Resenhas
Os
artífices da produção jornalística
Quem planta e quem colhe notícias?
Por
José Marques de Melo*
Numa
conjuntura em que segmentos da univer-sidade torcem o
nariz para as evidências empíricas, privilegiando
a reflexão abstrata sobre temas e problemas de
exclusivo interesse dos guetos acadêmicos, saudamos
com alegria e esperança este livro escrito por
três compe-tentes profissionais, cuja intenção
é deslindar o cenário jornalístico
brasileiro, contribuindo para a melhoria da produção
noticiosa como alavanca de fortalecimento da democracia.
Durante
muito tempo, a pesquisa sobre os fenômenos jornalísticos
teve caráter eminente-mente histórico, sendo
realizada a posteriori, ou seja, documentando e interpretando
fatos ocor-ridos no passado, com a finalidade de iluminar
o presente.
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ALCÂNTARA, Norma; CHAPARRO, Manuel Carlos &
GARCIA, Wilson - A imprensa na berlinda - a fonte pergunta.
SP: Editora Celebris, 2005, 416 pp.
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Mais
recentemente, ela enveredou por novos caminhos, tornando-se
factual, seletiva e acurada, tratando de registrar criticamente
os acontecimentos durante a sua própria evolução,
pensando no futuro. Desta maneira, converteu-se em instrumento
indispensável para a formação das novas
gerações que pretendem se lançar na arena
informativa, oferecendo análises e perspectivas sincrônicas
das rotinas profissionais, o que tem contribuído para
aperfeiçoá-las ética e tecnicamente.
No
entanto, a preferência dos estudiosos da área tem
recaído sobre eixos temáticos como a linguagem,
o conteúdo, as mutações tecnológicas
ou o impacto social das notícias. São raras as
pesquisas que focalizam os sujeitos noticiosos, mesmo assim
concentradas na figura do próprio jornalista, ora celebrado
como herói, ora punido como vilão da cena contemporânea.
A
originalidade do inventário contido nesta obra reside
na interlocução provocada pelos autores entre
os jornalistas e suas fontes. Ela retira da sombra os provedores
usuais das informações que geram ou dão
substância às notícias. Mas ao mesmo tempo
expõe abertamente os produtores jornalísticos,
nem sempre disponíveis para o diálogo ou inapetentes
para revelar métodos de trabalho e pontos de vista sobre
a profissão.
Trata-se
de um livro duplamente valioso. Os cidadãos que consomem
notícias encontrarão aqui explicações
suficientes para enigmas que cultivam ou para curiosidades que
nutrem, tendo em vista a amplitude dos questionamentos feitos
pelas fontes aos jornalistas. Por sua vez, os jovens aspirantes
ao estrelato jornalístico poderão dimensionar
facetas profissionais que dificilmente estão escancaradas
nos textos didáticos ou transparentes nos manuais de
redação.
Resulta
deste caleidoscópio, estrategicamente tecido por Norma
Alcântara, metodologicamente engendrado por Wilson Garcia
e teoricamente embasado por Manuel Carlos Chaparro, um manancial
de hipóteses a serem testadas no campo pela legião
de jovens que se engajam nos projetos de iniciação
científica dos nossos cursos de jornalismo ou nos programas
de mestrado e doutorado que abrigam estudos midiáticos.
Inúmeras
perguntas feitas pelas fontes são respondidas laconicamente
pelos jornalistas ou tangenciadas de forma sutil, pela simples
e cristalina razão de que o conhecimento sistematizado
sobre as práticas jornalísticas brasileiras é
residual, conjuntural, descontínuo. Fazer generalizações
sobre as rotinas profissionais torna-se temerário, para
não dizer perigoso.
Avultam,
contudo, neste celeiro de idéias e depoimentos, algumas
anotações pontuais feitas por figuras emblemáticas
como Helio Fernandes, Boris Casoy, Fernando Mitre, Clovis Rossi,
Dora Kramer ou Heródoto Barbeiro, que demandariam explorações
investigativas ou reflexões éticas capazes de
explicitar as encruzilhadas que estão angustiando profissionais,
empresários, educadores e cidadãos comuns neste
início de milênio.
Independentemente
da sua utilidade como estímulo para fazer avançar
o conhecimento crítico sobre o jornalismo brasileiro,
este volume representa sem dúvida alguma uma fonte de
prazer intelectual para os leitores de jornais, radiouvintes,
telespectadores ou internautas. Eles terão oportunidade
de ler respostas para questões que todos nós nos
fazemos cotidianamente como usuários da mídia.
E conhecerão também a ótica daqueles que
atuam na retaguarda midiática, "plantando"
notícias ou "colhendo" frutos, ora amargos
(quando se consideram filtrados pelos repórteres), ora
saborosos (quando emplacam versões assimiladas pelos
editores).
Alguns
ficarão surpresos ao perceber declarações
telegráficas, em estilo típico dos que fogem pela
tangente ou sintonizadas com o bloco dos "nem sim, nem
não, antes pelo contrário". Felizmente estas
são exceções. A maioria mostrou-se objetiva,
direta, coloquial, convincente. Vale a pena conferir!
Obs.:
Texto publicado anteriormente com o título
"O lado de lá - Quem pergunta é a fonte",
Observatório da Imprensa, São Paulo, Ano 10, nº
339, 26 jul. 2005. Disponível em: <http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=339AZL001>.
*José
Marques de Melo é Professor Emérito da Escola
de Comunicações e Artes da Universidade de São
Paulo (ECA-USP) e Titular da Cátedra UNESCO de Comunicação
da Universidade Metodista de Comunicação (UMESP).
Autor dos livros Jornalismo Brasileiro (Porto Alegre, Sulina,
2003), A esfinge midiática (São Paulo, Paulus,
2004) e Midiologia para iniciantes (Caxias do Sul, UCS, 2005).
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