Manchetes
Novas
páginas de
uma vida de combate
Por
Fred Ghedini*
Apresentação
de Páginas de resistência - a imprensa comunista
até o golpe militar de 1964, de Francisco Ribeiro do
Nascimento, 212 pp., Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, São Paulo, 2004; com título original "Novas
páginas de uma vida de resistência".
(www.imprensaoficial.com.br/livraria)
Aos
76 anos, Francisco Ribeiro do Nascimento resolve acrescentar
mais um fruto a tantos outros que soube plantar e cultivar ao
longo de uma vida dedicada à militância e às
causas humanísticas: o resultado dessa pesquisa sobre
a imprensa comunista no Brasil, particularmente sobre o jornal
Tribuna do Pará.
No
Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São
Paulo, onde o conhecemos por sua participação
na direção da regional de Santos, Seo Chiquinho
- como é carinhosamente chamado pelos colegas - é
uma presença constante desde 1982. "O Sindicato
é como se fosse a extensão da minha casa",
diz Seo Chiquinho. E é aqui no Sindicato que o colega
de diretoria vem me pedir para fazer a apresentação
do seu trabalho.
Fosse
pelos conhecimentos da matéria - a história da
imprensa comunista no país - eu não poderia aceitar
a tarefa. Mas, para escrever sobre a presença desse militante
digno entre nós, e da riqueza que contém uma vida
dedicada à luta por uma Nação brasileira
livre e soberana, sobre isso, sim, posso escrever.
Além
da postura sempre calma e afetuosa para com os companheiros,
Seo Chiquinho tem outros traços que o distinguem: nasceu
na Ilha de Marajó, no Pará (afinal, bem pouca
gente teve esse privilégio); criou 10 filhos com a mesma
companheira, e nunca deixou de ter coerência política.
"Sempre estive com as esquerdas", diz. Mesmo o fato
de ter deixado o Partido Comunista Brasileiro, o Partidão,
em 1983, depois de 38 anos de militância, não abalou
suas convicções. "Sofri muito antes de tomar
a decisão. Passei noites e noites em claro, pois o Partido
havia sido minha verdadeira Universidade", conta Seo Chiquinho,
acrescentando: "Foi lá que me formei humanisticamente".
Seo Chiquinho entrou para o jornalismo em 1954, na própria
Tribuna do Pará, agora seu objeto do estudo. Ficou quatro
anos, até 58, quando assumiu a direção
do jornal.
Infelizmente,
não ocupou por muito tempo o cargo de diretor, pois foi
nesse mesmo ano que a Tribuna do Pará deixou de circular,
"por problemas financeiros, como tantos outros veículos
da imprensa popular", esclarece o autor.
Fico
pensando na riqueza de uma vida como a do Seo Chiquinho, que
passou por todos esses momentos da história do País
e da própria militância de esquerda. Por momentos
tão significativos como o ano de 1945, da redemocratização,
quando Seo Chiquinho, estudante do segundo grau, se interessou
pela política e entrou no PCB então legalizado,
com 18 anos de idade. Ou em 1954, quando era técnico
laboratorista e foi preso em Parintins, no Amazonas, quando
liderava uma manifestação pelo aniversário
de Prestes.
Ou
em 1964, após o golpe militar, quando ficou seis meses
clandestino, para fugir de nova prisão, em Belém
do Pará.
Uma militância que veio até os dias de hoje, quando
o sentido da própria militância encontra-se em
xeque. Pois vivemos tempos em que os indivíduos se enclausuram
em seus objetivos e desejos particulares de vida.
Com
uma trajetória tão longa e plena de tantos desafios,
emociona testemunhar a continuação dessa coerência.
Se
a Universidade foi a militância no PCB, Seo Chiquinho
continua essa trajetória peculiar e se transforma em
pesquisador por vontade própria e por amor à história.
Graças à obstinação de sempre e
à solidariedade dos colegas, Seo Chiquinho traz à
luz sua obra, procurando revelar aos jovens a existência
de uma imprensa que tinha outra razão de ser que não
os mecanismos do mercado. Que era veículo das grandes
lutas formadoras da consciência da nacionalidade, de soberania
nacional e tantos outros conceitos que ajudaram a soldar esse
formidável e discrepante país em que vivemos.
Uma luta brutalmente interrompida em sua vertente democrática
pela ditadura militar, instalada no país em 1964, cujo
legado nos esforçamos agora para suplantar.
O
trabalho de pesquisa que resultou neste volume é, sem
dúvida, mais um momento de superação do
obscurantismo que a direita golpista e os militares, respaldados
pelos sempre presentes interesses dos Estados Unidos no Continente,
tentaram impor indefinidamente ao País. Eles não
conseguiram. Aqui estão duas provas: essas Páginas
de Resistência e os 76 anos de resistência do seu
autor, Francisco Ribeiro do Nascimento.
*Fred
Ghedini é Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais
no Estado de São Paulo - Observatório da Imprensa
Fonte:
Observatório da Imprensa, 16.03.2004
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