo de distribuição de conteúdos ainda durante a etapa de apuração e produção como transmissão ao vivo para a web ou para um canal de TV via celular 3G, envio de parciais da produção em forma de flashes textuais, imagéticos ou de vídeos entre outras condições impostas. É uma mudança de fluxo e de rotina (SILVA, 2009, p. 8).

Entretanto, não se pode afirmar que foi somente a internet que ocasionou todas as mutações no jornalismo. As mudanças no universo jornalístico sempre foram uma constante. Os meios de comunicação, assim como seus profissionais, caminham lado a lado com as atualizações técnicas e tecnológicas que reconfiguram suas funções e atividades. Foi assim desde a introdução da imprensa, passando pela introdução das imagens estáticas, depois em movimento, até o advento dos broadcasts, de comunicação eletrônica e aberta (rádio e televisão), o que culminou com toda a conjuntura descrita com a disseminação das TICs, em tempos de nova economia e transformações sociais.

3. O caso Tribuna do Norte

Que a internet mudou o jornalismo não resta dúvida. Nesse trabalho, nos propomos a detalhar como se deu a adoção das tecnologias digitais em um jornal de médio porte. O foco da nossa observação é das rotinas de trabalhos dos jornalistas. Para tanto, analisamos a Tribuna do Norte (TN), jornal diário de maior circulação do Rio Grande do Norte. O periódico, que completou 60 anos em maio de 2010, registra uma circulação média de 7,8 mil unidades, um volume 160% maior que o do segundo colocado. [2]

A versão online do jornal também lidera entre os usuários de internet do Rio Grande do Norte; o TN Online alcança uma média de 70 mil acessos únicos diários. O levantamento foi realizado por meio de observação participante, no período de 19 a 26 de maio de 2010, complementada por entrevistas em profundidade com seis profissionais da direção e secretaria de redação, editoria de cidades e edição e reportagem do portal do veículo na internet.

A redação, que hoje conta com aproximadamente 40 profissionais, iniciou o processo de informatização da redação em 1995. No ano seguinte o jornal lançou um novo projeto gráfico, totalmente digitalizado, abrangendo todas as fases de produção do jornal. O portal do veículo na internet (www.tribunadonorte.com.br) estreou em janeiro de 1999, acompanhando o boom da transposição dos jornais brasileiros para o meio digital.

A Tribuna do Norte repetiu a estratégia de ocupar, marcar presença no novo espaço em ascensão e o fez com pouca ou nenhuma exploração das possibilidades multimídia e de interatividade da internet. Foi somente depois de seis anos, em 2005, que o jornal montou uma equipe para dar suporte ao site e alimentá-lo, o que será feito principalmente com a transposição de conteúdos de sites, de agência de notícias e de releases, fazendo “empacotamento” de notícias (FERRARI, 2004).   A redação da TN e a equipe do TN Online coexistiam isoladamente, uma vez que os jornalistas do impresso não produziam material jornalístico para o site, apesar de trabalhar no mesmo espaço físico.

A grande mudança veio em julho de 2009, quando o portal TN Online passou por uma reformulação que atingiu a arquitetura do jornal, com modificação do layout e a inclusão de ferramentas voltadas para uma maior interação com o internauta. Mas, principalmente foram introduzidas modificações no processo produtivo e na rotina diária do jornal impresso. Em uma reunião, a direção do veículo apresentou aos profissionais da redação a reconfiguração do site e as mudanças que iriam ser aplicadas no contrato de trabalho da equipe redacional do jornal.

Todos os profissionais que trabalhavam na redação da TN, incluindo chefes e secretários de redação, editores, repórteres e fotógrafos, passaram a incluir em suas atividades a produção de conteúdos para o portal na internet. O site continuou a ter uma equipe exclusiva, que atualmente é composta por cinco profissionais – um editor, um repórter e um estagiário por turno (manhã, tarde e noite). Entretanto, cabe a redação do impresso abastecer “minuto a minuto” o TN Online com material que está em produção para chegar às bancas no dia seguinte.

3.1. O jornal digital

O conteúdo do site é totalmente gratuito. O internauta tem três formatos de informações disponíveis no site. Primeiramente, as notícias e reportagens online, postadas ao longo do dia. Vai para o site o texto integral ou versão reduzida do que sairá no jornal do dia seguinte. Serão descartados do jornal impresso os assuntos extremamente pontuais que estarão completamente desatualizados no dia seguinte, como uma dificuldade no trânsito. Assim, o conteúdo jornalístico que é colocado no site vai formando a edição impressa do dia seguinte.

À meia-noite, a íntegra da versão impressa é colocada no ar. Com isso, em muitos casos, repete-se, sem nenhuma modificação, um conteúdo que já tinha sido publicado na véspera. E ainda tem a versão flip, lançada em 2010, cujo acesso é restrito aos internautas cadastrados. Diferentemente de outros jornais, a TN ainda não dispõe de uma versão WAP (formato para ser acessado diretamente do celular). Mas o jornal tem projetos para lançar a versão WAP. Para tanto, está fazendo teste, sem ainda ter previsões de datas para o seu lançamento.

Ao fornecer ao público três formatos de informação, o site antecipa e constantemente “fura” o jornal impresso. Além disso, é desnecessário comprar a Tribuna do Norte, uma vez que pode-se ter acesso gratuito ao seu conteúdo pela internet. Seja nas notícias publicadas na página da internet, seja no formato flip, todo o material jornalístico está disponível no portal.

3.2. Novos espaços de jornalistas: multimídia, blogs e Twitter

É na seção “Multimídia” do TN Online que são postados os conteúdos produzidos pela redação do jornal que são veiculados exclusivamente no site. A seção inclui atualmente as fotos das reportagens, vídeos realizados diariamente na própria redação sobre esportes e política, gravados num estúdio improvisado, com câmera e edição digitais; e podcasts gravados com a ajuda da Rádio Globo, empresa do mesmo grupo, que oferece o recurso especialmente com análises esportivas e transmissões de jogos de futebol.

A Tribuna do Norte foi o primeiro veículo do estado a estrear no Twitter no início de 2009, registrando até o dia 19 de junho de 2010 mais de 5,6 mil seguidores. Um mês após, o microblog do jornal já contava com 6,2 assinantes, enquanto que segue sete pessoas, todos jornalistas ou colunistas do jornal. Os tweets são gerados automaticamente pelo sistema de postagem de matérias no site. No Twitter, são postados os títulos de cada conteúdo jornalístico que sai no site, sem nenhuma modificação e o link para acessá-los. Na medida em que o site é atualizado, um post é colocado automaticamente no Twitter.

Até maio de 2010, a redação não havia produzido nenhum tipo de conteúdo exclusivo para o microblog, segundo depoimentos da redação.

Além do Twitter, outra ferramenta digital utilizada pela Tribuna do Norte são os blogs. No TN Online há atualmente 17 blogs vinculados, de jornalistas da própria versão impressa, colunistas ou comentaristas da Rádio Globo. Ao longo do dia, os blogs também são atualizados.

3.3. Rotina de trabalho

Em relação à rotina jornalística diária, após a introdução da produção para a web, todos os profissionais entrevistados concordam que a maior dificuldade em se desenvolver um projeto de jornalismo multimídia está na cultura profissional e na resistência dos próprios jornalistas. Mesmo dos mais jovens. São duas as perspectivas: uma em relação às condições de trabalho, alguns julgam que ter que produzir para o impresso e o online é uma forma de trabalhar duas vezes, mesmo que isso tenha partido de uma revisão contratual.

O segundo aspecto se refere ao desconhecimento do potencial da tecnologia. Apesar de ter equipamentos digitais à mão (como netbooks ou smartphones para as reportagens de campo), a dinâmica produtiva do material jornalística ainda segue a lógica do jornal impresso. A maneira segundo a qual esses profissionais organizam o texto jornalístico (não importa a idade ou cargo) ainda obedece à lógica das redações de jornais impressos.

Elabora-se uma pauta vislumbrando o espaço a ser ocupado na primeira página ou na editoria correspondente. A agilidade de produção corresponde ao ritmo diário. Quanto à forma textual, que em sua totalidade no caso dos dados coletados na Tribuna do Norte, ainda segue o formato da pirâmide invertida, com pouquíssimo recurso de hipertextualidade, sem projetos gráficos desenvolvidos para o ambiente web (mais que layout, referimos às possibilidades de animação e recursos mais sofisticados de exibição de fatos ou narração) ou conexão com os vídeos e podcasts que são produzidos para a seção “Multimídia”.

Além disso, a redação demonstra uma rejeição, consciente ou não, de atualizar o site do jornal. Entre os episódios relatos pelos jornalistas ou observados na redação, há o editor que na correria diária “esquece” que tem um portal para abastecer ou o repórter que não gosta de passar flashs da rua, pelo telefone, e ainda prefere retornar à redação para redigir sua matéria, pela comodidade.

Houve um caso, por exemplo, que uma repórter saiu para cobrir um evento equipada pela chefia de reportagem com um netbook, pela necessidade de agilidade, em noticiar ainda no mesmo dia, antes da concorrência pelo site. Contudo, a repórter retornou do evento sem a matéria estar escrita, e alegou para isso o desconforto em redigir dentro do carro ou no saguão do local do evento, preferindo voltar para a redação para “trabalhar melhor o texto”.

Outro exemplo remete aos vídeos e podcasts, alguns repórteres elencar vários motivos não produzi-los: vergonha de aparecer na tela ou expor sua voz ou ainda tomar mais tempo do entrevistado. Parece simples, a solução (se há) ainda é bastante complexa. Todos os entrevistados concordam que no mundo contemporâneo um profissional de imprensa precisa ser multimídia, a questão é que ninguém, desde a chefia aos repórteres, sabem como desenvolver.

3.4. Lógico do furo

Foi verificado que na redação da Tribuna do Norte ainda não há uma preocupação com a rentabilidade da internet ou com o fato do portal “furar” o próprio meio impresso.  Dois fatores podem ser apontados para justificar essa posição: o primeiro é que a TN há poucos anos tomou a liderança do Diário de Natal como o jornal de maior circulação. Apesar de há dez anos, segundo o IVC, a média diária da TN ser de 10 mil exemplares, e ter caído para algo em torno de sete mil, ela tem mais que o dobro de leitores do que o segundo colocado.

Isso se reflete diretamente na publicidade local, o que ainda garante a rentabilidade tanto do meio impresso quanto do digital. O outro fator é a penetração do acesso à internet no total da população do estado do Rio Grande do Norte. Apesar de não haver números precisos em relação a isso, o fato é que uma grande parcela ainda não está conectada à internet. Isso parece dar uma certa tranquilidade ou servir de argumento para os profissionais que ainda se dedicam ao papel como se não houvesse a plataforma digital.

Na opinião do jornalista Carlos Peixoto, [3] diretor de redação que atua na Tribuna do Norte desde 1984, o desafio está justamente num modelo de negócio que integre os dois formatos jornalísticos e não somente dispute audiência e anunciantes:

Não acredito que a internet tenha tirado leitores do jornal impresso, não vejo nesse sentido. Não acredito em antropofagia entre os canais nem que a novidade da internet seja fator determinante de queda nas vendas do jornal impresso. Claro que todo novo meio ou plataforma gera algum tipo de impacto. O que compromete a leitura dos jornais é a qualidade do jornalismo que é feito. Existe um potencial enorme para que o jornalismo se reinventar diante das novas tecnologias. O grande desafio do jornal impresso é como dividir o mercado com a internet, não competir, mas se complementar.

Apesar de não ser realizada há quase dez anos qualquer pesquisa de opinião juntos aos leitores do jornal, sobretudo na capital, não é difícil de imaginar que boa parte dos leitores que assinam ou compram as edições impressas possuem algum tipo de acesso à internet.

Todos os entrevistados também afirmam que ainda não há por parte da direção de veículo uma cobrança em relação ao número de acessos (mesmo porque, como já vimos, a Tribuna do Norte Online lidera na região), mas sim em relação às atualizações.

Observamos isso por meio de um comunicado interno, de 6 de maio de 2010, exposto no mural da redação, que se referia à produção e à ordem hierárquica da redação. Entre outros pontos, o item quatro dizia ser “quase generalizado descompromisso com a obrigatoriedade contratual de produzir textos/flashs e fotos/imagens para a Tribuna do Norte Online”, cobrando aos profissionais a atividade que foi incluída formalmente em sua rotina diária desde julho de 2009.

Entretanto, nos depoimentos dos membros da redação, constata-se uma diferenciação entre o que deveria ser o conteúdo da versão impressa e da versão digital em relação ao tamanho do texto e à sua profundidade. A visão generalizada é que a notícia do meio online deve ser curta, superficial, enquanto o jornal impresso seria o espaço para a análise.

Alguns jornalistas, tanto da direção, editores e secretaria de redação afirmaram que esse objetivo ainda não é alcançado. Para se justificar, muitos repórteres alegam falta de tempo, que impediria uma reportagem mais analítica, no sentido de envolver fontes diversas e inserir a reflexão e contexto do tema. Ressalta-se, neste ponto, apenas de forma complementar, que não foi observado nenhum repórter ter que trabalhar mais do que duas pautas por dia.                        
           
4. Considerações finais

Quando estruturaram as fases do jornalismo na internet (BARBOSA, 2002; CANAVILHA, 2006), os autores levaram em consideração os produtos jornalísticos que partiram dos meios tradicionais para a web, a partir da transposição de conteúdos. Na observação para esse trabalho, a terceira fase (hipermidiática) ainda está em fase de projeto, no campo das ideias, mas com dificuldade de implantação pela rotina jornalística.

Na Tribuna do Norte, identificamos, inclusive, um movimento contrário, uma espécie de “transposição invertida”. Com o abastecimento “minuto a minuto” do site pela mesma equipe do impresso, os conteúdos jornalísticos estão na maioria das vezes sendo publicados primeiramente no site e depois reproduzidos, alguns com pequenos ajustes, na versão impressa.

Isso decorre da falta de um projeto claro para o formato web, com a compreensão de suas potencialidades e preparo técnico e profissional para a produção de conteúdos na linguagem multimídia, melhor explorando os diferenciais da nova mídia, como a interatividade, hipertextualidade e memória, entre outros. A resistência dos jornalistas, mesmo dos mais jovens, evidencia que o processo de integração das plataformas online e offline deve abranger mais do que a convergência tecnológica, mas uma formação voltada para isso e condições de trabalho adequadas.

A noção generalizada dos jornalistas da redação é de que, para a internet, o texto deve ser superficial, curto e direto, cabendo ao jornal impresso se diferenciar por levar ao leitor conteúdos mais analíticos e abrangentes. Contudo, no cotidiano da redação, os jornalistas não conseguem produzir duas versões distintas, a primeira em um formato que otimize o ambiente digital e a segunda que contemple o projeto editorial do jornal impresso.

Isso reflete o fato dos profissionais e das empresas não terem compreendido que é necessário rever as finalidades e a função social do jornalismo, principalmente do impresso. Ainda não introjetaram que as mutações ocorridas nas últimas décadas, em virtude da introdução das tecnologias da informação e da comunicação, abalaram a atividade e impuseram novos desafios e lógicas.

Por parte das empresas, o modelo de negócio é outro fator de questionamento a partir do surgimento do webjornalismo. No caso da Tribuna do Norte, no entanto, isso não parece ser uma prioridade. A oferta do mesmo conteúdo gratuito por três formas diferentes na web, além do impresso, não é motivo de preocupação, uma vez que o veículo tem uma sólida ocupação no mercado publicitário do Estado.

Além disso, especialmente no Nordeste, os meios de comunicação ainda se detêm no argumento do baixo número de acessos à internet, o que garantiria temporariamente a manutenção do modelo atual de jornalismo impresso. Mas há dois fatores a serem observados: o crescimento acelerado da penetração das tecnologias da comunicação na sociedade e o perfil dos leitores.

A empresa de estatística comScore divulgou em junho de 2010 um mapeamento dos usuários de internet. [4] Segundo os dados de maio, a empresa afirma que o Brasil tem cerca de 40,7 milhões de usuários de internet, sendo que cerca de 67% desses usuários estão na região Sudeste. Ainda, pela pesquisa, a região brasileira com o menor número de usuários é o Norte, com apenas 2% de usuários únicos. O Sul e o Nordeste são a segunda e terceira região com o maior número de usuários, com 14,2% e 10,7%, respectivamente. A região Centro-Oeste aparece com 6,1% de pessoas com acesso à internet.

Mas não basta ter o acesso, a qualidade da conexão, além de questões culturais refletem no modelo jornalístico na internet. A sofisticação dos recursos adotados pelos portais e serviços online depende de conexões estáveis e em alta velocidade. De acordo com o estudo Brazil Quarterly Fixed & Mobile Broadband Database, realizado pela IDC Brasil, a internet banda larga no Brasil em 2009 ultrapassou os 15 milhões de acessos, número que aponta um crescimento de aproximadamente 27% em relação ao ano anterior.

O destaque foi a banda larga móvel, que expandiu 82% no período. No Nordeste, o número de acessos alcançou 1,3 milhão. A conexão a partir de residências também teve um desempenho expressivo, com um incremento de 46%. Se o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) do Governo Federal alcançar suas metas, até 2014 o país terá mais de 40 milhões de domicílios com acesso à internet de alta velocidade.

A outra variável a se considerar é de que os leitores de jornal impresso coincidem em sua maioria com a parcela da população que tem acesso a internet. “No Brasil, os jornais eletrônicos já começaram competindo entre si pelo mesmo nicho de mercado – as pequenas classes média e alta. Pior, esse nicho de mercado tem sido, historicamente, o mesmo que pode comprar e ler os jornais impressos” (JOHNSON, 2006).

Nesse perfil dos leitores, complementa-se o fato da possível não renovação do leitorado. Ou seja, estudos mostram que os jovens de até 30 anos têm na internet a principal fonte de informação, mesmo no contexto brasileiro. Assim, nenhum dos modelos em vigor garante a perenidade do atual jornalismo impresso.

NOTAS

[1] Esse trabalho foi apresentado no 8° Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, realizado pela SBPJor, de 8 a 10 de novembro, em São Luís (MA).

[2] Dados do Instituto Verificador de Circulação (IVC) referentes a março de 2010.

[3] Entrevista concedida à Luciane Fassarella Agnez em 19 de maio de 2010.

[4] Disponível em: http://www.comscore.com. Acesso em: 22 jul. 2010.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NEVEU, Érik. Sociologia do jornalismo. São Paulo: Loyola, 2006.

SILVA, Fernando Firmino da. Mobilidade convergente: Abordagem sobre a prática e os estudos do jornalismo móvel. In: Revista Icone, v. 11, n. 2, dezembro de 2009.

*Kênia Beatriz Ferreira Maia é professora do Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Luciane Fassarella Agnez é doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade de Brasília.

 

 







Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro | ISSN 1806-2776 | Edição 14 | Novembro | 2011
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