Notícias
08/08/2004
Entidades dos EUA condenam
conselho de jornalismo no país
Instituições vêem ameaça
à liberdade de expressão; para teórico
da área, idéia encampada pela gestão Lula
é assustadora
Por
Rafael Cariello
De Nova York
"Isso
é assustador", afirmou Bill Kovach, um dos principais
teóricos do jornalismo nos EUA, sobre a idéia
de criação do Conselho Federal de Jornalismo no
Brasil, instituição que é encampada pelo
governo Lula e serviria para "orientar, disciplinar e fiscalizar"
o exercício da profissão de jornalista.
Representantes
de entidades ligadas ao jornalismo nos EUA condenaram veementemente
qualquer órgão de fiscalização da
imprensa ligado ou criado pelo governo brasileiro, ainda que
composto de representantes dos jornalistas -pelo projeto de
lei de autoria da Fenaj (Federação Nacional dos
Jornalistas), a comissão não poderia ser composta
por membros do governo federal.
As
entidades americanas afirmam que organismos desse tipo representam
uma ameaça à liberdade de expressão e uma
forma de tentar impor controle e censura aos veículos
de comunicação.
"Se
você permite isso, permite também que o governo
enfraqueça o principal objetivo do jornalismo -que é
a vigilância do próprio governo", disse o
diretor da ONO (sigla em inglês para Organização
de Ombudsmans de Notícia) Manning Pynn. "É
terrível."
A
proposta de criação do conselho foi elaborada
pela Fenaj, em conjunto com o Ministério do Trabalho,
e encaminhada ao Congresso pelo governo Lula. Entre as funções
previstas, estão "zelar pela fiel observância
dos princípios de ética e disciplina da classe"
e a capacidade de punir "condutas inadequadas" dos
jornalistas.
Para
Pynn, os verdadeiros juízes do trabalho dos jornalistas
devem ser os leitores e os espectadores -a pena para "condutas
inadequadas" é a perda de credibilidade-, e eventuais
abusos devem ser levados, por quem se sentir prejudicado, à
Justiça comum.
Ele
também criticou outra função proposta para
o conselho, a de registrar os profissionais de imprensa. "Jornalistas
são independentes, ninguém deve dar licença,
ninguém deve controlar [quem pode ou não escrever],
qualquer um pode ser", afirmou Pynn.
"Não
tem que ter diploma. O que não significa que as empresas
vão contratar qualquer pessoa", isso porque, de
acordo com o diretor da ONO, os veículos de comunicação
não vão querer ser responsabilizados judicialmente
por erros de maus jornalistas.
Para
Bill Kovach, que é presidente do Comitê de Jornalistas
Preocupados, organização dedicada a estudar e
aperfeiçoar os padrões éticos da profissão,
"se o governo decide o que é "conduta adequada",
você não pode ser independente".
"Suponha
que o partido no poder esteja incomodado. Essa legislação
permite que possam punir jornalistas", disse.
"Mesmo
que o governo peça à imprensa que faça
o conselho. Estão dando o poder para o sindicato. Mas
eles representam todos os jornalistas?", perguntou Kovach.
"Se você realmente acredita em imprensa livre, qualquer
um tem o direito de expressar a sua opinião. Sem ter
que receber licença de ninguém", afirmou
o ativista.
O
diretor-executivo do Conselho de Imprensa de Minnesota, Gary
Gilson, também disse acreditar que qualquer conselho
com poder de punição representa uma ameaça
à liberdade de imprensa.
Alternativas
Como
alternativa a iniciativas como a do governo Lula, o diretor
do conselho de Minnesota propõe que os jornalistas criem
órgãos auto-reguladores sem capacidade de punição
e com participação de membros da sociedade, não-jornalistas,
nos seus conselhos.
Se
forem confiáveis, afirma Gary Gilson, poderão
apontar à sociedade os exemplos que encontrarem de mau
jornalismo, e isso já será um grande golpe na
credibilidade dos envolvidos.
O
comitê do qual ele participa é independente. Um
dos princípios do órgão, na definição
de seu diretor, é: "O Conselho de Imprensa não
tem nenhuma autoridade -e não quer nenhuma- para dizer
a qualquer veículo de comunicação o que
fazer ou não".
Fonte:
Folha de S.Paulo, 08.08.2004.
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