Notícias
14/09/2004
Que se passa?
Por
Ricardo Kotscho
Folha de São Paulo
Que
se passa com o bom amigo Clóvis Rossi? Em seu artigo
de 8/9 ("Cores, amores e categorias", pág.
A2), a propósito de uma nota que enviei ao jornal "The
New York Times" para responder a um despacho indigente
de seu correspondente no Brasil, Rossi volta a discutir a questão
da representatividade dos jornalistas -assunto que, até
onde eu sei, nunca esteve entre suas preocupações-
no episódio do projeto de lei enviado pelo governo ao
Congresso Nacional propondo a criação do Conselho
Federal de Jornalismo, a pedido da Federação Nacional
dos Jornalistas. Como é contra o CFJ, ele me faz uma
crítica.
Até
aí, tudo bem.
Deixa
o Congresso Nacional debater e decidir se modifica, aprova ou
rejeita o projeto, como acontece nas melhores democracias.
Sem
entrar no mérito da questão, para não cansar
os leitores, pois temos posições opostas e já
expus a minha aqui mesmo nesta página, no artigo "Ao
debate, caros colegas" (10/8), o que mais me chamou a atenção
em seu texto foi a crítica que ele fez ao colega Luís
Nassif por ousar falar bem do Brasil (do Brasil, bem entendido,
não do governo brasileiro). Nassif escreveu que a onda
verde-e-amarela nas praias italianas neste verão seria
decorrência do fato de que o Brasil é o "país
mais amado do mundo".
Do
alto de sua sabedoria e niilismo, e bota altura nisso, baseado
em "enquete pessoal", para contestar Nassif, ele conclui
em sua coluna que "a onda atual tem muito mais a ver com
cor do que com amor ao Brasil". Aí já começo
a ficar preocupado com meu amigo e padrinho. Começo a
acreditar que o problema dele não é com o atual
governo, já que ele também foi mais ou menos crítico
em relação a governos anteriores, mas com o Brasil.
Rossi,
simplesmente, parece convencido de que o Brasil está
condenado a não dar certo. Nunca. Passou a vida escrevendo
sobre tudo de ruim que há no país -e ainda há
mesmo muita coisa ruim, ninguém vai negar- para justificar
sua tese, sem jamais encontrar nenhuma coisa que prestasse nesta
nação de 180 milhões de habitantes, que
vive um dos melhores momentos da sua economia nas últimas
décadas, com a geração de mais de 1,2 milhão
de empregos com carteira assinada só em 2004, aumentando
a renda dos seus trabalhadores, batendo sucessivos recordes
na produção industrial e agrícola e nas
exportações, recuperando a credibilidade externa
com a manutenção da estabilidade, registrando
o segundo maior superávit comercial do mundo em desenvolvimento,
admirado por suas artes, seus aviões, sua moda, sua comida,
suas modelos, seus esportistas nas mais diferentes modalidades.
Admirado, também, como testemunhei em viagens com o presidente
a mais de três dezenas de países de todas as latitudes,
por seu governo e por seu presidente.
Caro
Rossi, Nassif não está sozinho nas suas afirmações.
Você, que gosta tanto de citar publicações
estrangeiras em suas colunas, deveria dar uma olhada na edição
de 2/8 da "Newsweek": "Todo mundo ama o Brasil",
diz a revista em sua capa. Em longa reportagem, sob o título
"O mundo apaixonou-se perdidamente pela cultura tempestuosa
que nos deu a caipirinha e a capoeira", o repórter
Mac Margolis, que você conhece e sabe que é sério,
mostra que o Brasil é o país da moda não
só na Itália, mas também em Paris, em Manhattan,
em Milão, em Guangzhou, em Londres, em Tóquio,
em Moscou. Margolis cita dezenas de depoimentos entusiasmados
sobre o momento vivido pelo Brasil.
Não
posso acreditar que nenhum comentário desse tipo jamais
tenha chegado aos seus ouvidos em suas intermináveis
andanças pelo mundo.
Anda
tanto, o caro amigo, que dá a impressão aos seus
leitores, entre os quais me incluo, de que está deixando
de acompanhar as grandes transformações pelas
quais o Brasil está passando em todos os setores de atividade.
Há
quanto tempo você não vem a Brasília, não
vai aos fundões do Brasil, onde há fartura e emprego
e já foram beneficiadas 5 milhões de famílias
com o Bolsa-Família, não bota os pés numa
fábrica funcionando a pleno vapor ou numa terra irrigada
de agricultura familiar, não conversa com empresários
e trabalhadores anônimos da Zona Franca de Manaus ou dos
agronegócios do cerrado? Os leitores, tenho certeza,
estão muito mais interessados nesses assuntos do que
na criação do CFJ.
Para
quem só lê a tua coluna, a vida não vale
a pena, o Brasil não tem jeito, o apocalipse está
próximo. Só o contato direto -e não por
telefone ou internet- com a realidade brasileira pode fazer
o premiado, respeitado e competente jornalista que você
sempre foi não se transformar num Jim Jones (aquele guru
que levou o pessoal da sua seita ao suicídio coletivo
porque o mundo não tinha mais jeito) da imprensa.
Ânimo,
rapaz; bota o pé na estrada e você vai ver que
não é preciso ir para o estrangeiro para encontrar
muita coisa boa, gente que acredita no seu taco e no seu país.
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