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Resenhas
Diário Popular:
a biografia de um
jornal paulistano

Por Laercio Arruda*

Introdução

"Um jornal se constrói com paciência
e se destrói com um gesto de impaciência".

Reprodução

A frase é citada no livro O Papel do Jornal - Uma Releitura, de Alberto Dines, mostrando que o empenho e a dedicação devem fazer parte do processo jornalístico.

Dines alerta que em jornalismo não existe a permanência, e sim, a persistência. Segundo ele, um visitante despreparado se surpreende ao entrar pela primeira vez, numa redação de jornal. Uma vez que no dia seguinte, irá encontrar nas bancas um jornal organizado, sistematizado e acabado. Ou seja, o visitante não sabe que o jornalismo é a ordenação da novidade, rotinização do inesperado.

Ou seu corolário: a quebra intencional e programada das normas, para despertar a atenção pelo contraste. Dines lembra que o jornalista trabalha com rapidez para completar cada edição, mas aquela edição se completa com as seguintes até o infinito. Esta noção do tempo distendido, intercalada com o tempo sincopado, faz parte do comportamento físico e psíquico do jornalista. A paciência dentro da periodicidade é como o processo de conta-gotas: cada porção é minúscula, mas todas são importantes para atingir a imagem final.

"O jornalista deve assimilar a periodicidade do seu veículo, ou seja, deve incorporar ao seu comportamento a noção temporal fornecida por essa periodicidade. Um veículo mensal oferece um intervalo e, por conseguinte, uma noção temporal radicalmente diversa daquela do jornal. A comunicação através de um sistema de periodicidade rápida, como o jornal, é um processo quase contínuo. Em jornal não se pode dizer que uma edição está fechada, pois enquanto a máquina estiver rodando deve o jornal ser alterado para receber as novas notícias ou os desdobramentos daquelas já compostas. E afinal, quando acabou a tiragem e as máquinas estão sendo limpas, começa a equipe seguinte a dar a suíte, ou continuidade, à edição que já está nas ruas". [1]

E é exatamente diante desse conceito que percebemos o dinamismo de um jornal diário. Ele se move rapidamente, mas sempre apresentando "capítulos" seqüenciais de um fato importante. Essa interligação existente entre as edições proporciona ao veículo uma grande velocidade na divulgação das notícias atendendo prontamente aos anseios do leitor.

Diferentemente do rádio (som) e da televisão (imagem), consideramos que o jornal leva a vantagem da escrita. A notícia impressa torna-se um documento, onde as informações podem e devem ser assimiladas e interpretadas pelos leitores. O rádio e a televisão ganharam no tempo, mas não no conteúdo.

O mesmo fenômeno podemos constatar com o surgimento da Internet, que apresenta uma velocidade na divulgação das notícias, no entanto, com margem muito grande de erros e desvios de informações. "Todo jornal continua amanhã", afirma Dines. E no processo jornalístico um título conduz ao texto, que leva a outro título, que, por sua vez, faz virar a página, e assim por diante, até a edição do dia seguinte. Os veículos impressos têm em sua embalagem todo um aparato de logotipos, estilos de paginação, marcas, personalidade, linhas de conduta e coerência. "O sucesso de uma edição, para ser mantido vivo, exige o sucesso da edição seguinte".

Acrescentamos ainda que, além da qualidade do noticiário, o jornal deve contar com um atraente projeto gráfico. Hoje, um bom visual pode tornar a leitura muito mais fácil e agradável, passando ao leitor uma sensação de eficiência e credibilidade. A persistência das seções, das reportagens bem determinadas e uma seqüência lógica das informações podem proporcionar ao veículo impresso uma boa vantagem sobre os concorrentes.

A continuidade de um noticiário é uma característica importante de um veículo impresso. Mas para isso, é preciso que haja uma interligação eficiente e que ofereça ao leitor um panorama geral sobre o assunto. É possível prender um leitor a uma determinada matéria, mesmo que ele não tenha acompanhado o desenrolar dos fatos desde o início. Isso pode ser feito através de alguns recursos gráficos e boxes, mostrando a origem dos acontecimentos. Esse é um recurso muito utilizado na Folha de S.Paulo, e aplicado não com muita freqüência pelos concorrentes.

Portanto, o leitor não tem obrigação de conter um arquivo particular de todas as informações. Entendemos que isso pode e deve ser feito pelo veículo de comunicação. Afinal, uma prestação de serviços também abrange todo um aparato proporcionado ao público alvo. Nada melhor, do que tratar muito bem o cliente "para ele voltar sempre".

Ao longo dos anos, os jornais forçosamente modificaram sua estrutura editorial com textos mais enxutos e objetivos, e ainda, com recursos gráficos que tornavam as páginas muito atraentes. Acreditamos que tais mudanças ocorreram principalmente nas décadas de 60 e 70, quando a televisão já se apresentava muito mais disposta a concorrer por uma fatia maior do mercado de comunicação. Durantes essas décadas, os jornais passaram do linotipo para a impressão offset e, posteriormente, para a informatização total de seu processo. Nessa transação, o jornal diário transformou-se em um produto compatível às necessidades da área comercial. Daí, a luta entre os concorrentes pelos famosos classificados.

Seu noticiário, ao mesmo tempo, teve também de assumir uma postura condizente, sendo flexível diante da exigência de um espaço comercial mais amplo. O número de páginas aumentou, mas não por exigência de sua linha editorial.

Passada a euforia do rádio e da televisão, o jornal mostrou-se estável no mercado, porém, com um perfil diferente no aspecto editorial. Todo o noticiário foi reduzido em nome da maior agilidade e versatilidade. O processo industrial não permitia um trabalho mais elaborado, e o próprio repórter teve de se adequar às exigências do veículo que não dispunha de tempo suficiente para trabalhar o assunto com maior profundidade. As notícias passaram a ser redigidas telegraficamente, com o uso dos famosos lides - como a parte principal da matéria - a utilização das retrancas e gráficos para uma melhor compreensão por parte do leitor.

A presença de uma nova tecnologia - microcomputadores -, na década de 80, ainda sem a participação da Internet no mercado, estimulou reformulações importantes nos grandes jornais, como por exemplo: Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo, Folha da Tarde, Notícias Populares e Diário Popular (hoje Diário de S.Paulo). Todo o empenho e investimento eram válidos para se conquistar uma faixa cada vez maior de mercado.

Acreditamos que os jornais sempre concorreram entre si, não se preocupando, por exemplo, com a existência de um novo veículo de comunicação - rádio, TV e, atualmente, a Internet. A preocupação com a área comercial também forçou os jornais a mudarem suas fórmulas diante de seus leitores, fossem eles da classe A, B, C ou D. No início dos anos 90, os principais jornais de São Paulo mostravam uma nova "cara" e traziam algumas surpresas nos finais de semana, oferecendo brindes, prêmios, coleções e demais sorteios aos seus leitores. E o noticiário? A pressão industrial e comercial impôs mudanças no processo jornalístico.

Instalou-se às sextas-feiras os famosos "pescoções" - ou seja o fechamento da edição de domingo foi antecipada, prevalecendo assim as chamadas matéria "frias" ou especiais, trabalhadas com um tempo mais amplo, através de entrevistas, pesquisas e complementos gráficos. Tais matérias passaram a ocupar maior espaço, sendo inclusive motivo de chamadas principais nas primeiras páginas. Dentro desse quadro podemos analisar o seguinte: os jornais no início dos anos 90 já estavam se semanalizando por intermédio de cadernos tradicionais como o de Automóveis, Turismo, Agropecuário, Páginas Femininas, e de novidades como os de Informática, Consumidor, Economia, Investimento, Imóveis, etc.

A consagração desse processo jornalístico provocou mudanças nas editorias que receberam novas denominações. É preciso destacar também que o fim da revisão nos jornais, causou a queda na qualidade dos textos e do próprio noticiário. Consideramos que o papel do revisor era importantíssimo na correção gramatical, assim como sempre foi importante também a função do copidesque como o responsável pela adequação e ajuste dos textos no fechamento da edição. A "cadernalização" ou "revistalização" , não importa qual a classificação que possa ser atribuída a essa mudança nos jornais diários. O importante é que houve uma queda na qualidade do noticiário, não apenas em termos de espaço, mas também na elaboração, no objetivo de se passar ou transmitir a informação ao leitor. Ou seja, no ato de comunicar.

A arte do texto foi relegada a um segundo plano, já que os veículos impressos passaram a privilegiar a produção gráfica. Sem dúvida, uma boa embalagem muitas vezes ilude o comprador. No entanto, defendemos o ponto de que o jornal necessita manter aspectos importantes que o tornaram um veículo imprescindível. Entendemos que o jornal deve informar, orientar e educar. Infelizmente, tais características não vêm sendo observadas pelos grandes jornais. Há negligência na apuração e na checagem das notícias, o que resulta no desencontro de informações, confundindo e impedindo uma compreensão melhor por parte do leitor. A dificuldade de um veículo de se manter independente não pode ser um obstáculo na transmissão de um noticiário objetivo e confiável.

Esse período de transição e conflito interno dos jornais, provocou uma oscilação no mercado e resultou no fechamento do jornal A Folha da Tarde - transformando-se no Agora - e do Notícias Populares (Grupo Folhas). Mas as dificuldades, principalmente econômicas e financeiras continuaram atingindo outras jornais no início do século XXI. O Diário Popular, adquirido pela Info Globo, deu lugar ao Diário de S.Paulo, um titulo que circulou até o início da década de 70, e que pertencia aos Diários Associados de Assis Chateaubriand. As aquisições e fusões constatadas em outros setores de atividades estão se repetindo na área da comunicação. A exemplo dos Estados Unidos e Europa, no Brasil também vem ocorrendo uma forte concentração de grupos que visam dominar o mercado da comunicação.

Os grandes conglomerados já dominam os setores impresso e eletrônico. A própria Internet abriu um espaço a mais para que esses poderosos grupos tenham uma participação bastante ativa no setor. As mudanças na área de comunicação ocorreram de forma mais incisiva nos Estados Unidos. Hoje, os veículos impressos (jornais e revistas) tentam transpor as barreiras impostas pelos efeitos da televisão. O aprimoramento do telejornalismo no início dos anos 60 e o grande boom registrado nos anos 80 - por exemplo com a CNN transmitindo notícias ininterruptamente - contribuíram ainda mais para reduzir o função exercida pela mídia impressa.

De acordo com James Fallows - Detonando a Notícia -, jornais e revistas estão enfrentando verdadeiros desafios desde a década de 50 para descobrir um caminho onde possam oferecer algo mais ao leitor, já que o rádio e a TV passaram a proporcionar ao público todos os acontecimentos do dia anterior. "Os jornais começaram a oferecer artigos mais analíticos e interpretativos. As revistas continuam se debatendo para descobrir o que podem oferecer de novo e de melhor, numa época de saturação de notícias dadas pela TV, e análises cada vez mais sérias dos acontecimentos, oferecidas pelos jornais". [2]

Segundo o autor, a chegada dos canais pagos e a "nova mídia" (Internet) também exerceram fortes pressões sobre o ramo jornalístico influindo inclusive sobre os repórteres, cujo trabalho diminuiu em importância, pois não sabem se o público nota a diferença entre uma cobertura jornalística boa e uma ruim.

Ainda nesse mesmo raciocínio lembramos que nas duas últimas décadas os jornais locais americanos têm sido adquiridos por cadeias jornalísticas nacionais. Com isso, os jornais do interior que pertencem há gerações a uma família começam a usufruir de vários benefícios, inclusive com maior liberdade de ação sobre seus "inimigos". O mesmo não acontece com uma cadeia de jornais, cujos proprietários se mostram dispostos a reduzir o tamanho das redações a fim de cortar despesas e atingir lucros predeterminados. Fallows lembra que a Gannett é a maior cadeia jornalística dos Estados Unidos, com quase duas dúzias de estações de rádio e de TV, com seus quase cem jornais e um lucro de US$ 800 milhões em 1994 (17% a mais do que no ano anterior).

Para ele, é significativo o fato de os quatro jornais mais respeitados do país - New York Times, Washington Post, Los Angeles Times e Wall Street Journal - estarem fora desse monopólio. Todavia, a tendência à "redução" que transformou totalmente a indústria americana também foi sentida por esses tradicionais veículos. As mudanças financeiras, culturais e políticas ocorridas nos Estados Unidos abalaram a estabilidade, a autoridade e o conjunto da mídia americana. O surgimento de estrelas-jornalistas de TV tem oferecido recompensas consideráveis aos profissionais de imprensa desde que esqueçam o real significado da palavra repórter.

Isso possibilitou o aumento da interferência de políticos e assessores, com o objetivo de plantar rumores ou notícias na imprensa. "A luta por mais leitores nas redações de jornais e a luta por maiores índices de audiência nas TVs estão transformando editores em gerentes e aumentando a flexibilidade dos repórteres, bem como a sua vendabilidade. Esses conceitos são considerados normais na maioria dos negócios, mas podem pressionar de modo errado escolas, unidades militares ou organizações jornalísticas. Essas mudanças são importantes para o público americano, pois elas enfraqueceram a habilidade da mídia de nos dizer o que precisamos saber". [3]

De acordo com estudo da Advanced Media Group, 80% dos jornais americanos comercializam alguma forma de conteúdo on-line. Segundo a pesquisa, mais de um terço dos jornais do país está buscando novas maneiras de gerar receitas por meio da venda de conteúdo na Internet, enquanto 8% já definiram estratégias para aumentar a comercialização de conteúdo on-line para 2002. As receitas adicionais devem surgir da venda de fotografias ou de reportagens mais aprofundadas - apenas 4% dos jornais americanos oferecem esse tipo de material na Web. Um dado curioso: a maior parte das empresas jornalísticas comercializa apenas artigos arquivados, sendo que cerca de 95% cobram uma média de US$ 2 por artigo visualizado. Mais de 60% das empresas que vendem reportagens arquivadas estão faturando menos de US$ 500 por mês.

Uma outra pesquisa feita pela Markle Foundation apontou que 70% dos internautas americanos questionam a maior parte do conteúdo que lêem ou experimentam on-line. Apenas 23% confiam em praticamente todo o conteúdo a que têm acesso na Web. Ainda conforme um dos itens do estudo, a Web ainda é vista como uma ferramenta de pesquisas, pois 45% dos entrevistados associaram a rede mundial de computadores com uma biblioteca. A situação instável e delicada dos jornais também ficou evidente na Europa, onde o estudo da Associação Mundial de Jornais (WAN) indicou que entre 1999 e 2000, Portugal foi dos países que menos cresceu na leitura de jornais diários.

Em 2000, para cada mil portugueses, 82,7 liam jornais diários, números distantes por exemplo, da Noruega, onde há 719,7 leitores por mil habitantes; do Japão, com 668,7 leitores por mil habitantes; e até mesmo da Espanha onde há 129,4 leitores de jornais diários por cada mil habitantes. No entanto, conforme a pesquisa, a situação em Portugal inverte-se quando se trata de jornais não-diários, onde ficou registrado 138,8 leitores por cada mil habitantes, continuando a ser um dos países europeus com mais leitores de jornais não-diários à frente do Reino Unido e da Suíça.

O diretor do Observatório da Comunicação (Obercom), Rui Cádima - baseando-se nas estimativas da Associação Portuguesa de Imprensa - lembra que nos últimos 30 anos, surgiram muitos títulos de perfil semanal que habituaram o público português à leitura não-diária, e ao mesmo tempo foram desaparecendo muitos títulos diários significativos como O Século, Diário Popular e Diário de Lisboa. Cádima acredita que a penetração da imprensa vai aumentar em Portugal.

Ele vê com otimismo a mudança positiva na leitura de jornais diários para esta década, principalmente diante dos projetos visando a recuperação da taxa de analfabetismo, o reforço da escolaridade obrigatória e o desenvolvimento do setor educativo.

Diário Popular

No desenvolvimento de nosso trabalho procuramos mostrar os mais diferentes aspectos que envolveram não apenas o jornalismo em si, mas alguns dos principais veículos impressos do país. E diante disso, decidimos escolher o Diário Popular como o tema central de nossa pesquisa. Trata-se de um jornal que fez sua história, tomou parte da própria história do Brasil e esteve presente em vários momentos importantes nos setores social, político e econômico. O Dipo como era carinhosamente conhecido foi impresso e distribuído pela primeira vez no dia 8 de novembro de 1884.

Seus fundadores José Maria Lisboa e seu amigo Américo Campos estabeleceram desde o início os objetivos e as metas de comportamento que seriam adotadas pelo jornal. E foi a partir do primeiro número que o Dipo abraçou a causa da Abolição da Escravatura e, em seguida, a da República. Com uma mentalidade progressista, o jornal soube desde o começo o caminho para superar os problemas e seus oposicionistas. Em sua linha editorial destacava-se a preocupação pela solidariedade e a manutenção da liberdade de expressão e pensamento.

A cada fase marcante da história do país, o Diário Popular também evoluía em todos os sentidos, adquirindo equipamentos, amplas instalações e mão-de-obra especializada, principalmente no meio literário.

Das instalações modestas da rua João Brícola - no centro velho de São Paulo - com uma passagem significativa pela rua do Carmo, até o tradicional prédio da rua Major Quedinho adquirido na década de 70, foi uma longa trajetória.

Durante um século o Dipo evoluiu, mas como sua própria direção dizia: sempre sendo fiel a seus princípios. Com o slogan de "o jornal de todas as classes", o Diário Popular mostrou nas décadas de 60 e 70 uma linha editorial sóbria, cujo objetivo eram as classes B e C, tornou-se conhecido também por suas páginas de classificados publicadas às quintas-feiras e aos domingos. Embora não competindo editorialmente com a Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo, o velho Dipo conseguia manter um público fiel, oferecendo um noticiário objetivo e eficiente. Mesmo atravessando algumas adversidades, o Diário Popular mostrou-se resistente às mudanças tecnológicas.

Enquanto seus concorrentes se aparelhavam com máquinas e equipamentos modernos, o jornal da Major Quedinho mantinha suas máquinas de linotipo a todo vapor. Todavia, as mudanças forçosamente ocorreriam na década de 80. O jornal não suportava mais competir em desvantagem, acima de tudo com a agilidade e o dinamismo dos concorrentes cujas edições chegavam cada vez mais cedo às bancas da Capital e Interior. No final dos anos 80, a família Lisboa deixava o comando do jornal. Diário Popular e o Popular da Tarde (jornal especializado em esportes criado na década de 70) iriam sofrer profundas modificações no comando do diretor Ari Carvalho - sócio do ex-governador Orestes Quércia - que confiou as mudanças gráficas e editoriais ao experiente jornalista Miranda Jordão.

A linotipia fazia parte do passado. O Popular da Tarde transformou-se no Caderno de Esportes do Diário Popular, que por sua vez, apresentou aos seus leitores um noticiário renovado, com ênfase às editorias de Polícia, Geral e Esportes. O objetivo: aumentar a vendagem, atingir principalmente as classes B,C e D, e transformar o Dipo em O Rei das Bancas. A nova fase foi recompensada com a aceitação total por parte dos leitores. O jornal passou a atingir recordes nas vendas e obtendo um espaço considerável num mercado que até então era dividido com A Folha da Tarde e o Noticias Populares. A partir da informatização o Dipo ganhou fôlego e não demorou muito, já sob o comando de Orestes Quércia, para o jornal sofrer uma nova exigência de mercado. Ou seja, transformar-se graficamente, ganhando novas cores. Havia receio de que os leitores não aceitariam essa mudança.

Algumas pesquisas inclusive apontavam a preferência do público pelo edição em branco e preto. Mas, a ousadia empresarial acabou prevalecendo, renovando o velho Dipo, tornando-o mais competitivo. O Diário Popular durante mais de um século sempre foi apontado como a grande escola para os jornalistas que iniciavam na profissão. Grandes nomes passaram pela redação não só da rua do Carmo como também da Major Quedinho. A inegável empatia com o público fazia do Dipo um fenômeno. Afinal como pôde um jornal sobreviver a tantas mudanças ? Que tipo de atração mantinha o leitor fiel ao jornal?

Consideramos que a linha discreta mantida pelo veículo seguramente conquistou o público. Na verdade, o sensacionalismo nas páginas esportivas e policiais eram oferecidas de uma forma menos agressiva do que os concorrentes. Havia , sim, a credibilidade por parte do público em cada matéria publicada. Na produção editorial havia muito do jornalismo dos anos 50 e 60, porém, envolvido em uma camada de modernismo que prendia o leitor nas principais reportagens investigativas.

Contudo, o tempo também foi implacável com o Diário Popular que acabou sucumbindo às exigências da modernidade. Uma nova feição, já sem o comando de Miranda Jordão, passou a tomar conta do Dipo em meados dos anos 90. Como todos os seus concorrentes o jornal da Major Quedinho rendeu-se a nova ditadura do mercado. Sob forte pressão política e econômica, a linha editorial passou a ser mais flexível. Da mesma forma como o Dipo foi considerado "o último dos moicanos" a entrar na era da informática, o mesmo procedimento ocorreu em relação a "semanalização" ou como queiram a "cadernalização" que tomou conta de todos os veículos impressos diários. Novas editorias foram criadas,como por exemplo a do Consumidor, Informática e Recursos Humanos, forçando a "cadernalização" de outras tradicionais, como a de Economia, Geral, Turismo e Variedades.

Nessa nova fase de mudanças, além dos cadernos, o jornal ganhou também uma outra reforma gráfica. O tradição do jornal em preto e branco foi abandonada. Apesar da impressão em cores e das novidades em termos editoriais, a força dos cadernos de Polícia e Esportes foi mantida, como também a preferência dos leitores. Sob nova diretoria de redação, o Dipo passou a fazer parte também da distribuição de prêmios, entre os quais, ingressos de teatro, vídeos, CD's, etc. Aos finais de semana, as matérias "frias" ou especiais, foram ganhando a preferência e ocupando espaços cada vez maiores nas páginas internas e integrando as manchetes principais da primeira página.

Por fim, o jornal atingiu uma mesma padronização de mercado, com notícias semelhantes não-aprofundadas em seu dia-a-dia, e optando por matérias comportamentais e de serviços, aos domingos. Tornou-se um jornal igual aos concorrentes, diferenciando apenas num acentuado noticiário policial e esportivo. A preferência dos leitores e a tradição não foram suficientes para impedir uma negociação que determinaria o seu posterior "desaparecimento" do mercado. Os fatores político e econômico novamente foram decisivos e compatíveis com os anseios da Organização Globo de contar com um jornal diário de grande penetração em São Paulo.

Em setembro de 2001, o velho Dipo saía de circulação para a entrada do "novo" Diário de S.Paulo.

Décadas de 30 a 50

Com um visual gráfico pouco atraente, o Diário Popular destacava seu título na primeira página em letras góticas, a exemplo do jornal norte-americano New York Times. Na década de 30, os jornais não absorviam um trabalho mais intenso em termos de arte. Por isso, as primeiras páginas carregavam nos textos, explorando muito pouco a imagem. É evidente que a tecnologia também não ajudava. Mesmo com equipamentos de ponta, para a época, o Diário, por exemplo, procurava concentrar o noticiário principal na primeira página, acompanhado da manchete. Os resultados finais da composição e impressão eram modestos já que as fotos e ilustrações não atingiam uma reprodução satisfatória.

Mas, o jornal atendia às necessidades de seus leitores. Os recursos tecnológicos eram bem diferentes, porém, o trabalho artesanal feito na redação superava qualquer dificuldade. Escolhemos alguns exemplares do Diário Popular que oferecem uma dimensão exata do noticiário da época.

Em julho de 1932, o Dipo estampava como manchete principal a luta pela Constituição, dando na primeira página o texto da matéria, com retrancas, e apenas três fotos com personagens principais do assunto em foco.

Na sua trajetória, o Dipo colecionou fatos históricos. Ou seja, cumpriu seu dever como veículo de informação. Em 1939, estampou na primeira página o início da Segunda Guerra Mundial. É evidente que a notícia por si mesma carregava um impacto muito grande. O mesmo aconteceu com a rendição da Alemanha na edição de 7 de maio de 1945. Neste número, houve um trabalho mais apurado. A primeira página foi elaborada com equilíbrio. Os textos foram ocupando os espaços intercalados pelas fotos e ilustrações dos personagens principais da guerra. É preciso lembrar que esse tipo de trabalho dependia exclusivamente do material das agências de notícias. Mesmo assim havia a preocupação de cuidar e atender aos anseios dos fiéis leitores, acima de tudo tornando a página, em sua grande parte ocupada de textos, mais "suave" possível.

No período que mencionamos, embora houvesse uma atenção para com os textos, notamos que não havia uma ordem natural a ser seguida. Ou seja, a diagramação era feita segundo critérios adotados no fechamento da edição, sem haver uma programação preestabelecida. Alguns pequenos anúncios, timidamente começavam a ocupar espaços na primeira página. Os "brancos" da página eram preenchidos com os famosos "calhaus" ou notícias de "última hora". Observamos que a função da primeira página era a de estampar a matéria principal, com manchete e os textos completos da respectiva cobertura.

Com um visual bem mais moderado a edição de 6 de novembro de 1946 destacou na primeira página a destruição parcial da Estação da Luz, em razão de um incêndio no setor administrativo. Além do título principal, e subtítulos, quatro fotos ampliadas em seqüência, ocuparam meia página mostrando os ângulos principais do fato. O texto, logo abaixo da fotos, contava o desenrolar dos acontecimentos, e ao lado, um edital da São Paulo Railway Company, orientando os passageiros para o embarque e desembarque.

As edições extras e comemorativas também faziam parte da história do Diário Popular. No dia 25 de janeiro de 1954 o destaque ficou por conta dos festejos comemorativos do IV Centenário de São Paulo. Na capa, o jornal apresentou uma ilustração ampliada e textos do acontecimento.

Com uma linguagem jornalística bem característica, o velho Dipo contou em detalhes os momentos que antecederam o suicídio do presidente Getúlio Vargas, em agosto de 1954. Várias fotos distribuídas, sem uma programação aparente, acompanhavam na primeira página da edição extra o texto principal da matéria cujo trabalho informativo era complementado com retrancas que abordavam as repercussões. É evidente que, diante dos parcos recursos da época, os esforços editoriais tinham de se concentrar na preparação da primeira página, que tinha a incumbência de atrair os leitores.

Décadas de 60 a 80

As transformações políticas e econômicas passaram a ocupar as manchetes dos principais jornais do País. O Diário Popular, integrado também a um novo projeto visual, acompanhou os momentos principais desde a instalação dos três poderes em Brasília, a renúncia de Jânio Quadros e o início de um período de 20 anos de ditadura militar. Na primeira página, as fotos sobressaíam aos textos com a clara intenção de atrair um número cada vez maior de leitores. Já nessa época, as formas de trabalhar a primeira página eram bem melhores. Os recursos permitiam o uso mais intenso da imagem, trabalhando-a de uma maneira apropriada.

Todavia, os textos ainda eram "pesados" não permitindo uma maior criatividade na página principal. Além do momento de transição na área política, o Dipo registrou de uma forma ainda conservadora alguns acontecimentos importantes como a conquista da Copa do Mundo de 62 e o assassinato do presidente John Kennedy, em novembro de 1963.

A partir de 1967, o Dipo já apresentava aos seus leitores uma nova "cara". Com uma aparência mais leve, o jornal procurava diversificar seu noticiário na página principal. Notava-se uma nova "hierarquia" sobre a colocação das matérias na página. Sem dúvida, a manchete principal, ganhava seu espaço com direito a fotos, textos e pequenas chamadas complementares. Num segundo escalão, surgiam as submanchetes, ou seja, as matérias que mereciam uma chamada na primeira página, sem muito destaque. O primeiro transplante feito pelo professor Zerbini, o novo Ato Institucional, a chegada do homem à lua, foram algumas das matérias que marcaram a década de 60. Foram elas, também, que mereceram um tratamento especial de primeira página.

Conseqüentemente, monopolizaram a respectiva edição com farto material de textos e fotografias. A presença de um censor nas redações, mexeu com o brio dos profissionais de imprensa. No Dipo essa figura do censor foi desempenhada por um general da reserva. Por ele, passariam todas as provas das matérias que iriam para a composição e impressão respectivamente. Os desmandos do militarismo não eram estampados nas primeiras páginas e, muito menos, no miolo do jornal. Em novembro de 1969, ganhou destaque na primeira página do Diário Popular, a morte, em tiroteio, de Carlos Marighela, apontado como o mentor intelectual do terrorismo em todo o Brasil. Na verdade, o Dipo não era determinado em sua linha editorial.

Alegando uma boa aceitação em suas páginas de classificados, o jornal era moderado em sua posição política, e também, quanto ao trabalho das matérias para a publicação. O general comandava as ações. E a direção do jornal concordava plenamente. Entretanto, o Diário Popular era apontado como uma verdadeira escola para o jornalismo. Apesar de um perfil modesto, a "casa" oferecia um ambiente satisfatório no desenvolvimento das funções jornalísticas. Isso contribuía sempre para o surgimento de novos e bons profissionais.

O velho Dipo mostrava uma certa versatilidade em lidar com as transições urgentes quanto ao aspecto editorial. E foi desse jeito, que o jornal começou a ganhar uma nova forma no início da década de 70. A festa do Tricampeonato mundial de futebol, no México, monopolizou a primeira página, onde fotos e textos alternavam-se passando ao leitor a cobertura completa da grande conquista. Da mesma forma, o Diário se conduziu ao relatar a tragédia do Edifício Andraus. As imagens nesse episódio, ganharam uma conotação especial, acima de tudo pelo bom trabalho fotográfico.

Os textos foram colocados de uma forma quantitativamente equilibrada.

Em meados da década de 70, o Dipo já deixava bem claro a preferência em trabalhar melhor as imagens, ficando para os textos apenas uma função de complemento. Embora com boas ampliações de fotos na primeira página, o jornal não perdia sua característica editorial.

Ou seja, de manter seu noticiário estritamente informativo. Nas primeiras páginas, havia sempre uma colocação, discreta que fosse, sobre as ações dos militares, porém, a morte de um terrorista nacional ou internacional era sempre garantia de um bom espaço. No início da década de 80, a empresa Diário Popular S/A já mostrava alguns sinais de preocupação de ordem econômica. Algumas edições foram marcantes no aspecto político. Como por exemplo, a do atentado ao Papa João Paulo II, Diretas Já, e o conseqüente fim da ditadura militar.

Nesse período, o velho Dipo contava com o respaldo do Popular da Tarde, especializado em esportes. Depois da edição comemorativa de 100 anos, em novembro de 1984, o Diário novamente se fez presente em uma das páginas históricas do País, dando ampla cobertura à morte de Tancredo Neves. Com um designer elaborado especialmente para a edição, o velho Dipo abandonou o padrão conservador a fim de se integrar também ao emocional do povo brasileiro. Com fim da ditadura militar e uma crise econômica preocupante, chegava ao fim a dinastia da família Lisboa, entrando em ação, uma nova filosofia empresarial tendo como pano de fundo, o ex-governador Orestes Quércia.

Em novembro de 1988, a diretoria de redação decidiu transformar o conservador e moderado Dipo num jornal popular e mais arrojado. Sim, popular sem ser vulgar. A idéia foi torná-lo um veículo com a cara do povo, aproveitando um vácuo na faixa de mercado dos considerados jornais populares. O Dipo então se apresentou com nova roupagem e disposto a conquistar os leitores, principalmente, concentrando as atenções nas editorias de Polícia e Geral, e lapidando ainda o Caderno de Esportes, que nada mais era do que o antigo Popular da Tarde. Além disso, um tópico importante na vida do velho Dipo. Finalmente, a informatização chegara à redação. Novos recursos, tecnologia de ponta, era o oxigênio que faltava ao tradicional veículo paulista para se consagrar.

Décadas de 90 a 2000

Essa nova fase do Diário Popular, já informatizado e integrado às novidades tecnológicas de mercado, permitia ao jornal uma aceitação muito grande por parte dos leitores. O que lhe valeu o slogan de "O Rei das Bancas". Com um noticiário atraente tendo como carro-chefe as editorias de Polícia e Esportes, o Dipo foi deixando para trás seus mais diretos concorrentes a Folha da Tarde e Notícias Populares. Os dois jornais - pertencentes ao Grupo Folhas - já não circulam mais e seus profissionais estão integrados à redação do jornal Agora, que substituiu a Folha da Tarde.

Com a faixa de mercado muito mais livre, o Diário tentava a cada exemplar um visual diferente para sua primeira página, com uma dose de sensacionalismo nos títulos, mas com arrojo nas aberturas das fotos. A marca principal das manchetes do Dipo era a atualidade. Ou seja, a notícia quente trabalhada a todo custo por sua equipe de reportagem, que saía às ruas sempre em busca do inédito, inesperado, curioso, algo que certamente iria satisfazer o leitor sedento por informações de impacto.

Nesse período, precisamente nos anos de 1992 e 1993, houve um crescimento acentuado do jornal em vendas avulsas. Em maio de 1994, quatro anos após a filiação ao IVC, a circulação líquida paga do jornal registrava um aumento de 96% em relação a 1990. Em 1995, uma pesquisa aponta o Diário Popular como o segundo jornal mais lido na Grande São Paulo, de segunda-feira a sábado. Na pesquisa da Marplan Brasil, feita em 1995, o Dipo na média diária de leitores de terça a sábado, possui 484 mil leitores, contra 452 mil da Folha de S.Paulo e 409 mil de O Estado de S.Paulo. No entanto, uma nova mudança na diretoria de redação, conduziria o jornal para um outro caminho, um pouco mais distante de seu fiel leitor.

O preto e branco tradicional do jornal diário, passava a incomodar a estrutura moderna do veículo. Além disso, o jornal lentamente foi perdendo a característica do ineditismo. Ou melhor, foi se "desvirtuando" até tornar-se, editorialmente, um jornal igual aos seus concorrentes. Em julho de 1998, o Diário se apresentava nas bancas de "roupa e cara novas". A edição em cores procurava oferecer aos leitores algo mais moderno e dinâmico. Mais investimentos foram feitos na reforma gráfica do jornal para dar à primeira página um pouco mais de sofisticação.

O sistema implantado na linha editorial, que até então obtivera ótimos resultados, foi aos poucos sendo abandonado. O Dipo, a exemplo dos seus concorrentes, estava se transformando. Mudando por fora e por dentro. Além das tradicionais editorias, foram criados alguns cadernos para assuntos específicos, como imóveis, consumidor, isto sem falar no grande volume de prêmios e brindes oferecidos nas edições de domingo.

Dessa forma, entendemos, que perdia o dinamismo da notícia, mas ganhava a filosofia empresarial com alternativas de lucros.

A nova embalagem, mais atraente, não é e nunca foi sinônimo de qualidade. As cores não chegaram a atrair ou satisfazer os interesses dos leitores fiéis ao Diário Popular. Mas a modernização acabou por levar o Dipo às manchetes e matérias "frias" dos finais de semana. Por orientação dos editores executivos, os repórteres, além do dia-a-dia tradicional, tinham de buscar assuntos para as chamadas "matérias especiais". E assim o Dipo começava sua fase de "cadernalização" ao mesmo tempo em que desenvolvia suas matérias "frias" dos domingos.

Esta "semanalização" mudava o perfil do Diário Popular, definitivamente.

As manchetes principais, nos finais de semana, destacavam assuntos muito próximos ao estilo das revistas de informação geral. É evidente que tal "semanalização" vem apoiada no argumento de que existe nos jornais modernos todo um processo industrial, e também uma pressão político-econômica, que exige dos veículos uma chegada antecipada às bancas.

Isso leva a uma antecipação das edições dominicais, acarretando assim, a elaboração de matérias comportamentais ou de interesse humano. Isso caracteriza a "semanalização", ou seja, uma possível concorrência com as revistas de informação geral - Veja, Isto É e Época. Ficou bem característico no novo Dipo a inclusão no alto da primeira página de um anúncio dos prêmios e brindes, acompanhado quase sempre de um "calhau" da revista , também editada pelo Diário, com chamadas das matérias principais. Evidentemente, nada de novo era apresentado pelo jornal, a não ser uma cópia quase fiel do que faziam seus concorrentes.

Com uma primeira página congestionada com chamadas e anúncios, o Diário ainda continuava como o preferido dos leitores na faixa popular.

Porém, o golpe de misericórdia foi dado por intermédio de interesses empresariais. A compra do Diário Popular pela Globo determinou o fim de uma tradição nas bancas de jornais de São Paulo. No dia 22 de setembro de 2001, num sábado, circulou a última edição do velho Dipo. Para trás ficou toda uma história dentro do jornalismo. Um rápido percurso marcou a caminhada do jornalismo nostálgico à fase modernista. No domingo surgiu nas bancas um "velho" conhecido dos jornalistas mais antigos, mas com uma nova roupagem, uma nova filosofia, sem elo algum com o jornalismo praticado nos anos 50 e 60. Nas bancas, o Diário de S.Paulo, que lembra apenas no nome o jornal que integrava a rede de comunicação de Assis Chateaubriand.

Considerações finais

O jornalismo passa por um momento delicado, de transição, de indefinição por parte dos veículos que integram a área de comunicação. A proposta de nosso trabalho, em concentrar estudos sobre o jornal diário, especificamente o Diário Popular, teve como objetivo mostrar as diferentes fases que um veículo impresso passou e tem de passar no transcorrer dos anos. Não se trata de estabelecer regras, definir metas para o futuro do jornal diário, mas sim, detectar e analisar as adversidades enfrentadas, tendo como perspectiva uma possível mudança em seu processo.

Consideramos de fundamental importância, antes de entrarmos no objeto de nosso trabalho, ter apresentado um relato histórico sobre a chegada e o desenvolvimento do jornalismo em nosso País. Além da evolução dos jornais que se transformaram mais tarde em grandes conglomerados de comunicação, as pesquisas também ressaltaram períodos históricos com o rádio e a televisão que marcaram transformações de ordem política e econômica, e até mesmo dos costumes sociais em diferentes épocas.

Desde o início, o jornalismo foi pautado por intermédio de conceitos que direcionaram seu desenvolvimento para cada um dos veículos de comunicação. Tais conceitos também tiveram de ser analisados, principalmente, centralizando alguns ítens importantes relacionados às características do próprio jornalismo que abrangem, ética, responsabilidade social, veracidade, objetividade, honestidade e, acima de tudo, o maior patrimônio da categoria, a credibilidade.

Mas, a história do jornal impresso vai mais além. Ou seja, discute-se até hoje o futuro desse veículo, tendo como pano de fundo as novas mídias impostas pela tecnologia moderna. Basta lembrar que o jornal passou pelo desafio do rádio, pela competição direta da televisão e, no momento, pela invasão esmagadora da internet. Antes de mais nada, é importante refletir sobre a capacidade extraordinária que o veículo impresso diário tem de se ajustar às exigências de mercado. Aconteceu dessa forma com a chegada do radio, que prometia e cumpria um imediatismo a toda prova.

No entanto, isso não foi suficiente para barrar a evolução do jornal, que seguia em frente, com novos ajustes editoriais. Mais tarde, ocorreu o mesmo fenômeno com a televisão, que não conseguiu dobrar o jornal, e mais ainda, teve de aprender a conviver com o "inimigo", introduzindo um processo de pauta baseado nas atividades do impresso diário.

O jornal impresso enfrentou a todos os desafios, com determinação, e soube se adequar a cada período de transformação. Embora determinado no ato de informar ao público, o jornal diário sofreu o impacto provocado pela informatização, mais precisamente, por parte da internet, que busca incessantemente conquistar uma considerável faixa de mercado, ainda sob o domínio do veículo impresso. O fenômeno da internet causou uma agitação natural no mercado e previsões pessimistas quanto ao futuro do jornal. Todavia, registramos por outro lado, que o impacto causado pela internet foi passageiro. O jornalismo está, sim, atravessando um período de estagnação, e possíveis mudanças em seu perfil, porém, sem qualquer vínculo que possa ser atribuído apenas à internet.

O enfoque sobre o Diário Popular procurou mostrar, além das mudanças radicais, a estrutura forte de um veículo impresso para suportar as pressões de setores políticos e econômicos. O Dipo alternou bons e maus momentos em seus longos anos de vida, e soube como se adaptar, se ajustar, aos desmandos implantados por sua direção. O jornal diário é versátil por natureza e pode conservar por muito tempo um público fiel, mas exigente com relação às mudanças editoriais. O Dipo, digamos assim, acompanhou a modernidade, a evolução de seus concorrentes diretos e indiretos. Mas pagou um preço alto, não pelo produto - a notícia - que colocava no mercado, mas pelos interesses e indefinições de seu comando empresarial e político.

O próprio jornalismo nos apresenta grandes surpresas e contradições. Ao mesmo tempo em que nos deparamos com o final do ciclo de vários jornais - no passado, alguns tradicionalíssimos - como a Folha da Tarde, Gazeta Esportiva e Notícias Populares, e o enfraquecimento de outros como Gazeta Mercantil e Jornal da Tarde, constatamos um fato curioso: o velho Dipo deixou de circular no "auge da carreira". Tais mudanças, inexplicáveis dentro de alguns conceitos editoriais, demonstram uma força incomparável do veículo impresso. Basta lembrar que o imediatismo "exagerado" da notícia veiculada pelo rádio, televisão e internet, não conseguiu superar a informação bem trabalhada, checada e apurada, que o jornal pode e deve oferecer ao leitor, considerado o verdadeiro patrão dos impressos.

Nossos estudos observaram que as transformações ocorridas no Diário Popular, obedeceram uma ordem cronológica, a começar pelo linotipo, impressão offset, informatização e, conseqüentemente, a "caderna-lização" ou "semanalização" de seus componentes editoriais. Uma exigência do mercado ou não, o certo é que o próprio Dipo caminhou para o fim ao tentar se modernizar. O diferencial de um veículo impresso está na qualidade da notícia que apresenta, e não em apresentar uma embalagem atraente, mas com um produto de origem duvidosa.

Quando nos referimos a um período de transição que o jornalismo atravessa, procuramos nos concentrar nos veículos impressos, ressaltando a semelhança que vêm oferecendo em termos de mercado.

Pelo menos no momento, houve um desaparecimento do jornalismo ousado, corajoso, impetuoso no seu jeito de ser, de buscar as informações, oferecendo ao público uma narrativa fiel dos fatos. O Dipo sucumbiu exatamente quando abandonou essas características, para se tornar um veículo moderno, semelhante aos seus concorrentes, deixando órfãos seus fiéis leitores. Uma das lições que aprendemos no jornalismo: jamais subestimar o leitor.

É possível que esteja aí o grande impulso que faltava à mídia eletrônica para arrebatar o nicho de mercado dos veículos impressos.

Entendemos que os jornais necessitam buscar algo novo, inédito, exatamente para escapar desse marasmo prejudicial ao próprio sistema jornalístico. Semanalizar e concorrer com as revistas de informação geral, não acreditamos ser um caminho acertado, isto pelas diferenças de estilo no aspecto editorial, e quanto a embalagem, no acabamento gráfico.

Nosso trabalho procurou demonstrar que na transformação do Diário Popular para o Diário de S.Paulo, o velho Dipo deixou saudades de um jornalismo envolvente. Seus leitores, como testemunharam alguns profissionais, ainda estão à procura do Dipo pelas bancas da cidade.

Afinal, ele era parte integrante do cafezinho fresco e o tradicional pão com manteiga de todas as manhãs. A mídia eletrônica não reúne ainda condições de suplantar a mídia impressa ao ponto de fazer esta última desaparecer completamente do cenário. O jornal diário continua vivo, mas desconhecendo o potencial que poderia torná-lo mais vibrante e afastar de vez as pretensões dos veículos eletrônicos. Não basta saber, conhecer a notícia, é preciso sim, entendê-la.

Nesse aspecto, o jornal diário continua insuperável. Mas é preciso que os impressos, além de se modernizarem, façam uma auto-análise a fim de diagnosticarem quais os problemas que prejudicam o processo evolutivo em sua linha editorial. Os fatos, os acontecimentos, ocorrem a cada instante. O fundamental é saber como tratá-los e transmiti-los ao público. E o jornal impresso possui uma larga experiência a respeito. A modernidade faz uma exigência: não basta ser igual, é preciso ser diferente.

Referências Bibliográficas

[1] DINES, Alberto. O Papel do Jornal: uma releitura. SP: Summus, 1986. (p. 47-48).

[2] FALLOWS, James. Detonando a Notícia: como a mídia corrói a democracia americana. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997. (p. 88).

[3] Idem (p. 92 ).


*Laercio Arruda é jornalista.

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