Notícias
26/07/2003
Quando
as fontes conspiram
Carlos Heitor Cony
Folha de S.Paulo
RIO DE JANEIRO - Desde que o jornalismo encheu a boca com a
palavra "ética", o direito de preservar a fonte
é tido como sagrado, a tábua da lei, a pedra angular
da informação. Na maioria dos casos, a ética
não passa de uma simplificação oportunista
da moral comum.
Temos agora o exemplo de uma fonte que foi preservada pela BBC
e pelo governo inglês, interessado em se aliar aos Estados
Unidos na agressão ao Iraque. O caso acabou num suicídio,
talvez num assassinato.
No episódio, que envolve o primeiro-ministro Tony Blair,
o que menos importa é a veracidade e a importância
da informação. O que conta foi o uso político
e militar que dela se fez. Bem-intencionada ou não, nenhuma
fonte deve ser mantida em segredo. Uma informação,
seja ela qual for, antes de ser assumida pelo jornalista, que
dela se aproveita prometendo resguardar a sua origem, deve ser
assumida prioritariamente pela própria fonte.
De duas uma: ou a fonte diz a verdade ou mente. Ou tem autoridade
para dar a informação, mas não pode se
expor, ou funciona como agente duplo da informação,
dela se beneficiando de algum modo. Se a notícia der
o resultado pretendido pela fonte, ela ganha alguma coisa, pois
foi essa a sua intenção: a de criar um bode para
alguém ou para alguma causa. Se não der bode,
tudo bem, a fonte continua preservada, lucrando com a situação
ou com a pessoa que tentou denunciar ou condenar ao pelourinho.
Colocar a informação, que pode ser verdadeira
ou falsa, acima de qualquer outro valor moral, é ético?
Se a fonte tem a consciência de que a informação
é verdadeira, que não se esconda no sigilo tático,
lucrando seja qual for o resultado da notícia que dá.
Caso contrário, tanto a fonte como o jornalista tornam-se
cúmplices de uma conspiração que, para
dizer o menos, é duvidosa.
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