Nº 8 - Julho 2007 Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ANO V
 
 

Expediente

Vinculada
à Universidade
de São Paulo

 

 

 


 

 

 

 

 

 


ENSAIOS
  Direito humano à comunicação:
Perspectivas para a democratização da mídia no Brasil

Por Ramon Bezerra Costa*

Resumo
O presente trabalho aborda o direito humano à comunicação, tratando-o como base para a defesa da democratização da mídia, tema este, essencial para a concretização de uma sociedade democrática devido à centralidade dos meios de comunicação. A partir da análise histórica do direito humano à comunicação e das bases legais que o fundamentam, apresenta a comunicação como um bem público e mostra que esta noção é mais abrangente que a de liberdade de expressão e a de direito à informação, sendo uma conjunção dos dois últimos. O lugar de destaque ocupado pela mídia, o monopólio dos meios de comunicação e a utilização mercantil destes são apontados, no texto, para mostrar a importância da democratização da comunicação, como um processo necessário para potencializar a diversidade do país e para realização de direitos. Por fim, são discutidas as formas e caminhos para a democratização da mídia, bem como alguns dos atores envolvidos nesta defesa. O trabalho é resultado de pesquisa bibliográfica que reuniu e analisou informações e dados objetivando fundamentar a busca e a importância da democratização das comunicações no Brasil.

Palavras-chave
[Diretos Humanos / Comunicação / Mídia / Democratização]


Pensar em direito à comunicação é refletir sobre a própria existência humana. Segundo Michael Traber [1], apesar de nos considerarmos como seres individuais, nossa personalidade, ou seja, o que realmente somos, é construído socialmente. A nossa vida, segundo ele, se distingue de qualquer outra por ser essencialmente orientada para os outros.

Assim, se nossa vida social acontece na comunicação, esta se torna uma necessidade humana básica, indispensável para a existência do indivíduo e essencial para o desenvolvimento e a manutenção da vida em sociedade.

Por isso, a comunicação deve ser reconhecida como um direito humano, ao lado dos já consagrados - ainda que não efetivados - direito à moradia, à alimentação, à saúde, à educação, entre outros.

No período de formação da sociedade moderna, isto é, no momento em que tem início a superação dos antigos padrões absolutistas, a imprensa começa a ganhar importância e a luta pela efetivação da liberdade de expressão ganha força. Neste momento, a defesa da liberdade de expressão, significa, além da garantia de direitos individuais, legitimar uma categoria profissional que desejam publicizar suas opiniões e análises da sociedade, ou seja, a luta pela liberdade de imprensa, para que dessa forma, "os profissionais da palavra" possam se expressar livremente em nome do interesse público e da liberdade coletiva.

Dessa forma, a liberdade de expressão individual ganha uma validação social, tendo, na liberdade de imprensa dos profissionais da comunicação a sua concretização. Este período, de grande ebulição na defesa da livre expressão e da livre imprensa, gera uma enorme contradição: a liberdade de expressão individual se efetivaria por meio da liberdade de imprensa, que por sua vez pressupõe uma "liberdade de empresa".

Dito de outra forma: a liberdade de imprensa depende dos meios pelos quais se expressará, assim estará submetida às normas e regras da empresa de comunicação privada, ou seja, a lógica econômico-industrial.

O direito humano à comunicação

"A liberdade de imprensa de uma sociedade burguesa consiste na liberdade dos ricos para fraudar, desmoralizar, ridicularizar sistemática e incessantemente as massas exploradas e oprimidas do povo: os pobres" (Lênin).

Devido à defesa da liberdade de expressão, esta foi contemplada em diversos acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário: Declaração Universal dos Direitos Humanos, Tratado Internacional de Chapultepec, Declaração Americana sobre Direitos Humanos, Carta Democrática Interamericana e Declaração de Princípios sobre a Liberdade de Expressão.

Além desses, a base da organização democrática brasileira, a Constituição de 1988, também fundamenta a liberdade de expressão em vários pontos: o capítulo Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, inciso IV do artigo 5º diz que "é livre a manifestação do pensamento, sendo vetado o anonimato".

No mesmo artigo, o inciso IX determina que "é livre a expressão da atividade intelectual, artística, cientifica e de comunicação, independente de censura ou licença". No capítulo Da Comunicação Social, o artigo 220, afirma que "a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veiculo não sofrerão qualquer restrição". E o parágrafo primeiro, desse mesmo artigo, diz que "nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social".

É inadmissível que a liberdade de empresa restrinja a liberdade de expressão das pessoas. Mas a grande maioria dos veículos de comunicação (rádio, TV, jornal impresso) são empresas particulares e, como qualquer outra, possui um dono e objetiva o lucro. Dessa forma, o acesso aos meios de comunicação somente será dado a quem o proprietário da empresa consentir e de acordo com as normas e restrições impostas pelo dono.

Com isso, as vozes dissidentes não terão espaço e a liberdade de imprensa só poderá ser exercida se não for discordante da empresa. Assim, a liberdade de expressão individual, ou seja, os diálogos interpessoais entre grupos pequenos e localizados poderão ser exercidos livremente, mas só terão validação social no momento em que receberem espaço nos meios de comunicação. Este lugar não será dado enquanto a quase totalidade dos veículos de comunicação funcionarem na lógica econômico-industrial.

Devido a essa contradição torna-se mais legítima a discussão e a defesa em torno do Direito Humano à Comunicação, pois este é uma junção, tanto da liberdade de falar, quanto de ser informado (a), tendo como fim à realização da comunicação humana, entendida aqui como um diálogo. Ainda que o indivíduo possua a liberdade de expressão garantida, ele precisa dos meios para se manifestar.

Assim, a defesa do Direito à Comunicação não se restringe a dar liberdade para as pessoas se expressarem, mas também garantir meios para isso. Canais que ofereçam aos mais diversos grupos a oportunidade para que a sua voz se faça ouvir na sociedade. É restritivo dar à pessoa a liberdade de se expressar e não lhe oferecer o espaço pelo qual falar, pois, então, esta precisará se submeter a um meio já existente, que tem dono e que diz o que será transmitido por este meio - a empresa.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, no artigo 19º diz:

"Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e de expressão; esse direito inclui o de não ser molestado pelas suas opiniões, o de investigar e receber informações e opiniões e o de difundi-las, sem limitação de fronteiras, por qualquer meio de expressão".

Consagrando assim a liberdade de expressão, mas sendo percebido o fator restritivo desta liberdade, inicia-se as discussões em torno do Direito Humano à Comunicação.

Compreendendo a importância da comunicação na sociedade, entre os anos sessenta e setenta, surgem, no âmbito da UNESCO, discussões sobre o papel da comunicação no fortalecimento da democracia, e nestas, é pautado o Direito à Comunicação.

Das discussões, origina-se o documento "Um Mundo e Muitas Vozes - comunicação e informação na nossa época", mais conhecido como Relatório McBride, no qual o Direito à Comunicação é definido como: o direito de ser informado e obter a informação que desejar de forma verdadeira; o direito de transmitir informações verdadeiras, tal como as concebe, e também o direito de discutir, refletir e debater a comunicação de forma aberta e transparente, assim como o direito de permitir ao indivíduo interferir nas decisões que os responsáveis tomam pelo coletivo.

O direito humano à comunicação é a junção da inalienável e fundamental liberdade de expressão e do direito à informação, isto é, ao acesso integral a estas e às condições de produção das mensagens informativas, e atua também como garantidor da pluralidade dos conteúdos.

Garante, além dos citados acima, o acesso às tecnologias de comunicação e informação, a democratização do conhecimento e a participação da sociedade na definição de políticas públicas. Assim, podemos considerar, de forma sintética, que defender o direito humano à comunicação, é defender não só a liberdade para dizer o que quiser, mas ter os meios garantidos para isso.

A importância da comunicação foi reconhecida e apreciada na Constituição de 1988. Nesta, a comunicação é concebida como um bem público, como um direito indispensável para o exercício da cidadania, por ser um instrumento essencial para a emancipação dos indivíduos e sua construção pessoal, social, política e cultural. Isso pode ser percebido no artigo 221:

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

A centralidade da mídia

A sociedade contemporânea é "estruturada e ambientada na comunicação, como uma verdadeira 'Idade Mídia" (Rubim, 2002). Atualmente, o debate de idéias não é mais feito nas ruas, a ágora grega deu lugar às relações mediadas pelos meios de comunicação de caráter massivo, que são, na atualidade, o maior e mais importante espaço público.

O que está na mídia existe e assim, pode e deve ser debatido; o que não está, não tem importância, logo, não interessa, nem merece atenção. São os meios de comunicação e as relações comunicativas que definem e constroem o social. A mídia cumpre "um papel primordial, também, na universalização de determinados referentes - sejam marcas comerciais ou produtos da indústria cultural - que balizam nosso cotidiano e nossa visão de mundo" (Miguel, 2002).

Segundo dados do Instituto de Estudos e Pesquisa em Comunicação (EPCOM), presente na pesquisa "Donos da Mídia", a TV está presente em 87,7% dos domicílios brasileiros, sendo a mais importante - e, para muitos, única - fonte de informação e entretenimento. Ainda mais quando tomamos por base outros dados, também do EPCOM: 39% das pessoas não lêem revistas ou só tem acesso a elas menos de uma vez por trimestre; 48% não lêem jornal ou só tem acesso ao veículo menos de uma vez por semana. Este fato torna-se um problema no momento em que identificamos a concentração da propriedade dos meios de comunicação, principalmente eletrônicos, controlados, quase sempre, por famílias de políticos oligarcas.

No Brasil, cinco emissoras controlam mais de 90% da audiência, sendo que destas, apenas uma tem a posse de mais de 50%, segundo dados do EPCOM. [2]

Essa concentração faz com que apenas uma visão do mundo, dos fatos seja transmitida pelas empresas de comunicação, que controlam e editam os acontecimentos, os quais deveriam servir ao interesse publico, mas nesse contexto, servem a interesses particulares seguindo a lógica do lucro, pois a comunicação, na esfera social, não é vista como um bem público, mas como mercadoria. No instante em que a comunicação passa a ser utilizada em função do ganho financeiro, os donos das mídias irão utilizar os instrumentos e estratégias existentes para este fim.

Com isso, as vontades, os desejos, as idéias, os valores, os gostos, os estereótipos são construídos; objetivando vender um produto ou construir um consenso, influenciado ou não, por acordos políticos. Destruindo assim, a diversidade em favor de um pensamento único, imbuído de "verdades" fabricadas/simuladas, que são responsáveis pela criação de comportamentos e mesmo de modelos de relações humanas.

Dessa forma, apenas uma pequena parcela da sociedade impõe seu ponto de vista, prioriza fatos, interpreta os acontecimentos de forma unilateral e a partir de um minúsculo recorte feito do mundo, de acordo com seus interesses, constrói a realidade aceita - por muitos - como verdadeira.

É importante ressalvar que a concentração e o uso dos meios de comunicação sem pautar o interesse público é inconstitucional. O parágrafo 5º do artigo 220 da Constituição de 1988 diz que "os meios de comunicação não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio" e que os veículos de comunicação funcionam através de uma concessão pública, isso significa que apesar de serem empresas privadas prestam um serviço público e conseqüentemente devem servir ao interesse dos(as) cidadãos(as).

Em alguns momentos, para disfarçar a relação monológica feita pelos meios de comunicação, são realizadas pesquisas de audiência, consultas mercadológicas e programas "interativos". Mas sempre tendo como alvo o consumidor, esquecendo-se, ou não se importando, que este antes de ocupar tal posição, é um cidadão, em nome do qual o poder público outorga concessões de canais a empresas privadas, as quais se comprometeriam em zelar pela qualidade dos programas e pelo interesse público, como discutido acima.

O direito humano à comunicação é de fundamental importância na busca pela efetivação dos demais direitos humanos. Esses direitos estão interligados e a não realização de um prejudica a dos demais. Partindo da posição central que a comunicação ocupa na realização integral da democracia e da cidadania e compreendendo os meios de comunicação social como maiores legitimadores da realidade, mais importante fonte de informação e entretenimento, defender o direito à comunicação significa lutar pela efetivação dos outros direitos humanos, os direitos jurídicos, as liberdades.

Com a defesa do direito de comunicar pode-se combater os preconceitos na mídia, a violação dos demais direitos humanos e a construção de uma sociedade efetivamente democrática, na qual o debate de idéias possa se dar de forma equilibrada entre os mais diversos segmentos, fazendo com que os indivíduos e grupos sociais deixem a posição de objetos dos processos midiáticos e passem a ser agentes e a se reconhecerem nos meios de comunicação.

A democratização da comunicação

"Numa sociedade como a nossa, permeada pela comunicação, onde nenhuma instância está isolada da mídia, principalmente a instância política, no momento em que a mídia for democratizada, com mais facilidade os privilégios injustos de alguns irão desaparecer, pois os conhecimentos, as informações, a mobilização popular, as iniciativas de mudança serão mais fáceis e rápidas". (Guareschi, 2005).

A idéia de que a comunicação é uma mercadoria deve dar lugar ao pensamento da comunicação como um direito fundamental de uma sociedade democrática. Este seria o primeiro e difícil passo em busca da democratização da comunicação: a conscientização. Fazer as classes oprimidas e excluídas sentirem-se prejudicadas com o monopólio da mídia, porque isto é uma ameaça ao direito à informação, a liberdade de expressão e a diversidade cultural, e perceber a comunicação como um instrumento de efetivação da cidadania pelo qual se expressam os conflitos e diferenças por meio de diálogos na busca de um bem comum é extremamente difícil.

O reconhecimento e a efetivação do direito à comunicação é a base para a democratização da mídia, entendida aqui como um processo, a partir do qual mais pessoas, mais grupos sociais, das mais diversas origens, sobretudo com visões diferentes do mesmo fato, tenham a oportunidade de emitirem suas opiniões, suas visões, conceituações, inserindo-se no espaço público midiático, aumentando o fluxo de informações e conseqüentemente a representatividade dos diversos grupos existentes, concretizando assim a organização democrática da sociedade.

A democratização da comunicação passa pela criação de espaços eqüitativos e plurais de diálogos e a partir da diversidade de informações, da variedade de objetivos e fontes com que os conteúdos são produzidos, os indivíduos terão a oportunidade de escolher e tirarem suas próprias conclusões dos fatos apresentados.

A luta pela regulamentação do direito à comunicação é a parte institucional na busca da democratização da mídia. O reconhecimento deste direito pelo Estado obriga-o a efetivá-lo através de políticas públicas. Um exemplo dessas políticas é a criação de um Sistema Público de Comunicação, pois, como garante a Constituição de 1988, a distribuição de concessões de canais de rádio e TV deve observar a complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal (artigo 223). Dentro do campo institucional, podemos citar, ainda, a regulamentação dos artigos 220 ao 224 da Constituição Brasileira (1988).

Por exemplo, limitando a propriedade dos meios de comunicação, regulamentando o parágrafo 5º do artigo 220 (citado anteriormente) prevendo punições para quem não respeitar o limite de propriedade e garantir a diversidade cultural através da regulamentação do artigo 221 (também citado anteriormente). É necessário, também, criar mecanismos de controle público dos meios de comunicação (Conselhos estaduais e municipais, por exemplo) e efetivar os que já existem, como o Conselho de Comunicação Social.

A materialização do direito à comunicação e a busca pela democratização da mídia não se dão somente no campo institucional, no embate direto com o Estado, mas também através de veículos de comunicação alternativa e popular, como rádios livres, rádios comunitárias, jornais de bairros e vale destacar também a prática da educomunicação.

Os meios de comunicação popular, que tem à frente comunidades organizadas e grupos sociais excluídos do espaço público midiático, apresentam-se como uma alternativa à grande mídia (grandes veículos de comunicação - jornais impressos, rádio e TV de abrangência nacional - ou não - que são empresas privadas e objetivam o lucro). Nos veículos alternativos, os grupos oprimidos da sociedade sem o direito de comunicar, que não se reconhecem na grande mídia, começam a ter um espaço para se expressar livremente no qual se identificam.

Esses meios alternativos de comunicação, que muitas das vezes, configuram casos de desobediência civil, podem ser instrumentos de educação não formal e mecanismos de mobilização social. Nesses espaços populares, as comunidades, podem discutir seus problemas reais, entrar em contato com outras versões de fatos e não depender das informações vindas da mídia mercantil.

No momento em que estes meios populares de comunicação estiverem interligados, formando uma rede de comunicação alternativa, as comunidades, os grupos poderão perceber que tem os mesmos problemas e que sua organização conjunta dará mais força à defesa dos seus direitos, criando um cenário propício para a transformação da sociedade.

A prática da educomunicação, isto é, educação para a mídia ou através da comunicação, também pode criar ambientes que contribuam para a democratização da comunicação. Gera espaços que mostrem a lógica comercial que rege a produção midiática, que tragam luz sobre as idéias e interesses difundidos, mostrando que a publicidade faz comprar o que não se precisa e que as informações (postas de uma única visão) formam as opiniões.

Isto tornará os(as) cidadãos(ãs) mais críticos(as), fazendo com que não se contentem em apenas saber o que se passa, mas que reflitam sobre o que lhes está sendo passado, dando os primeiros passos rumo a uma nova cultura, que os permita pensar em alternativas a dominação e a opressão a qual estão sujeitos.

Atores da democratização

As constantes mudanças pelas quais vem passando os processos comunicacionais, os avanços tecnológicos da área, a conjuntura sócio-político-econômica, a centralidade dos meios de comunicação e o anseio por uma sociedade com eqüidade de direitos fizeram com que vários movimentos surgissem em busca da democratização da comunicação. O Coletivo Brasil de Comunicação Social - INTERVOZES, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), a Executiva Nacional dos estudantes de Comunicação Social (ENECOS) e a Campanha CRIS são alguns exemplos dessa mobilização.

O Coletivo Brasil de Comunicação Social - INTERVOZES - é uma associação civil que atua para transformar a comunicação em um bem público e efetivá-la como um direito humano, buscando o fortalecimento da esfera pública e a ampliação da participação da sociedade civil nos debates e decisões pertinentes à coletividade. O INTERVOZES elaborou um documento (Plataforma INTERVOZES pelo Direito à Comunicação), no qual oferece um panorama da conjuntura midiática atual e explicita os princípios para uma comunicação democrática. [3] Que são:

  • Controle Público: as empresas privadas que "vendem a comunicação", o fazem por meio de concessões públicas, assim as emissoras de rádio e TV são autorizadas a usar uma freqüência de modo que atendam ao interesse público. Devem ser criados conselhos, conferências e outros espaços abertos de debate para "fiscalizar" estes meios. Isso significaria o amadurecimento da democracia.
  • Controle de Propriedade: é preciso combater a concentração de propriedade. A legislação deve controlar e prever o limite da posse dos meios de comunicação. É necessário um controle público para efetivar a pluralidade essencial na concretização da democracia.
  • Sistema Público de Comunicação: para equilibrar as proporções entre os interesses, é preciso outorgar parte das concessões para a sociedade civil organizada.
  • Radiodifusão Comunitária: elemento importante para garantir a pluralidade na difusão de informações.
  • TV Digital: adaptar o sistema para que esta possa contribuir para uma maior diversidade de idéias nos meios.
  • Inclusão Digital: significa integrar os cidadãos na esfera informatizada, diminuindo o abismo entre os que têm e os que não têm.
  • Software Livre: luta para não haver direito de propriedade, para que assim não haja apropriação privada do trabalho coletivo.
  • Estímulo a Pequenos Veículos, à Regionalização e a Produção Independente: é a chamada mídia alternativa, para buscar um "equilíbrio de forças".

Surgida da necessidade de aglutinar entidades em torna de uma mesma luta, aumentando a força das manifestações, a Campanha CRIS Brasil é um capitulo nacional da CRIS Internacional (Communication Rights in the Information Society - Direito de Comunicação na Sociedade da Informação).

A CRIS Brasil reúne mais de 40 entidades, entre organizações da sociedade civil e movimentos sociais, tendo como missão à luta pelo reconhecimento e efetivação do direito humano à comunicação, entendendo-o como uma parte fundamental da construção de uma sociedade livre, justa e igualitária.

Na busca pela efetivação do direito à comunicação, a CRIS tem como prioridades: a batalha pela constituição do sistema público de comunicação; incentivo à diversidade, que significa a procura pela igualdade de condições no tratamento de questões lingüísticas, regionais, étnico-raciais, de gênero e opção sexual, entre outras, e a socialização do conhecimento, isto é, as discussões em torno dos direitos do autor e as leis de propriedade intelectual.

A Executiva Nacional dos estudantes de Comunicação Social (ENECOS) e o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) são outros importantes atores históricos na defesa da democratização da comunicação. A ENECOS existe há dezesseis anos, e, dentro deste tempo, sempre pautou a democratização da mídia como uma de suas prioridades.

Anualmente, realiza a Semana Nacional pela Democratização da Comunicação, em quase todas as capitais do país [4]. O FNDC surgiu como entidade em 1995, e desde então, tem participado de muitas vitórias no campo da democratização da comunicação, tais como: a implantação do Conselho de Comunicação Social; a implantação de canais universitários, comunitários e legislativos na TV a Cabo.

Em 2003, o FNDC realizou, durante o III Fórum Social Mundial, em Porto Alegre/RS, o Seminário "Comunicação para o Exercício da Cidadania", com o desenvolvimento de quatro painéis e cinco oficinas, que contaram com a participação de mais de 400 pessoas e em junho deste ano, apresentou ao governo uma proposta sobre digitalização da comunicação e pautou, junto à sociedade, o debate sobre regulamentação da regionalização da produção cultural, artística e jornalística no rádio e na TV, entre outras ações.

"Ser livre", "liberdade", são expressões que não se pode utilizar enquanto os meios de comunicação forem propriedade de poucos que difundem suas mensagens, formam mentes, modos, costumes e valores. Tudo isso de forma tão sutil que se acredita que os desejos, as vontades são frutos da individualidade. Não podemos ficar calados diante de uma situação de dominação simbólica, que faz da maioria das pessoas fantoches das elites, econômica e política, e talvez sem perceber.

O problema foi colocado, as soluções apontadas e ainda que tudo isso apareça de forma obscura, cabe-nos a decisão de nos conformarmos, isto é, continuarmos vivendo num mundo inventado e fazendo de conta que é tudo normal, que somos livres e temos vontades próprias, ou buscarmos um dos muitos focos críticos para atuarmos, ainda que de forma incipiente.

Cabe a nós a decisão.

Notas

[1] Cidadão britânico graduado em Filosofia, Teologia e Comunicação Social, além de Ph.D. em Comunicação Social pela New York University (1960), quando defendeu sua tese "Race as a Factor in International Communications".

[2] Pesquisa "Donos da Mídia". Disponível em: <www.fndc.org.br>. S/d.

[3] Plataforma INTERVOZES pelo Direito à Comunicação. Disponível em: <www.intervozes.org.br>. S/d.

[4] Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social: Disponível em: <www.enecos.org.br>. S/d.

Referências bibliográficas

BOURDIEU, P. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.

CASSOL, D. B. "A democratização da Comunicação no Brasil: anotações teóricas e história do movimento". Monografia de graduação em Comunicação Social/Jornalismo, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2003.

GUARESCHI, P.; BIZ, O. Mídia Educação e Cidadania: tudo que você precisa saber sobre mídia. Petrópolis: Vozes, 2005.

INTERVOZES. Relatório da pesquisa: direito à comunicação no Brasil. São Paulo: Intervozes, 2005.

MIGUEL, L. F. Política e mídia no Brasil: episódios da história recente. Brasília: Ed. Plano, 2002.

RAMOS, M.; BAYMA, I.; LUZ, D. "Por políticas democráticas de comunicação - contribuição ao ideário de reconstituição do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação". Brasília, fevereiro de 2001.

RUBIM, A. A. C. Comunicação e política. São Paulo: Hackers, 2002.

TOMAZ, R. C. J. "O quinto poder: a crítica da mídia enquanto controle social dos meios de comunicação". Monografia de graduação em Comunicação Social/Jornalismo, Universidade Federal do Maranhão, 2003.

*Ramon Bezerra Costa é graduando em Comunicação Social - Jornalismo, na Universidade Federal do Maranhão e monitor do projeto Cidade.Com (Proex Especial 2006 - Ministério das Cidades/Ministério da Educação) pelo Núcleo de Estudos e Estratégias de Comunicação. E-mail: ramonbz_ma@yahoo.com.br.


®Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro [ISSN 1806-2776]