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13/12/2004
Relator
rejeita Conselho
Federal de Jornalismo
Por
Comunique-se
O
deputado federal Nelson Proença (PPS-RS), relator da
Comissão de Ciência e Comunicação,
Tecnologia e Informática na Câmara, manifestará
sua rejeição à criação do
Conselho Nacional de Jornalismo na próxima semana, em
plenária.
O
parecer de Proença diz que "É incabível,
então, a criação de um Código de
Ética e Disciplina que puna o jornalista sob alegação
de cometimento de crime de imprensa, como pretendem as propostas
em exame.
Tais
crimes, inclusive os que atentam contra a honra de pessoas tratadas
na notícia, estão previstos na Lei de Imprensa
(Lei nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967).
Nenhuma
entidade, além da Justiça, deve pronunciar-se
a respeito destes, sob pena de caracterizar tentativa de cercear
o livre exercício do direito de informar".
Leia
a íntegra do parecer elaborado pelo deputado:
COMISSÃO
DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA, COMUNICAÇÃO E INFORMÁTICA
PROJETO
DE LEI Nº 6.817, DE 2002
(Apensado o Projeto de Lei nº 3.985, de 2004)
Dispõe
sobre a criação da Ordem dos Jornalistas do Brasil
(OJB), sobre o exercício da profissão de Jornalista
e dá outras providências.
Autor:
Deputado CELSO RUSSOMANO
Relator: Deputado NELSON PROENÇA
I
- RELATÓRIO
O
Projeto de Lei nº 6.817, de 2002, oferecido pelo Deputado
CELSO RUSSOMANO, pretende regular a profissão de jornalista.
Cria um conselho federal denominado Ordem dos Jornalistas do
Brasil (OJB), com conselhos regionais e estaduais, seções
(art. 7º) e Tribunais de Ética e Disciplina seccionais
(art. 29). O texto prevê a adoção de um
Código de Ética e Disciplina que estabelece normas
e critérios para o adequado exercício da profissão.
À
proposição principal encontra-se apensado o Projeto
de Lei nº 3.985, de 2004, que foi enviado ao Congresso
Nacional pelo PODER EXECUTIVO mediante a Mensagem nº 465,
de 2004. O texto cria o Conselho Federal de Jornalismo (CFJ),
autarquia de direito público e forma federativa. A entidade
gozaria de autonomia administrativa e financeira e teria suas
contas periodicamente examinadas pelo TCU, conforme prevê
o art. 12 da proposta. Seus funcionários estariam sujeitos
ao contrato de trabalho usual, em conformidade com a Consolidação
das Leis do Trabalho.
O
Conselho Federal, sediado em Brasília, teria entre suas
competências a valorização do jornalista,
sua defesa em juízo, o registro profissional da categoria
e a fiscalização do exercício profissional
(art. 2º).
Subordinados
ao CFJ haveria Conselhos Regionais, incumbidos, entre outras
funções, do registro profissional, da emissão
da carteira de jornalista, da fiscalização profissional
e da fixação dos honorários da categoria
(art. 3º). O registro é condição indispensável
ao exercício da profissão.
A lei prevê, ainda, o respeito a um Código de Ética
e Disciplina (art. 5º) e define transgressões disciplinares
ao mesmo, admitindo penas de advertência, multa, censura,
suspensão do registro profissional e cassação
do registro (art. 7º). O processo disciplinar poderia ser
instaurado de ofício ou por representação
de qualquer pessoa interessada (art. 9º).
A
primeira diretoria seria provisória, nomeada pela Fenaj.
Cabe
à COMISSÃO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA, COMUNICAÇÃO
E INFORMÁTICA dar PARECER à matéria quanto
ao mérito, respeitados os termos do art. 32, inciso III,
do Regimento Interno desta Casa.
II
- VOTO DO RELATOR
Em
que pese a propositura dos textos em exame, é de se ressaltar
que a profissão de jornalista já se encontra regulamentada.
O
Decreto-Lei nº 972, de 17 de outubro de 1969, define as
atividades privativas do jornalista (art. 2º) e condiciona
o exercício da profissão a registro em órgão
regional do Ministério do Trabalho, limitando-o aos portadores
de diploma de curso superior de jornalismo (art. 4º). Estabelece
uma regra de transição para pessoas não
portadoras do diploma (art. 10) que exercessem, à época,
a profissão de jornalista, e admite que, dentro de limites
de até um terço do quadro de profissionais de
cada veículo, possam ser contratados profissionais não
diplomados (art. 12).
O
Decreto-Lei demarca os cargos e funções do jornalista
nas empresas (art. 6º) e obriga ao registro destas. Admite
a acumulação de funções (art. 7º)
e define jornada de trabalho de cinco horas (art. 9º).
Remete aos sindicatos da categoria a função de
tratar do exercício irregular da profissão (art.
13).
A
proposta oriunda do PODER EXECUTIVO, portanto, não inova
em termos de regulamentação da profissão.
Seu objetivo é meramente o de criar um Conselho para
a categoria e impor normas disciplinares de caráter geral.
O mesmo enfoque é perseguido pelo texto oferecido pelo
Deputado CELSO RUSSOMANO.
Trata-se
de iniciativa que em algum momento acabaria por ser tentada.
Regulamentada a profissão, é previsível
que se criem os mecanismos para que o Estado, outorgante dos
privilégios inerentes à regulamentação,
possa em contrapartida fiscalizar a atuação profissional
dos beneficiários e punir quem desobedecer o comando
legal.
É
assim com advogados, engenheiros, médicos e demais profissões
regulamentadas. E lei que preveja a criação de
uma autarquia para tal fim deve ser oriunda do Poder Executivo,
sob pena de vício de iniciativa.
No
entanto, os aspectos que mais chamam a atenção
nos textos, e que foram amplamente questionados nas discussões
públicas sobre a matéria, veiculadas pela mídia
em geral, são a previsão de um Código de
Ética e a aplicação de medidas disciplinares
no exercício da profissão. Tais dispositivos,
na forma como foram redigidos, guardam graves implicações
para o exercício da liberdade de imprensa.
A
Constituição Federal assegura, em vários
dispositivos, a ampla liberdade de expressão e de imprensa.
Não é admissível, portanto, que se imponham
regras que possam, de qualquer modo, limitar essa liberdade
ou criar constrangimentos ao seu exercício por meio de
medidas administrativas. Havendo conflito entre a liberdade
de expressão e outros direitos, tal aspecto foge ao alcance
de um Código de Ética da profissão. É
matéria que interessa à sociedade e cujo exame
deve dar-se no âmbito do Judiciário.
É
incabível, então, a criação de um
Código de Ética e Disciplina que puna o jornalista
sob alegação de cometimento de crime de imprensa,
como pretendem as propostas em exame. Tais crimes, inclusive
os que atentam contra a honra de pessoas tratadas na notícia,
estão previstos na Lei de Imprensa (Lei nº 5.250,
de 9 de fevereiro de 1967). Nenhuma entidade, além da
Justiça, deve pronunciar-se a respeito destes, sob pena
de caracterizar tentativa de cercear o livre exercício
do direito de informar.
Não
se pode esquecer, de fato, que a atividade jornalística
é intrinsecamente agressiva aos interesses de quem tenha
suas mazelas expostas por matéria publicada. Mas isto
é socialmente legítimo, saudável e essencial
à democracia. Um Código de Ética da categoria
pode tornar-se, nesse sentido, uma ameaça à sociedade
e ao próprio jornalista. A entidade profissional pode
revelar-se uma arena na qual ele venha a ser questionado sobre
seus atos, pressionado a romper o sigilo de suas fontes, ou
a envolve-las em sua defesa perante os pares, criando-lhes constrangimentos.
É
igualmente incabível aplicar, à profissão
de jornalista, os cânones da ética de outras profissões.
Normas de conduta, usualmente admitidas como relevantes aos
atos profissionais de advogados, médicos ou engenheiros,
tais como a preocupação com a atualização
técnica, com a privacidade de seus clientes e colegas,
com a diligência no trato de equipamentos, com a preservação
de uma adequada relação de custo-benefício
na prática profissional e até com a adequada postura
no trajar, perdem importância no exercício do jornalismo.
A
ética do jornalista, assim, vai na contramão da
ética de outras profissões. Seu compromisso é
com a denúncia, com a apuração dos fatos
que surjam no subsolo da sociedade, nas engrenagens do Estado,
nos sinuosos corredores do poder. O jornalista tem a obrigação
ética de revelar o que possa prejudicar a outrem, até
mesmo a um colega de profissão, se o fizer em favor da
sociedade. Tem o direito de preservar o sigilo de suas fontes,
se isto for relevante à obtenção da informação.
Tem a liberdade de questionar, agredir, comportar-se mal, vestir-se
mal, romper com as normas, se isto trouxer, aos olhos da opinião
pública, a garantia de que não há segredos
que não possam ser desmascarados, de que a imprensa investiga,
confirma e divulga, de forma independente, os desvios de conduta
a que os poderosos estão sujeitos.
Nas
demais profissões, pode-se romper com a ética
por razões de comportamento, protocolo ou segurança
que vão além da norma legal. Já no caso
do jornalista, perigosos são o bom-mocismo, o respeito
exacerbado às normas, o temor diante da autoridade. Esperamos
do jornalista um exercício da ética pautado pelo
compromisso com a sua palavra, pela coragem na busca perseverante
da notícia e pela correção na sua divulgação.
Não
é este, lamentavelmente, o enfoque dos textos que ora
examinamos. O Código de Ética e de Disciplina
da categoria aqui proposto é um mecanismo coercitivo,
que coloca, nas mãos de qualquer um, o privilégio
de dirigir-se a uma autarquia e pedir, inclusive invocando razões
fúteis, a punição do jornalista que o tenha
prejudicado, até mesmo com a suspensão ou a cassação
do seu registro profissional.
Tal
procedimento conflita, inclusive, com o entendimento de organizações
multilaterais a respeito da liberdade de expressão. Declaração
de 18 de novembro de 2003, de representantes da Organização
das Nações Unidas (ONU), da Organização
dos Estados Americanos (OEA) e da Organização
para Segurança e Operação na Europa (OSCE),
destaca que não se deve suspender a credencial
de um jornalista com base no conteúdo de informações
por ele veiculadas.
Os
aspectos aqui levantados concorrem, em suma, para desaconselhar
as iniciativas em exame, em nome do adequado exercício
da profissão de jornalista e da preservação
da liberdade de expressão e de comunicação.
A
Federação Nacional dos Jornalistas Fenaj,
que veio a público assumir a autoria da proposição
encaminhada pelo Executivo, encontra-se isolada em sua defesa.
Posicionaram-se publicamente contra a proposta a Associação
Brasileira de Imprensa ABI, a Associação
Nacional de Jornais ANJ, a Associação Brasileira
de Emissoras de Radiodifusão e Televisão
Abert, bem como diversas vozes influentes do nosso jornalismo,
como Élio Gaspari, Míriam Leitão, Carlos
Chagas, Clóvis Rossi, Jânio de Freitas e Ricardo
Noblat, apenas para citar algumas.
Diante
do exposto e em reconhecimento às inúmeras expressões
contrárias à proposta, o nosso VOTO é pela
REJEIÇÃO, no mérito, do Projeto de Lei
nº 6.817, de 2002, e pela REJEIÇÃO, no mérito,
do Projeto de Lei nº 3.985, de 2004.
Deputado
NELSON PROENÇA
Relator
12/10/2004
Fonte:
Comunique-se.
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