Notícias
20/06/2003
ECA
discute regulamentação
profissional de jornalistas
Por Enio
Moraes Júnior
Militares
no poder; repressão e cerceamento aos direitos civis;
atos institucionais, como o AI-5, que fecha o Congresso Nacional
e acaba com a garantia do habeas-corpus; protestos com mortes,
como o caso do estudante Edson Luís, no Rio de Janeiro;
"Caminhando contra o vento, sem lenço, sem documento".
O
final dos anos 60 foi, sem dúvida, um período
de intensa agitação política e estudantil
no Brasil, e a Escola de Comunicações e Arte da
USP não ficou de fora deste cenário. Em 1969,
a ECA teve uma ativa participação no processo
que discutiu e criou o texto final de regulamentação
da profissão de jornalista no país.
José
Coelho Sobrinho, 58, jornalista e professor da Escola, participou,
como estudante, do processo. As atividades, que funcionaram
em formato de fórum, elaborando moções
e textos para fundamentar as discussões, surgiram por
iniciativa do professor José Marques de Melo.
Segundo
o Coelho, havia duas motivações principais, na
ECA, para discutir a regulamentação. Uma delas
era de cunho "cartorial", de marcar o espaço
de atuação profissional do jornalista, impedindo
aberrações como o episódio citado por ele
em que, na época, havia o caso de um jornal, em São
Luís do Maranhão, que imprimia 3500 exemplares
e possuía, em seus quadros, cerca de 400 jornalistas,
em sua grande maioria pessoas apenas interessadas em se beneficiar
das vantagens da profissão.
A
outra motivação, e talvez, segundo Coelho, a principal,
era política e visava "impedir que a ditadura colocasse
nos jornais e nas escolas exatamente quem eles queriam".
Segundo
ele, a posição política da Escola era notadamente
de esquerda, com seus vários matizes e nomes conhecidos.
Coelho destaca a atuação dos professores Marques,
Almeida Prado Galvão e Freitas Nobre, que já desenvolviam
trabalhos em torno da regulamentação profissional
do jornalista e aponta também nomes como o da hoje cineasta
Suzana Amaral, Etevaldo Siqueira, Walter Sampaio e de Wilson
da Costa Bueno, que fazia os apanhados e publicava o balanço
das discussões.
Ao
fazer uma análise das contribuições da
ECA no texto final da regulamentação, Coelho observa
que houve grande influência das discussões da Escola.
Para ele, a regulamentação impediu maiores abusos,
por parte da ditadura, ao impedi-la de formar quadros profissionais,
na imprensa, apenas com nomes indicados por ela. "Se você
fecha o grupo, a sociedade consegue ter um controle melhor do
que lhe interessa", diz.
Liminar
- Hoje, passados 34 anos, a regulamentação da
profissão enfrenta uma outra verdadeira polêmica.
Se não são mais os militares que estão
no poder, os interesses do empresariado e do mercado jornalístico
parecem corroer as bases dos documentos que passaram a vigorar
a partir de 1969.
No
final de 2001, uma liminar concedida pela Justiça de
São Paulo suspendeu, em todo o Brasil, a obrigatoriedade
de diploma de formação superior para o exercício
da profissão. A decisão é polêmica
e a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas),
com o apoio dos sindicatos afiliados e de algumas escolas de
Comunicação, entrou com recurso pedindo a suspensão
da liminar, mas a questão até agora tramita nas
instâncias judiciais.
No
entendimento da juíza federal substituta Carla Rister,
que deferiu a sentença, para o exercício do Jornalismo
não se requer "qualificações profissionais
específicas" e o profissional da área deve
ter apenas "formação cultural sólida
e diversificada que se adquire com o hábito da leitura
e pelo próprio exercício profissional".
Uma
outra crítica de alguns defensores da não-regulamentação
toma como base o fato de ela haver surgido no período
da ditadura militar e ungir-se de seus valores, mas Coelho rebate
e diz que estas críticas desconsideram, exatamente, a
motivação política. "Esse
afrouxamento (a partir de 2001) da legislação
já foi suficiente para mostrar o que vai ser se por acaso
a regulamentação desaparecer".
Para
ele, o que existe hoje é um comprometimento da imagem
do jornalista, que deixa de ser um mediador e passa a ser um
vendedor de produtos, com a linguagem da profissão. "Isto
é uma forma de vender a credibilidade do jornalismo por
alguns quilos de carne, algumas garrafas de vinho, alguns livros
ou algumas assessorias". Neste quadro, critica o professor,
"o jornalismo está deixando de ser a atividade principal
dessas pessoas para ser atividade secundária".
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