Nº 10 - Jul. 2008
Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ANO V
 

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MONOGRAFIAS
 

O cidadão jornalista

Por Camila Cardozo Arocha*

RESUMO

O objetivo do presente texto foi explicitar as interações sociais na redação do jornal Correio de Gravataí.

Reprodução


Foram utilizados autores como Darnton, Goffman, Simmel entre outros para tentar compreender o perfil do profissional, bem como seus hábitos profissionais. As observações realizadas por três meses e as leituras evidenciaram o jornalista é uma pessoa como as outras. Auto-estima, orgulho, objetivos, prazeres, desprazeres.

Elementos que se misturam nestes profissionais e em quaisquer que sejam analisados. Desmistificando a profissão, trazendo para o mundo real, para vida cotidiana, este profissional que muitas vezes é visto como um super-herói.

PALAVRAS-CHAVE: Jornalistas / Hábitos Profissionais / Sociabilidade

Auto-definindo-se como escravos dos fatos, os jornalistas sustentam implicitamente a tese de que a verdade independe de qualquer relato, prevalece absoluta, atinge a sua realidade a todo instante. Nessa reflexão, a verdade é autônoma de qualquer processo de observação, verificação e posterior relato, jornalístico ou não. Esses são meros sinais do seu ser, que em nada participam da realidade absoluta e incontestável dos fatos (Cf. Barros Filho & Sá Martino, 2003, p.108).

1. Introdução

O jornalista assume hoje um imprescindível papel de mediação, garantindo a constituição de um sentido comum para a experiência e a coesão social pela influência marcante que exerce na vida cotidiana, na organização e produção de conhecimentos, na gestão dos conflitos e na elaboração dos conteúdos éticos que configuram a prática social. A hipótese que trago como tema deste artigo é a de que uma observação atenta de um grupo de jornalistas trabalhando, desmistifica a profissão, trazendo para o mundo real, para vida cotidiana, este profissional que muitas vezes é visto como um super-herói.

Neste texto proponho uma reflexão sobre os hábitos cotidianos na redação do jornal Correio de Gravataí, composta por oito homens, ou seja, um universo de profissionais do sexo masculino. O esforço para compreender como os jornalistas trabalham a sua identidade e como se sociabilizam fará parte da minha dissertação de Mestrado em Comunicação que investiga o Leitor imaginado dos jornalistas.

No prefácio do livro “A representação do Eu na vida cotidiana” o autor afirma que seu trabalho é “uma perspectiva sociológica a partir da qual é possível estudar a vida social, principalmente aquela que é organizada dentro dos limites físicos de um prédio ou uma fábrica”. Diz ainda: “Descreverei uma série de aspectos que formam, juntos, um quadro de referência aplicável a qualquer estabelecimento social concreto, seja ele doméstico, industrial ou comercial” (Cf. Goffman, 1985, p. 9). Sob a ótica do que nos traz Goffman, pretendo compreender o cotidiano deste ambiente.

Uma boa descrição sobre a sociologia dentro das redações e, conseqüentemente, dos hábitos dos jornalistas, foi feita por Darnton (1990) em “Jornalismo: toda notícia que couber, a gente publica”, do livro “O Beijo de Lamourette”. O autor trata da tendência da estereotipagem do jornalista que no imaginário de quem desconhece os bastidores da profissão muitas vezes é construída a imagem do jornalista como mediador neutro, distante (e superior).

Segundo Moretzsohn (2002), sob o discurso da objetividade, o jornalista aparenta o que não é (alguém que influencia os próprios acontecimentos) e assegura seu lugar como autoridade independente, capaz de fiscalizar os atos do governo perante a sociedade.

Goffman nos coloca diante da realidade quando fala sobre a arte de manipular a impressão “Atributos necessários a um ator para o trabalho de representar, com sucesso, um personagem” (Cf. 1985, p. 191) no caso desde artigo, o jornalista. Segundo Marcondes Filho “O jornalismo é uma profissão ambígua e de difícil definição. Sob o seu nome se manifestam uma multiplicidade de funções, meios e formas discursivas distintas. “Por isso, jamais a categorização do ou da jornalista dirá muita coisa sobre a profissão, suas mudanças e dilemas'' (Cf. 2000, p. 53).

Nós (jornalistas) somos prisioneiros de sistemas de valores adquiridos. Os nossos atos são influenciados, quando não determinados, por nossa maneira própria de ver, sentir e reagir à ação dos agentes externos. O ser humano vê o mundo por meio de uma espécie de filtro e com base nessa apreciação constrói a sua realidade (Cf. Amaral, 1996, p. 18).

2. Metodologia

A observação referente às rotinas e práticas profissionais foi realizada ao longo de três meses em visitas aleatórias, sem prévio aviso. O grupo mostrou estar à vontade na presença da pesquisadora. Por isso era viável ficar por horas na redação, acompanhar as pautas e participar dos encontros nos bares sem nenhum constrangimento. A todo o momento ocorreram conversas informais, com perguntas descritivas bem amplas e gerais que, na verdade, tinham o objetivo de criar um ambiente amistoso entre nós e contextualizar o cenário do estudo. – A sala de redação.

Tentei ao máximo agir como observadora e não como colega de profissão. Muito mais ouvindo do que falando. Foram muitas as observações pessoais, que para este artigo não são relevantes, mas sem dúvida observar a rotina profissional de um grupo de jornalistas homens foi uma experiência no mínimo curiosa.

Se a observação fosse comparada com um grupo de jornalistas mulheres, encontraria sem dúvida diferenças no cotidiano profissional. Optei por realizar um estudo etnográfico porque compreendo que seja o método mais eficiente para entender a complexidade do processo de trabalho dos jornalistas, considerando que a descrição do cenário e dos hábitos é parte fundamental para compreensão das práticas profissionais.

3. O jornal e os jornalistas

O Correio de Gravataí é um jornal pequeno, com 24 anos de história. Tem uma tiragem com cerca de cinco mil exemplares diários distribuídos somente na cidade de Gravataí de terça a sábado. A redação funciona em situação precária, não tem mesas e cadeiras adequadas para os profissionais e a sala onde eles ficam tem um ar condicionado que não funciona direito. Muitas vezes precisam pegar o ventilador da cozinha emprestado para suportarem o calor que vem da gráfica situada na sala ao lado. Para os oito jornalistas existem quatro máquinas fotográficas e dois carros.

Para sanar a falta de veículos para as saídas, os jornalistas precisam negociar com a equipe comercial do jornal para se deslocarem juntos. Os repórteres, para as pautas e os vendedores para visitarem os clientes. A equipe é composta da seguinte maneira: um editor, um repórter policial, um jornalista responsável pela editoria de política, um para Meio Ambiente e Geral, um voltado para a editoria chamada Comunidade e ainda o repórter de esportes, além de dois jornalistas que fazem cadernos especiais, por exemplo, Vida&Saúde, Veículos, Mulher&Cia. A “vida secreta” como descreve Goffman não pode ser revelada.

Por exemplo, a abertura dos bastidores da redação frente ao público leitor descredenciaria a imagem do profissional. Goffman (Cf. 1985, p.192) fala que “(...) o curso habitual das atividades de determinado ator contêm tipicamente alguns fatos que, se fossem introduzidos durante a representação, desacreditariam ou, no mínimo, enfraqueceriam as pretensões relativas a sua personalidade”, por exemplo, os jornalistas não podem revelar os “segredos internos de equipe” (falta de veículos, instalações inadequadas e quantidade reduzida de jornalistas para cobertura de muitas pautas) às suas fontes, entrevistados e leitores, pois passariam por constrangimentos.

Sobre isso Goffman (p. 76) afirma ainda “o mais importante de tudo, porém, é que comumente verificamos que a definição da situação projetada por um determinado participante é parte integral de uma projeção alimentada e mantida pela íntima cooperação de mais de um participante”.

No grupo analisado foi possível verificar que todos os jornalistas trabalham mais do que 40 horas semanais, em alguns casos chegam a trabalhar 55 horas. Não faltam ao trabalho, não tem horário para ir embora.

Darnton (Cf. 1990, p. 72) traça um mapa hierárquico a partir da posição da mesa de cada um. “Dos lugares mais afastados, ocupados por jovens repórteres, passando por veteranos frustrados porque não chegaram à chefia das editorias, depois redatores e preparadores de textos, mais adiante sumidades e nomes intocáveis do jornalismo, chegando aos chefes de editorias, até o editor-chefe”. No correio de Gravataí o editor senta-se atrás de todos os repórteres, ou seja, tem a visão do todo. A atmosfera de vigilância se dissemina pela redação.

A sala destinada à redação do jornal é de frente para a sala ocupada pelo setor comercial da empresa. Sua organização é a seguinte: todas as mesas da redação são viradas para a sala em frente (que não tem parede), ou seja, os jornalistas trabalham enfileirados. Sua visão frontal é a dos colegas do outro departamento.

Por mais que as condições financeiras do jornal sejam escassas, é possível observar que os jornalistas não gostam de andar na rua. Acompanhei o editor questionando os repórteres sobre o porquê não vão até os locais quando tem carro disponível. O jornal tem um horário para ser impresso, portanto o repórter deve ser capaz de redigir suas páginas dentro do horário estipulado para o fechamento.

Não cumprir o prazo de fechamento da redação é inviável, porém eles não colaboram com os colegas, cada um tem a sua parcela de responsabilidade e faltar com isso gera a perda de créditos no ambiente de trabalho. “Num oficio em que a luta contra o tempo é regra de sobrevivência, qualquer princípio e economia de ação, isso é, de tempo de execução, é bem vindo” (Cf. Barros Filho & Sá Martino, 2003, p. 111). Os repórteres de quase todas as editorias fazem tudo que é possível por telefone, entrevistas, coleta de dados sobre acidentes de trânsito e, na maioria das vezes, relatam as matérias como se estivessem nestes locais.

Ao mesmo tempo em que é estressante cumprir prazos, o fetiche pela velocidade aflorado nos jornalistas, muitas vezes compromete a veracidade dos fatos relatados. O único jornalista que não tem essa dinâmica de trabalho é o repórter de Comunidade que passa quase o tempo todo na rua, entrevistando e colhendo informações.

Dos seus lugares, digitando o tempo todo, discutem os títulos das matérias, falam sem se olhar. Cada um fala o que acha sobre a sugestão do editor que é quem bate o martelo na decisão. Não existe reunião de pauta, toda a comunicação entre eles é feita em tom informal. Reclamações de leitores e de colegas de trabalho são tratadas diretamente entre o editor e o repórter em frente ao jornal, enquanto fumam ou tomam um café, nada de reuniões a portas fechadas.

Os leitores, não são bem vindos por todos os jornalistas. Em geral eles não sabem como recebê-los e tratá-los. Muitas vezes os telefones tocam até que o leitor desista, ninguém atende. Quando atendem, não fazem questão de prestar um bom trabalho, são educados, mas se o leitor quer uma informação sobre esportes, por mais que o jornalista saiba do que se trata, não responde, passa ao repórter de esporte.

Segundo Goffman (Cf. 1985, p. 201), “O ator prudente tentará selecionar a espécie de platéia que cause o mínimo de dificuldades, em termos do espetáculo que deseja encenar do espetáculo que não deseja ter que representar”. Quando o leitor aparece na redação sem avisar, se comportam de forma tímida. Muitas vezes não querem atender por não se acharem em condições. Parece que têm medo do contato.

A expressividade do indivíduo (E, por tanto, sua capacidade de dar impressão) parece envolver duas espécies radicalmente diferentes de atividades significativa: a expressão que ele transmite e a impressão que ele emite” A primeira abrange os símbolos verbais, (...) que ele usa propositalmente e tão só para veicular a informação que ele e os outros sabem estar ligada a esses símbolos. Esta é a comunicação no sentido tradicional e estrito. A segunda  inclui uma ampla gama de ações, que os outros podem considerar sintomática do ator, deduzindo-se que a ação foi levada a efeito por razões diferentes da informação assim transmitida (Cf. Goffman, 1985, p. 12).

A importância do jogo de cena para evitar constrangimentos ficou claro quando um dos repórteres teve uma crise de estresse dentro da redação. Neste tipo de relação, a profissional, para que não se arque com os constrangimentos e para manter a fachada não se questiona o comportamento do outro, pois entre as equipes de trabalho existem regras e uma delas segundo Goffman (Cf. 1985, p. 13):

Independentemente do objetivo particular que o individuo tenha em mente ou da razão desse objetivo, será do interesse dele regular a conduta dos outros, principalmente a maneira como o tratam. Este controle é realizado principalmente através da influência sobre a definição da situação que os outros venham a formular.

O repórter quebrou um telefone e no meio da crise rolou no chão e começou a chorar. Diante dos fatos e para não constranger ainda mais o colega, os demais preferiram agir normalmente. Ninguém tocou no assunto dias depois, quando o colega voltou a trabalhar, nem mesmo na sua ausência esse assunto era mencionado. A vida das pessoas numa certa sociedade é sustentar a fachada.

Goffman (1985) ressalta que quando a definição aceita da situação é desacreditada, alguns (ou todos) atores podem fingir que nada mudou caso acreditem que isso é lucrativo ou manterá a ordem no ambiente. Neste caso os colegas preferiram fingir que não houve nada e, com isso, ajudaram a manter a fachada. O autor declara ainda que esse tipo de atitude acontece em todos os níveis da organização social, dos mais pobres às elites.

3.1. Postura profissional

Os jornalistas vão chegando para trabalhar conforme o horário das suas pautas. Não se tem um horário rígido para a chegada, assim como também não têm horário para saírem. Os primeiros a chegarem pegam o jornal do dia e vão tomar café, lêem as matérias já publicadas dos colegas, fazem anotações e críticas. Em geral as criticas são sérias e duras, não se faz piadas sobre os erros ou enganos.

Ninguém ri ou faz comentários maldosos sobre o trabalho do colega, talvez porque saiba que se o fizer, também farão para ele. “O jornalismo é pródigo em autocríticas e indicações de procedimentos na mesma medida em que se protege de ataques e críticas externas” (Cf. Barros Filho & Sá Martino, 2003, p. 112). “O repórter escreve para o chefe de reportagem. (...) Esta é a verdade mecânica” (Cf. Dines, 1974, p. 44).

Uma vez que é fato o jornalista escrever para outro colega ler, levanta-se uma questão básica: para quem o jornal é produzido? Esta situação paradoxal se dá diariamente nas redações jornalísticas. Enquanto o jornal comercialmente é produzido para os leitores consumirem, as notícias são escritas pelos jornalistas para que os redatores, que também são jornalistas, leiam e aprovem, para que daí então seus textos sejam publicados (Dines, 1974).

O pessoal da redação geralmente almoça junto e é neste momento que os assuntos referentes à vida particular vão surgindo. Comentam sobre suas famílias, suas bandas de rock, times de futebol, este último assunto recorrente. No final do dia, geralmente na sexta-feira, se reúnem num bar próximo à redação para tomar vinho. Goffman (Cf. 1985, p. 195) fala sobre a realidade dramatúrgica: “é evidente que se uma equipe quiser manter a linha da ação que tomou, os companheiros de equipe devem agir como se tivessem aceitado certas obrigações morais “Não devem trair segredos da equipe nos intervalos das representações – quer por interesse pessoal, por princípios ou falta de discrição”.

O habitus, portanto, é o princípio “gerador e regulador” das práticas cotidianas, definindo, em sua atuação conjunta com contextos no qual está inserida, reação aparentemente espontânea do sujeito. Uma determinada prática social é produzida a partir da relação entre a estrutura objetiva definidora das condições sociais de produção do habitus e as condições nas quais ele pode operar, ou seja, na conjuntura em que está inserindo (Cf. Barros Filho; Sá Martino, 2003, p. 116).

4. Sociabilidade na redação

A única discussão que divide o grupo é o futebol. Eles têm um quadro branco – tipo de sala de aula – neste, sempre tem resultados dos times de futebol, piadas, charges, bandeiras, vez do grêmio, vez do inter. Os jornalistas têm como hábito assistirem aos jogos de futebol na redação (não importa o horário), e nesse momento entra em jogo a sociabilidade.

O interesse em assistir juntos não tem relação com a vida profissional. No horário do jogo discutem futebol e é o único momento que interagem socialmente com outro setor - a gráfica. “O jogo é mais do que um fenômeno fisiológico ou um reflexo psicológico.

Ultrapassa os limites da atividade puramente física ou biológica. É uma função significante, isto é, encerra um determinado sentido. No jogo existe alguma coisa 'em jogo' que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa” (Cf. Huizinga, 1971, p. 4). Todos assistem aos jogos na redação e falam de igual para igual.

A própria sociedade, em geral, significa a interação entre  indivíduos. Essa interação surge sempre a partir de determinados impulsos ou da busca de certas finalidades. (...) objetivos de defesa, ataque, jogos, conquista (...) inúmeros outros fazem com que o ser humano entre, como os outros, em uma relação de convívio, de atuação como referência ao outro (...) Essas interações significam que os portadores individuais daqueles impulsos e finalidades formam uma unidade – mais exatamente, uma sociedade (Cf. Simmel, p. 60).

O momento de se assistir os jogos de futebol, para a redação do Correio de Gravataí, onde os jornalistas se sentem em casa, somente eles e o pessoal da gráfica, é o instante da sociabilização: “estando no mundo da sociabilidade, o único em que é possível haver uma democracia sem atritos entre iguais, é um mundo artificial, construído a partir de seres que desejam produzir exclusivamente entre si mesmos essa interação pura que não seja desequilibrada por nenhuma tensão material” (Cf. Simmel, p. 70). Neste momento se esquece o calor que vem da gráfica, não é um problema a porta estar aberta.

Assim, considero importante destacar que o universo simbólico do futebol supera largamente os fatos sociais ocorridos nos estádios, no campo e nas arquibancadas, mas que se espraia pelas páginas dos jornais todos os dias, que ocupa horas de programação e canais inteiros de rádio e televisão e – muito além dos 90 minutos do jogo – manifesta-se nas interações sociais cotidianas, na sociabilidade descomprometida que, alinhando o “outro” – qualquer outro – a um dos “lados”, oferece possibilidade de interação, solidária ou jocosa, amenizando a dureza das relações “sérias”, profissionais, legais ou familiares: fenômeno instigante e que demanda compreensão (Cf. Gastaldo, 2006, p. 14).

Como dito anteriormente, a redação do jornal é exclusivamente masculina. Nada mais natural, então, que o futebol surja como elemento sociabilizador, uma vez que este esporte ainda é essencialmente masculino.

Pelas características desta modalidade de interação – pelo menos no caso brasileiro –, um novo termo pode ser adscrito a esta problemática: o papel de gênero masculino. Embora tenha havido nos últimos anos um notável crescimento da participação feminina no universo futebolístico (manifesto não só na audiência midiática e nos estádios, mas mesmo dentro de campo, como no sucesso internacional conquistado pela seleção brasileira de futebol feminino), o mundo do futebol no Brasil continua ainda a ser hegemonicamente um território masculino (Cf. Gastaldo, 2006, p. 3).

5. Conclusão

Há muitas "descobertas" feitas nessa observação – situações vividas diariamente pelos profissionais que se amoldam individualmente ao que não é considerado comum para uma pesquisadora. O mais preocupante é o indicador de que a falta de estrutura para exercer o trabalho, as precárias instalações, linhas telefônicas com problemas de funcionamento, e a cultura organizacional trouxeram, como efeito colateral danoso, não apenas a corrosão de certos valores básicos, mas, principalmente, a cisão da idéia de qualidade de vida e excelência no trabalho.

Eles não se importam com a sua saúde. Sentem dores nas costas, tendinites, acumulam problemas respiratórios, mas seguem trabalhando sem questionar a situação do jornal, pois acreditam no crescimento da empresa.

A hipótese apresentada como tema deste texto, de que uma observação atenta desmistificaria a profissão, se concretizou. O jornalista é uma pessoa como as outras. Auto-estima, orgulho, objetivos, prazeres, desprazeres. Elementos que se misturam nestes profissionais e em quaisquer que sejam analisados.

Barros Filho e Sá Martino (Cf. 2003, p. 116) afirmaram: “não há conflitos para o jornalista que não existam também para o cidadão, visto dessa maneira, o jornalista não teria conflitos inerentes à profissão, mas teria o tempo todo aos mesmos dilemas éticos de qualquer pessoa”.

Os autores ainda citam Bucci que complementa: “o jornalista não está autorizado a fazer nada que o cidadão não esteja autorizado a fazer. O jornalista não está acima do cidadão, isto é fundamental”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL, L. A objetividade jornalística. Porto Alegre: Sagra D. C. Luzatto, 1996.

BARROS FILHO, C.; SÁ MARTINO, L. M. O habitus na comunicação. São Paulo: Paulus, 2003.

DARNTON, R. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e revolução, São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

DINES, A. O papel do jornal – tendências da comunicação e do jornalismo no mundo em crise. Rio de Janeiro: Artinova, 1974. 1ª ed.

GASTALDO, É. "Futebol e sociabilidade: apontamentos sobre as relações jocosas futebolísticas”. In: Esporte e Sociedade, n° 3, São Leopoldo, jul. 2006-out. 2006. Disponível em: http://www.lazer.eefd.ufrj.br/espsoc.

GOFFMAN, E. A representação do Eu na vida cotidiana. Petrópolis: Vozes, 1985. 4ª ed.

HUIZINGA, J. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 1971.

MORETSZHON, S. Jornalismo em "tempo real" - o fetiche da velocidade. Rio de Janeiro: Revan, 2002.

SIMMEL, G. Questões Fundamentais de Sociologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

*Camila Cardozo Arocha é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo/RS.


Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro [ISSN 1806-2776]