neto. Contato feito, convite aceito. O locutor informa que amanhã, ás três da tarde, durante o Programa Vespertino, a rádio transmite “ao vivo” um especial de uma hora de duração sobre saúde da criança. É claro, com o neto da Dona Maria e do Seu José.
O prefeito da cidade chegou nesta manhã na comunidade. Ele veio para vistoriar obras de manutenção do centro comunitário, do posto de saúde, da escola municipal, do asfalto e de saneamento básico. Seu Jerônimo do Bar Central liga para a rádio. O prefeito está ali, tomando cafezinho. A emissora está transmitindo o programa diário de música regional. O locutor é avisado. Programação interrompida, o locutor espera acabar a música e informa sobre a chegada do ilustre visitante. Enquanto o repórter corre para o local, Seu Jerônimo, ainda na linha, dá detalhes sobre o fato. Uma surpresa! O prefeito tem pouco tempo, mas deseja falar, pela rádio, com a comunidade. Ele já está no ar.
O fornecimento de energia está interrompido na Rua 4. Seu Francisco liga para a rádio. Está furioso. Quer falar de qualquer jeito. A emissora está transmitindo o Noticiário Esportivo. O locutor é informado, chama a vinheta do Falador. Seu Francisco já está no ar, enquanto os repórteres internos já estão em contato com a companhia responsável. Após três minutos, o Noticiário Esportivo está de volta. Quinze minutos depois, o locutor avisa que uma equipe de manutenção já está se deslocando para solucionar o problema. Seu Francisco liga, dizendo que a situação foi normalizada, fato retransmitido pelo locutor.
Situações opostas, de várias que podem ocorrer no cotidiano de uma comunidade. Dinâmica proporcionada pela flexibilidade na programação da emissora. Processo marcado pela ruptura da grade, pela democratização do Falador e por utilizar o rádio como meio integrador. O jornalismo atuante, aberto e independente, enfim, que produz o que transmite.
O Ouvidor
As interrupções são coordenadas pela equipe interna de jornalismo, que situa o falante sobre o momento de entrada, sendo o tempo decorrente da situação ou mesmo por critérios estabelecidos pela própria comunidade, que discute o processo de emissão em reuniões com datas pré-estabelecidas. É o momento do Ouvidor, de alertar sobre as dificuldades internas e externas, de quem recebe e de quem emite. Também é aqui que os responsáveis pela emissora debatem o conteúdo jornalístico que está sendo transmitido.
A primeira posição é a de situar a cobertura jornalística. Informar as pessoas sobre o potencial da equipe. Os problemas da comunidade são os da estação de rádio, e os da rádio (entre eles, o radiojornalismo) também são os da comunidade. Colocar que os jornalistas estão prontos para buscar a informação, sendo os próprios moradores importantes fontes, que alimentam o conteúdo jornalístico. Que não é só ficar esperando a notícia pronta, mas também auxiliar na seleção delas. Se precisar, os repórteres buscam as respostas onde elas estão, não importa o local ou meio, seja pelo deslocamento da equipe (quando possível), pelo telefone, internet e demais meios. Caso ninguém ligue, a equipe será a única responsável. Estará fechada no seu próprio universo, sem contato com a comunidade, sem saber o que esta pensa ou vive. O conteúdo ficará limitado. Então, quem poderá reclamar? A participação é compromisso para com os jornalistas da rádio. São vozes amplificadas.
Revela-se a disposição e os limites diante da captação, emissão e transmissão de notícias. Problemas técnicos (equipamentos), estruturais (planejamento e recursos) e de conteúdo (capacitação dos jornalistas), entre tantos outros que desequilibram e prejudicam o fazer jornalístico. A cobrança é pelo possível, diante de quem produz a notícia.
O que desejam ouvir e como querem participar são as principais perguntas à comunidade. Tarefa difícil para os jornalistas ligados à emissora, porque também vão conversar com jornalistas eventuais, que participam e informam. De um lado, a pauta é da e para a comunidade, do que acontece ali, no alcance da emissora. Assuntos que fazem parte do cotidiano das pessoas, que interferem na rotina do grupo. Notícias que fogem da agenda das emissoras comerciais e educativas, ou seja, o outro lado da pauta. Essas serão rediscutidas, conforme o interesse do grupo.
A primeira pergunta interfere direto naquilo que as pessoas estão acostumadas a encontrar nas rádios, televisões, jornais e internet. Situação complicada porque a agenda domina o pensamento sobre o jornalismo, diante da forma e do conteúdo. Se pensar na audiência, então a proposta sobre um radiojornalismo nas emissoras comunitárias estará completamente descartada. Sempre aparecem fórmulas prontas, exemplificadas por quem já teve contato, profissional ou não, com os modelos de outras emissoras. Contribuições bem vindas, que não devem ser descartadas, porque todos estão ali para acrescentar, inclusive colaboradores de fora, que são convidados para auxiliar na busca de um radiojornalismo que se conduz pelo desenvolvimento do que acontece ou interfere no local. São assuntos de interesse da comunidade, desde serviços até fatos de interesses globais. Nada que limite o conhecimento.

 

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