O presente artigo objetiva analisar a produção dramatúrgica de Chico Buarque, a fim
de identificar a possível existência de uma linha de trabalho entre as quatro peças por ele escritas.
Partindo do pressuposto de que o projeto de um dramaturgo se expressa na composição do
roteiro teatral e não necessariamente nas encenações que nele se baseiam, tomou-se como fontes
principais os quatro roteiros teatrais escritos por Buarque, cuja análise será cotejada por
elementos a eles externos, sempre que se faça necessário. A partir desta análise, intenta-se
contribuir para o adensamento dos estudos historiográficos do teatro, bem como para uma
abordagem da obra buarqueana a partir de uma ótica ainda pouco explorada por historiadores: a
sua escrita dramatúrgica.
Este trabalho analisa quatro peças brasileiras dos anos 1970: Um grito parado no ar (Gianfrancesco Guarnieri, 1973), Rasga coração (Oduvaldo Vianna Filho, 1974), Gota dágua (Chico Buarque e Paulo Pontes, 1975) e O último carro (João das Neves, 19641967-1976). Escritas por diferentes dramaturgos, essas peças são representantes de um projeto de teatro que se constituiu na década de 1970, marcado pelas tentativas de retomada dos palcos brasileiros com uma dramaturgia cujas principais características são a valorização da palavra como eixo estruturante das peças, o investimento na busca por uma síntese formal de acordo com a matéria histórica a ser representada e a reafirmação do compromisso com o engajamento. A análise das peças permitiu identificar a forte presença de elementos da cultura política comunista e a proximidade de seu discurso com o projeto político do Partido Comunista Brasileiro (PCB), o que permitiu caracterizá-las como dramaturgia de matriz comunista. As tentativas de retomada dos palcos se deram através de um processo de avaliação da prática teatral no qual os dramaturgos reafirmaram alguns dos pressupostos que haviam tido no horizonte de sua escrita dramatúrgica até então, ao mesmo tempo em que tentaram abandonar outros. Tentando deixar de lado o idealismo com que haviam lido a realidade brasileira e a teleologia revolucionária com que haviam representado os personagens populares, esses dramaturgos não abandonaram a defesa de uma estratégia de resistência ao regime militar através de uma frente ampla pela redemocratização. O frentismo, porém, surge reconfigurado, tendo seu foco deslocado de uma frente policlassista para uma frente entre membros de uma mesma classe social cujas estratégias de ação política divergiam. A busca por uma síntese formal sugere a constituição de uma "frente estética" em que diferentes matrizes teóricas foram conjugadas, evidenciando a importância da pesquisa formal para o teatro engajado. No entanto, apesar dessas características convergentes, as peças não deixam de expressar tensões entre si e expõem os impasses e contradições que marcaram a modernização do Brasil nos anos 1970. Disponível para download em http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-25092018-123701/pt-br.php