Nº 8 - Julho 2007 Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ANO V
 
 

Expediente

Vinculada
à Universidade
de São Paulo

 

 

 


 

 

 

 

 

 


MONOGRAFIAS
   

O preço do espetáculo:
A espetacularização da TV no Brasil

Por Samira Moratti Frazão*

Resumo
Qual seria o sucesso que faz com que a televisão seja o meio de comunicação mais popular da sociedade? Os canais de televisão propõem o divertimento e informação, ou promovem a construção de uma realidade, por intermédio do espetáculo? A fim de refletir acerca de tais indagações surgiu este artigo, baseado em obras de jornalistas tais como José Arbex Júnior e Eugênio Bucci, do filósofo Ari Herculano de Souza, bem como a análise do filme "O preço de uma verdade", com a finalidade de discutir alguns pontos acerca da espetacularização da televisão brasileira.

Palavras-chave
[Jornalismo / Televisão / Espetáculo]


Introdução

A comunicação na vida do ser humano foi passo fundamental e decisivo para o desenvolvimento e maturidade de sua racionalidade. Os meios de comunicação, desde a criação da máquina de imprensa, por Gutenberg, até a visão de uma aldeia global, por Marshall McLuhan, e sua literal existência através de cientistas da era high tech, como Bill Gates, fortificam a questão de que sem a comunicação não há sistema organizacional em uma grande empresa e no próprio Estado, tampouco uma vida harmoniosa em sociedade.

Prova desta afirmativa é que a televisão, cada vez mais aperfeiçoada e renovada, é o meio de comunicação mais popular entre a grande massa e a elite. Suas ondas informatizadas chegam aos lares dos ricos e, quase integralmente, entre a camada popular, nas casas das periferias e favelas.

Por ser um veículo de caráter popular, já que tem seu preço reduzido em face de outros meios - perdendo apenas para o rádio que, apesar de não estar mais em sua fase áurea, custa menos que o próprio aparelho de televisão - possui características e qualidades não pertinentes a outros meios.

O rádio, por exemplo, teve sua fase áurea nos meados das décadas de 30 a 50, até o surgimento da TV no Brasil. Seu desprendimento e apego por parte da população se deram, contudo, devido ao fato de que a televisão proporciona a fusão magnetizadora de imagens e som, ao passo que o rádio proporciona apenas o último.

Todavia, a fusão de imagem e som garante o sucesso que o aparelho de TV tem hoje, não só no Brasil, mas também no mundo? Ou há, juntamente com esta premissa, outros pontos que contribuem para o sucesso deste veículo? Outro ponto a ser considerado é que mesmo com o advento das telecomunicações e, com elas, a Internet, a TV continua sendo peça chave na construção e formação de opinião do público em geral. O mesmo tem acesso a jornais, revistas e outros veículos que também garantem entretenimento e informação, mas a TV faz parte da "vida familiar". Uma casa sem televisão não faz parte da normalidade e vida cotidiana das pessoas.

Em face de tais indagações surgiu este artigo, com a finalidade de propor a reflexão e debate dos leitores e público em geral sobre o papel da televisão na vida das pessoas, seu poder de coerção, hipnose e informação, além de sua popularidade, tanto no quesito de informação, quando de entretenimento.

Com base em obras de jornalistas tais como José Arbex Júnior, Eugênio Bucci, o especialista em Ciência da Comunicação, Flávio Calazans, do filósofo Ari Herculano de Souza, bem como a análise do filme "O preço de uma verdade" sobre a história do jornalista americano Stephen Glass, foi elaborado este artigo, com a finalidade de discutir alguns pontos acerca da espetacularização da televisão brasileira como um todo.

Televisão: o magnetismo mágico ou manipulado?

As pessoas, inerentemente, necessitam de informações para saber as medidas que deverão tomar ou como deverão agir. Por exemplo: os paulistanos precisam saber se as vias de acesso às demais regiões da cidade estarão livres ou se haverá congestionamento em determinado horário do dia. Por esta razão, é fundamental ouvirem ou verem um noticiário para saber notícias acerca do fator 'congestionamento de carros' ou mesmo rodízio. O ser humano não precisa, necessariamente, saber somente as notícias, mas também precisa de divertimento e entretenimento, o qual também pode ser obtido através dos meios de comunicação.

A televisão proporciona tanto informação quanto entretenimento, com uma vantagem: une imagens em movimento, muitas vezes em tempo real, somando-se a isso o fator som, para expressar conceitos, informar ou entreter. O rádio, por exemplo, apenas emite som, enquanto que os jornais e revistas possuem imagens e leitura, mas de forma estática, fazendo com que os ouvintes / leitores "imaginem" o que ouvem / lêem para interpretar e compreender a mensagem.

Dessa forma, se estaria desvendando o porquê do magnetismo da televisão na vida das pessoas, já que absorção da mensagem pelo interlocutor é facilitada pelo fator imagens reais e em movimento, e som.

Eugênio Bucci [1] faz uma comparação entre o rádio e a TV, e o poderio do segundo veículo, em seu livro "Sobre ética e imprensa":

"O poder da TV é bem maior que o do rádio, pois este tem uma audiência pulverizada em quase 3 mil emissoras, que em sua maioria não se estruturam em redes nacionais, enquanto a TV tem platéias verdadeiramente nacionais. (...) Priolli [2] lembra também que, de acordo com o Grupo de Mídia de São Paulo, apoiado em pesquisas do instituto Marplan Brasil, 98% da população entre dez e 65 anos via TV pelo menos uma vez por semana e que, sozinha, a TV atraía duas vezes mais público do que todos os meios impressos, aí computados também os livros, além de jornais e revistas".

Os programas exibidos pelos canais abertos da televisão mesclam informação mais distração, em sua maioria. Desde os noticiários aos programas de auditório (de perguntas e respostas até shows musicais) a TV promove sensações e vivências cada vez diferentes aos telespectadores. Apesar de se adaptar com a rotina, o ser humano é atraído pelo diferente, ousado, ou seja, pelo que é espetacular, fora do comum, uma das explicações pelas quais as pessoas gostam de assistir a filmes de terror ou aventura, ou mesmo ver cenas de fatos reais pelo noticiário, envolvendo guerras, violência ou corrupção.

Assim sendo, os canais de televisão existentes - que compõem, sumariamente, uma parcela considerável da grande mídia de massa - almejam diversificar dia após dia o conteúdo repassado aos telespectadores, a fim de manter a audiência desejada, ou seja, fidelizar, permanentemente, o seu público. Para conseguir essa fidelidade, entretanto, somente a diversificação dos programas bastaria ou seria necessário praticar padrões e formas de se obter a audiência, por intermédio da manipulação?

A rejeição de programas educativos

Com a finalidade de se obter audiência, cada vez mais os canais de televisão propõem uma programação voltada para o sensacionalismo, além de incentivar esta prerrogativa na mente das pessoas. Dessa forma, o público preferirá assistir e, conseqüentemente, render audiência a programas nos quais a pauta do dia seja tudo o que é fora do comum, onde se explora o que é "novo", desejado, atraente. Com isso, o onhecimento e as programações voltadas para a formação educativa são esquecidas ou evitadas.

As notícias, bem como a programação focada no entretenimento, que possuem cunho sensacionalista e espetacular, geralmente contêm um teor violento, corrupto (tanto político, quanto financeiro ou sexual), bem como a incitação à sexualidade, etc.

"Segundo a ONG Movimento Internacional pela Paz e não-Violência (Movpaz), as crianças brasileiras assistem, entre os 3 e 10 anos de idade, a 107 mil cenas de violência e mais de 40 mil tiros por ano. No Ceará, chega-se ao cúmulo de 13 horas diárias de programas de 'mundo cão' na TV. É recorde no Brasil". [3]

Neste contexto, toma-se como exemplo a programação infantil, especialmente os desenhos animados. Em sua totalidade, os desenhos que contêm cenas de violência dão maior audiência do que os desenhos puramente educativos. Na criação de tais desenhos violentos, costuma-se empregar as mais variadas formas de mensagens subliminares, seja por texto, imagem ou mesmo cor, a fim de que se haja a "fidelização" do público infantil para com o desenho animado em questão, ou mesmo para que haja o consumo dos produtos que envolvem a marca do programa.

Algo semelhante ocorre com a biomidiologia, descrito por Calazans [4], onde um acidente envolvendo crianças japonesas que assistiam determinado desenho animado estilo "mangá" mostrou que o programa em questão emitiu, em uma determinada parte do capítulo, mais de 50 imagens super coloridas (que seriam as mensagens subliminares) em apenas 5 segundos, o que fez ocasionar a "confusão" no cérebro de tais crianças, ocorrendo os ataques epilépticos, posteriormente. Ao serem hospitalizadas, foi-se detectado a razão dos ataques, já que a maior parte das crianças assistiu ao desenho animado antes de sofrerem à convulsão.

O espetáculo serve para mascarar a realidade

O espetáculo é criado para tentar realizar uma busca para mascarar a realidade do telespectador. São criados moldes alienativos e introduzidos no imaginário popular, incentivando a comercialização de um produto ou marca, além de desviar a atenção do telespectador da realidade. Pode-se relembrar o caso da Copa do Mundo da década de 70, com o apogeu da TV em cores.

Pelé, consagrado "Rei do futebol" serviu também para que fosse concentrada a atenção da população na então mais nova sensação tecnológica (TV em cores) bem como no futebol, fazendo com que estes esquecessem ou não dessem atenção aos atentados cometidos a qualquer civil considerado subversivo, por exemplo.

A "conversão" da realidade em espetáculo acontece de forma constante, indiretamente, com o propósito de que o telespectador não saiba da realidade tal qual ela é. Contudo, fatos já aconteceram nos quais a manipulação / espetacularização da mídia foi desmascarada. Um exemplo, que inclusive virou filme - intitulado "O preço de uma verdade" - foi o caso do jornalista Stephen Glass, articulista da revista americana "The New Republican", um dos mais lidos e prestigiados periódicos.

Em 1998, Glass foi desmascarado pelo jornalista da revista virtual "Forbes", Adam Penenberg, o qual verificou que o artigo "O paraíso Hacker", escrito por Glass, era fruto de sua imaginação. Posteriormente, o editor chefe da revista na qual Glass atuava descobriu que, dos 41 artigos escritos por ele, 27 continham dados irreais. Um fato que lhe custou toda a carreira.

As programações de cunho educativo, cultural ou de conhecimentos gerais perdem espaço na grade midiática dos grandes canais de comunicação para programações, em suma, que evidenciam o entretenimento e a propaganda. Seja nas novelas ou em um reality show, a publicidade de produtos está bastante presente, em detrimento de informações vitais, notícias ou outro fator relevante para o conhecimento do público em geral.

Ivo Lucchesi [5], em artigo escrito para o site "Observatório da Imprensa", analisa justamente o porquê de o público ofertar atenção a um dos reality shows mais famosos no Brasil: O "Big Brother Brasil", transmitido pela "Rede Globo", em sua 7ª edição, bem como às novelas:

"O programa se mantém exatamente porque nada nele há capaz de representar ameaça ao espectador. Levando-se em conta que a história da sociedade brasileira, por trás da máscara da alegria, abriga incertezas (inflação, carências habitacionais) e, principalmente, medo (escravidão, ditadura, desemprego, expansão da violência urbana), somados à fragilidade de uma cultura basicamente midiática, não causa estranheza que famílias se plantem diante de um televisor no qual encontram um formato que, sem dar-lhes nada, nada lhes tira. (...) À circularidade do formato do programa, agrega-se a vacuidade do conteúdo. A fórmula, pois, retira do público, a sensação incômoda tanto das incertezas quanto do medo. As novelas também adquiriram igual perfil. O imaginário brasileiro, há décadas, se alimenta do cotidiano pequeno e imediato".

Telejornais: a notícia descartável

Segundo Arbex Jr. [6], o telenoticiário interfere nos acontecimentos com o intuito de alcançar objetivos políticos ou econômicos, conforme relatou em sua obra intitulada "Showrnalismo: a notícia como espetáculo":

"A televisão (...) não é mera 'observadora' ou 'repórter': tem o poder de interferir nos acontecimentos. O telenoticiário diário adquiriu o estatuto de uma peça política, cuja lógica é determinada pelas relações de cada veículo da mídia com o sistema político, financeiro e econômico do país ou região em que se encontra".

Desta forma, a televisão contribui para contaminar a criticidade do público, impedindo que o telespectador consuma a notícia composta de realidade, para a partir de então fazer suas críticas ou ter uma opinião própria a respeito. Assim não o faz, já que recebe uma opinião pré-formatada do apresentador de telejornal que, na maioria dos casos faz parte do pequeno grupo de formadores de opinião no país. "A mídia cria diariamente a sua própria narrativa e a apresenta aos telespectadores (...) como se essa narrativa fosse a própria história do mundo" [7].

Eugênio Bucci [8] faz uma analogia interessante sobre o telejornalismo e as novelas:

"O noticiário da atualidade constrói pequenas novelas diárias ou semanais cujos protagonistas são tipos da vida real absorvidos por uma narrativa que funciona como se fosse ficção. Programas jornalísticos na televisão desenvolvem-se como se fossem filmes - de ação, de suspense, de romance, de horror. (...) a seqüência dramática do telejornalismo é precisamente melodramática, segue a estrutura das narrativas das telenovelas, que fundaram no público nacional o ato de ver televisão. É esse o estilo brasileiro pelo qual a imagem preside a notícia. O massacre de trabalhadores sem-terra em Eldorado dos Carajás, no interior do Pará, em abril de 1996, só foi a manchete porque veio acompanhado de cenas vibrantes".

O público, na ânsia de ver o "próximo capítulo" do espetáculo da vida "real", assiste diariamente as notícias, refletindo-as muito superficialmente. E, dessa forma, a televisão cria uma atmosfera na qual o público absorve aquilo que os donos dos grandes canais de TV desejam que seja absorvido, como se fosse o real acontecimento dos fatos.

Há uma explicação aparente para a inexistência da consciência crítica, por parte dos telespectadores e público em geral. Segundo Ari Herculano de Souza [9], o indivíduo não consegue desenvolver uma consciência crítica - a qual possibilitaria que ele se "defendesse" das manipulações e modos alienativos pregados pela TV - devido a uma "barreira" ideológica criada por uma pequena parcela da sociedade: os indivíduos de classe alta e o seleto grupo de formadores de opinião. E faz a seguinte afirmação":

"Você já percebeu que, quando uma notícia que relata alguma crise social ou política é apresentada - por exemplo, uma greve -, em seguida se apresenta uma outra notícia que tenha um tom espetacular, de curioso, de fantástico? É que assim, quando não se puder calar diante de uma crise social ou política, ela é apresentada em meias e rápidas palavras, seguidas de notícias que impedem o espectador ou o ouvinte de refletir sobre a crise. Assim, neutralizam-se a difusão e o resultado da notícia dada. Trata-se de uma forma de impedir que o indivíduo tome consciência da realidade concreta".

Para que essa construção de uma outra realidade alcance sucesso, conta-se também com outro fator determinante: o problema da amnésia permanente dos telespectadores e público em geral. Com a disseminação rápida das informações, as notícias são descartáveis, já que a cada minuto há a reformulação da mesma informação ou a presença de uma nova.

Na TV algo semelhante tende a ocorrer no caso dos telejornais, uma vez que as informações são passadas rapidamente e com várias imagens.

Assim sendo, o telespectador não consegue acompanhar com igual rapidez as informações, contribuindo, ainda, para que não haja tempo para que este faça seu ponto de vista ou reflexão a respeito.

Há fatores subliminares que também levam o público a acreditar e desejar assistir a determinados tipos de programações. O apelo à subliminaridade, segundo Flávio Calazans [10], é manipulador, conforme explana em seu livro "Propaganda Subliminar Multimídia" sobre o emprego da subliminaridade em telejornais, por intermédio da superposição de imagens e som de forma rápida:

"A saturação subliminar é resultante da falta de tempo para pensar nas imagens. (...) Esse é o ritmo do videoclipe e até do telejornalismo, cuja força manipuladora reside na rapidez com que é transmitida muita informação diversificada, passando no subtexto, nas entrelinhas, toda uma visão de mundo ou ideologia das agências de notícias que selecionaram o material distribuído".

Logo, com a rapidez da informação e a sua reformulação ou renovação constante, a tendência é que tais notícias sejam consumidas e posteriormente esquecidas pelo público. As novelas e demais programações de entretenimento, além de serem responsáveis pelo empobrecimento cultural - haja vista que em sua maior parte não incentivam a cultura ou educação - também são fator determinante para que haja a constante "amnésia" na mente do público, já que os telejornais têm sua transmissão intercalada com esse tipo de programação.

O público, por conseguinte, é condicionado a se interessar pelo novo, não refletindo se as informações que está consumindo fazem sentido, correspondem com a realidade, ou se o prejudicarão ou beneficiarão em longo prazo. As informações descartáveis, minuto a minuto, são fundamentais para que haja a amnésia, já que o telespectador esquecerá facilmente o que acabou de ver, para prestar atenção no "novo".

Algumas ferramentas para construir uma nova realidade

A construção do imaginário popular e a manutenção da amnésia constante ajudam a potencializar as ferramentas pelas quais as grandes empresas televisivas utilizam para distrair o público, desviando sua atenção dos fatos e mantendo a audiência de determinado programa. No caso das notícias transmitidas pelo telejornal, alguns meios são comumente empregados.

Niceto Blásquez [11] detalhou alguns padrões utilizados pela grande imprensa - especialmente a televisão - para alterar, omitir ou rejeitar a veracidade dos fatos, os quais seguem resumidos abaixo:

  • Via da citação: onde a notícia é passada omitindo detalhes nos quais poderia ser percebida a notícia como um todo e não cortada;
  • Via da reconstrução: na qual a notícia é construída novamente pelo profissional que a manuseia, da forma como este deseja informar os fatos ou como a empresa jornalística em questão assim preferir;
  • Via do comentário: a opinião do jornalista (apresentador, comentarista, articulista) é levada em consideração, sobre o fato exposto;
  • Via da ocultação: na qual um fato de grande relevância é exposto apenas com uma versão dos fatos;
  • Via de mudança: a qual discute que o silêncio e a mudança têm seus efeitos comparados á censura;
  • Via do silêncio: também chamada "Dissertização audiovisual" ocorre quando o silêncio, ou seja, a omissão dos fatos se dá intencionalmente, seja por interesses ideológicos, funcionais, dogmáticos ou políticos.

Os grandes canais de comunicação utilizam alguns desses meios, com o intuito de construir a "realidade" que lhes convêm, repassando esta nova realidade ao público. Arbex Júnior [12] retrata tal afirmativa em uma passagem do seu livro:

"A mídia cria diariamente a sua própria narrativa e a apresenta aos telespectadores (...) como se essa narrativa fosse a própria história do mundo. Os telespectadores, embalados pelo 'estado hipnótico' diante da tela de televisão, acreditam que aquilo que vêem é o mundo em estado 'natural', é 'o' próprio mundo".

A criticidade é a solução?

A criticidade do público e, posteriormente, o domínio da mente crítica em lugar da alienada seria uma solução para que os telespectadores não se deixassem influenciar pela TV? Segundo Arbex Júnior [13]:

"O leitor pode 'garimpar' a 'verdade da notícia' mediante a confrontação da versão construída por determinado veículo, com a versão apresentada por outros veículos de comunicação e com seus próprios conhecimentos e convicções. Mas esse processo só será eficaz se mantiver no horizonte a idéia do trabalho jornalístico sempre como o resultado de uma rede extremamente complexa de interesses (...)".

Pois, apesar do poder que a televisão possui, "... não é verdade que ela sempre consiga impor livremente qualquer versão dos fatos" [14]. Poder-se-ia, então, afirmar que com a criticidade do público em geral, as liberdades de informação e expressão, bem como de escolha, se fariam concretas, já que se estaria desenvolvendo uma própria opinião, em detrimento das pré-formatadas que a televisão fornece, seja pelo articulista do jornal, seu apresentador ou intelectuais da mídia em geral.

Tal medida significaria, portanto, assistir ao espetáculo, sem se deixar envolver pela manipulação que há por detrás da mensagem. Ao passo que a TV lhe proporciona mensagens com imagens, que mecham com a emoção, o telespectador terá senso crítico para deduzir e afirmar se tal mensagem é válida ou não.

O radicalismo de deixar de assistir determinados programas de TV, contudo, não seria a solução desse problema. Tampouco as grandes organizações, detentoras de canais de TV irão mudar suas ideologias e perder seu "poder". Há que se considerar, ainda, que não somente a TV proporciona o espetáculo, mas outros veículos de comunicação também podem proporcioná-lo. A TV é enfatizada aqui, haja vista que tem maior popularidade entre a sociedade.

A possibilidade aparente seria, então, cultivar o próprio ponto de vista acerca das informações consumidas, assim como consumir informações de outros canais de TV e veículos de comunicação (como jornais, revistas, Internet e rádio) para tirar as suas próprias conclusões a respeito da notícia.

Esta deveria ser a idéia propagada pelos meios de comunicação - e, inclusive, são poucos que assim o fazem, raras vezes - e não a construção de um espetáculo alienador e sensacionalista, no qual a platéia, que são os telespectadores, a tudo vê impassível e a tudo aplaude, sem romper limites.

Notas

[1] BUCCI, Eugenio. Sobre Ética e Imprensa. (2000, p. 139).

[2] PRIOLLI, Gabriel. Apud BUCCI, Eugenio. Op. Cit., p.139.

[3] GIRÃO, L. E. Apud: PASCHOAL, Engel. "Cultura da violência ou da paz? Você decide". (2007, p. 36).

[4] CALAZANS, Flávio. Propaganda Subliminar Multimídia. (2006, p. 185-194).

[5] LUCCHESI, Ivo. "Os reality shows e o país das continhas". (2007).

[6] ARBEX JR., José. Showrnalismo: a notícia como espetáculo. (2001, p. 98).

[7] Ibidem. (2001, p. 103).

[8] BUCCI, Eugenio. Op. Cit., p. 142-143.

[9] SOUZA, Ari Herculano de. Ideologia. (s.d.).

[10] CALAZANS, Flávio. Propaganda subliminar multimídia. (2006, p.49).

[11] VILCHES, Lorenzo. Apud: BLÁSQUEZ, Niceto. Ética e meios de comunicação. (1999, p. 501-505).

[12] ARBEX JR., José. Op. Cit., p.103.

[13] Ibidem (2001, p. 136).

[14] Ibidem (2001, p. 136).

Fonte audiovisual

"O Preço de uma Verdade" (Shattered Glass, EUA, 2003). Direção: Billy Ray. Produção: Baumgarten Merims. Elenco: Hayden Christensen, Peter Sarsgaard, Chloë Sevigny, Steve Zahn. Lions Gate Films, DVD, 93 min., NTSC Dolby Digital 2.0.

Referências bibliográficas

ARBEX JR., J. Showrnalismo: a notícia como espetáculo. São Paulo: Casa Amarela, 2001.

BLÁSQUEZ, N. Ética e meios de comunicação. São Paulo: Paulinas, 1999.

CALAZANS, F. Propaganda subliminar multimídia. São Paulo: Summus, 2006. (Novas buscas em comunicação; Vol. 42). 7ª ed.

GIRÃO, L. E. Apud: PASCHOAL, E. "Cultura da violência ou da paz? Você decide". A Tribuna. Vitória, 25mar.2007. Economia, p. 36.

LUCCHESI, I. "Os reality shows e o país das continhas". Observatório da Imprensa. Disponível em: <http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=422TVQ
001
>. Acesso em: 01mar2007.

SOUZA, A. H. "As formas de consciência e a ideologia". In: Ideologia. [s.n.t.].

*Samira Moratti Frazão é graduanda do curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pelo Centro Universitário São Camilo/ES. E-mail: samiramoratti@gmail.com.

Voltar.


®Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro [ISSN 1806-2776]