Nº 9 - Dez. 2007 Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ANO V
 
 

Expediente

Vinculada
à Universidade
de São Paulo

 
 

 

 


 

 

 

 

 

 


DOSSIÊ - 7 DE SETEMBRO NA MÍDIA
 


Patriotismo no ciberespaço

Uma análise da cobertura da
semana da pátria pelo Portal UOL


Por
Janaina de Oliveira Nunes*

Reprodução

RESUMO

Neste trabalho analisamos as matérias publicadas na homepage do Portal UOL durante a semana de 02 a 08 de setembro a fim diagnosticar o tratamento jornalístico dado ao Dia da Independência do Brasil, comemorado em 7 de setembro.

No decorrer das análises constatamos que, apesar de ter abordado o tema em conteúdos didáticos e educacionais, não houve a preocupação de se criar pautas e reportagens sobre o sentimento de pátria ou sobre o sentido da independência. No desenvolvimento do artigo trabalhamos com a hipótese de que o pouco destaque dado ao Dia da Independência se deve à falta de interesse dos jovens usuários da Internet pelo tema, tendo em vista que estes cresceram em meio a uma cultura de desvalorização dos rituais cívico-militares com a desmistificação da história oficial.

PALAVRAS-CHAVE: Jornalismo Online / Noticiabilidade / Sociedade

Introdução

O objetivo deste trabalho é pesquisar o conteúdo do Portal UOL durante a semana de 2 a 8 de setembro a fim de mapear o que foi publicado em relação ao Dia da Independência, comemorado no Brasil em 7 de setembro. A intenção é descobrir como a semana da pátria foi retratada neste veículo, e o resultado foi a quase ausência de conteúdo jornalístico neste sentido. Nas próximas páginas aprofundaremos esta análise amparada por alguns teóricos do jornalismo, com o intuito de entender porque os ritos de comemoração e a temática da independência do Brasil não serviram de pauta para a equipe de jornalismo do portal durante essa semana.

Primeiramente, gostaríamos de ressaltar algumas diferenças entre a grande mídia tradicional impressa e a mídia digital, principalmente em relação à audiência. Temos, portanto, que de um lado o impresso se esforça para falar a uma grande quantidade de pessoas, oferecendo conteúdo passível de agradar a "todos" – desde o leitor de manchetes das bancas de jornal, que pode se sentir seduzido a comprar um exemplar, até o político mais poderoso, que busca repercussões positivas sobre seu trabalho nos noticiários que assina.

E de outro lado, a mídia digital em sua essência é voltada para o “indivíduo digital, um ser único com suas preferências editoriais e vontades consumistas, um cidadão que cresceu jogando videogame e interagindo com o mundo eletrônico” (Cf. FERRARI, 2004: p.53).

O veículo digital é antagônico ao tradicional (TV ou jornal), pois sua concepção parte de um grupo grande para um grupo pequeno, e, por fim, para o indivíduo - aquele interessado em consultar um serviço meteorológico que forneça as condições climáticas da cidade de dez mil habitantes onde ele irá passar o próximo feriado. Esse indivíduo deseja ainda saber, se possível, a rota e as condições das duas únicas estradas da região (Cf. FERRARI, 2004: p.54).

Outro dado interessante, levantado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Comitê Gestor da Internet no Brasil e publicado como suplemento na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2005 sobre acesso à Internet e posse de telefone móvel celular para uso pessoal, é a constatação de que a utilização da Internet estava mais concentrada nos grupos etários mais jovens e que a idade média do usuário de Internet no Brasil é de 28 anos.

No grupo de 15 a 17 anos de idade, 33,9% das pessoas acessaram essa rede, e o percentual foi declinando com o aumento da faixa etária, atingindo 7,3% no contingente de 50 anos ou mais de idade. A proporção de pessoas que acessaram a Internet no grupo etário de 10 a 14 anos (24,4%) ficou acima daqueles das idades a partir de 30 anos, tanto na parcela feminina como na masculina.

Essa constatação é importante por trazer informações sobre o perfil da audiência dos portais de conteúdo na Web. Afinal, se o “indivíduo digital” no Brasil tem em média 28 anos e cresceu interagindo com o mundo eletrônico e sofrendo as influências sociais, políticas e culturais pertinentes a essa geração nascida em finais da década de 1970 e ao longo dos anos 80, cabe a nós investigar teoricamente por que o Portal UOL decidiu não pautar as cerimônias e ritos tradicionais de comemoração pelo Dia da Independência como conteúdo jornalístico.

Sobre o Universo Online (UOL)

Criado em 1996, em seu próprio slogan o Portal UOL já diz se considerar como “o melhor conteúdo da Internet”. E no texto de apresentação disponível em link no rodapé do portal alguns dados numéricos tentam comprovar essa afirmação: o UOL é provedor de acesso de mais de 3 mil localidades brasileiras, com conexão em mais de 29 mil cidades em 168 países no exterior e tem cerca de 1,7 milhão de assinantes. Segundo dados creditados ao Ibope NetRatings, a cada dez pessoas que acessam a Internet a partir de casa, sete visitam o UOL regularmente, e o portal se constitui como o mais extenso conteúdo em língua portuguesa do mundo publicado na Internet.

Em todo o portal encontram-se 42 estações temáticas e, dentro desse montante, é importante enfatizar que nem tudo o que é publicado trata-se de conteúdo de caráter jornalístico, tendo em vista tamanha extensão dos textos didáticos e educativos, além de conteúdos de marketing de produtos à venda no portal. Vale destacar também que boa parte do que é publicado fica disponível somente para assinantes, com acesso mediante login e senha.

Dentre o conteúdo jornalístico, além das produções da redação UOL, também são utilizados como fontes agências e jornais nacionais e internacionais, como Reuters, BBC, DW World, EFE, Lusa, France Presse, Folha de S.Paulo, Folha Online e Valor Online. Através do UOL é possível acessar edições on-line de alguns jornais e revistas brasileiros e estrangeiros. E, em seu texto de apresentação, o portal afirma que “agilidade e pluralidade norteiam a sua edição, 24 horas por dia, com os assuntos que são e que serão notícia e objeto de análise e reflexão”.

Ressaltamos que boa parte da publicação do Portal UOL não se trata de jornalismo, apesar de o texto de apresentação definir seus assuntos como “notícia”, porque ao analisarmos a cobertura da semana de 7 de setembro, vimos que dentro desse tema, a maioria das chamadas e links remetiam a outros tipos de conteúdo. De acordo com Pollyana Ferrari, é realmente próprio dos portais a publicação de conteúdos variados espalhados por suas seções de forma fragmentada, afinal, “na internet não nos comportamos como se estivéssemos lendo um livro, com começo, meio e fim. Saltamos de um lugar para outro – seja na mesma página, em páginas diferentes, línguas distintas, países distantes etc.” (Cf. FERRARI, 2004: p.42).

O que foi notícia durante a semana da pátria

Por se tratar do maior conteúdo de língua portuguesa publicado na Internet, poderíamos nos perguntar como o Portal UOL explora esse perfil, se traz informações de outros países com o mesmo idioma. Mas, numa breve análise é possível inferir que o teor do portal é essencialmente voltado para o público brasileiro, com algumas poucas notícias internacionais, seguindo o padrão de outros tipos de noticiários do impresso e da televisão que trazem seções específicas sobre as notícias mais importantes ocorridas pelo mundo.

Dentre os assuntos de cunho nacional, constatamos que a cobertura jornalística é centrada no eixo Rio de Janeiro – São Paulo, com algumas ocorrências em outros estados, como Rio Grande do Sul, Paraná, Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia e Ceará, durante a semana analisada, quando houve algum tipo de “desordem”, algo “inesperado” ou “conflituoso”, de acordo com critérios elencados por Nelson Traquina:

Com exceção do trabalho meritório de algumas empresas jornalísticas, o “resto do mundo” é notícia, tal como os países do chamado “terceiro mundo”, quando há desordem: desordem natural (por exemplo, cheias); desordem tecnológica (por exemplo, acidentes); desordem social (por exemplo, distúrbios e cortes de estrada); e desordem moral (por exemplo, crimes) (Cf. TRAQUINA, 2004: p.182).

Neste trecho, Traquina se refere à análise de um jornal de Lisboa (Portugal) e infere sobre as condições para que conteúdos do “resto do mundo” fossem vistos como notícias. Mas consideramos pertinente em nossa análise transferir a constatação para o “resto do país” no caso da cobertura do Portal UOL, ao verificarmos que seu conteúdo é centrado em apenas dois estados da região Sudeste do Brasil.

Para citar como exemplos de desordem ocorridas fora do eixo Rio-SP, que foram consideradas como notícia pelo UOL, temos dois casos no Ceará. O estado do Nordeste foi citado na homepage do portal na terça-feira, dia 4 de setembro, pelo fato de a Justiça ter interferido para a normalização do sistema de saúde pública que estava afetada pela recusa dos médicos em realizar cirurgias cardíacas pagas pelo SUS, ou seja, uma desordem na saúde. E na sexta-feira, dia 07 de setembro, o Ceará também virou notícia por ter havido uma rebelião em presídio resultando em algumas mortes, ou seja, desordem no sistema carcerário.

Esses dois exemplos são interessantes, pois nos remetem à afirmação de Carlos Eduardo Franciscato de que a publicação de notícias regulares é importante para garantir a continuidade dos debates. A partir disso, também podemos perceber que o Ceará só virou notícia porque houve um acontecimento que se conecta ao debate nacional sobre a crise do sistema de saúde pública e outro que se encaixa no debate sobre a desordem do sistema carcerário no país.

Também em relação à continuidade dos debates, verificamos na cobertura jornalística durante a semana de 7 de setembro referências ao caso mensalão, sobre corrupção no governo; à crise no senado, instaurada pelas suspeitas de corrupção por parte do presidente do senado Renan Calheiros; às discussões sobre o fim da cobrança do CPMF; a prisões de traficantes no Rio e em São Paulo; à guerra do tráfico nas favelas do Rio de Janeiro, que durante a semana matou dezenas de pessoas em conflitos entre bandidos e policiais etc.

Referências ao 7 de setembro

Durante toda a semana, verificamos oito referências diretas ao feriado do dia 7 de setembro, publicadas na homepage do portal entre os dias 04 e 07, ou seja, na quarta, na quinta e na sexta-feira. Os links remetiam a conteúdos educativos, cartões virtuais sobre o Dia da Independência, matérias sobre trânsito, meteorologia e restaurantes em cidades litorâneas voltadas para turismo e viagens no feriado etc.

No entanto, o que nos surpreende é que dentre estes conteúdos, somente as matérias de trânsito e meteorologia possuíam teor jornalístico. O que nos leva a concluir que a redação do Portal UOL não se importou em produzir pautas que fizessem referência ao Dia da Independência do Brasil e nem ao menos em fazer a cobertura jornalística dos desfiles militares que acontecem neste dia por todo o país.

O fato de não um incluir um tema que seria relevante entre as pautas de reportagem da redação é visto por Perseu Abramo como uma forma de manipulação da informação. Segundo a classificação desenvolvida por ele, a não cobertura do 7 de setembro poderia se enquadrar no padrão de ocultação, que ele explica da seguinte forma:

É o padrão que se refere à ausência e à presença dos fatos reais na produção da imprensa. (...) Esse é o padrão que opera nos antecedentes, nas preliminares da busca da informação, isto é, no “momento” das decisões de planejamento da edição, da programação ou da matéria particular daquilo que na imprensa geralmente chama de pauta (Cf. ABRAMO, 2004: p.25/26).

No entanto, referindo-se especificamente às redações on-line, Pollyana Ferrari nos traz outra explicação, que no caso do Portal UOL condiz com o fato de este ter grande parte de seu conteúdo advindo de outros veículos de comunicação, como agências, jornais e revistas conveniadas – conforme citado anteriormente na descrição do portal. A autora de “Jornalismo digital” é jornalista especializada em tecnologia e ex-diretora do portal IG, e a partir de sua experiência profissional fala sobre a prática de “empacotamento” da notícia, que segundo ela é muito mais comum do que o ideal de apuração e redação jornalística no dia-a-dia destes portais disponíveis na Web:

No caso específico das redações on-line, a produção de reportagens deixou de ser um item do exercício do jornalismo. Adotou-se apenas a produção de notícias, ou, como se diz no jargão jornalístico, de “empacotamento” da notícia. Empacotar significa receber um material produzido, na maioria das vezes, por uma agência de notícias conveniada, e mudar o título, a abertura, transformar alguns parágrafos em outra matéria para ser usada como link correlato, adicionar fotos ou vídeo, e por aí afora. (...) Ao trabalhar em cima do texto alheio, o jornalista da internet não deixa de ser um copydesk (Cf. FERRARI, 2004: p.44).

Dessa forma, é fácil inferir que o Dia da Independência pode não ter sido gancho para a produção de pautas jornalísticas a serem desenvolvidas pela redação do portal, dentre outros motivos, porque a equipe prioriza o “empacotamento” das matérias já disponíveis pelas agências. O que nos remete ao critério contextual da disponibilidade, considerado por Nelson Traquina como o primeiro valor-notícia de seleção. Ou seja, por fornecer conteúdos de diferentes agências de notícia, o Portal UOL tende a privilegiar a reprodução de discursos e visões de mundo destes veículos conveniados.

Isso também pode explicar o porquê de não haver uma cobertura jornalística dos desfiles militares, afinal por ser o 7 de setembro um dia de feriado nacional, é bem provável que muitos profissionais da redação estivessem de folga e, com uma equipe desfalcada, pode ter faltado recursos para que tal cobertura entrasse na pauta do dia.

O perigo é que, segundo José Arbex Jr.:

A “revolução conservadora” propiciada pela tecnologia introduziu pelo menos um novo “padrão de manipulação” não analisado por Abramo: o que permite fabricar socialmente a amnésia, mediante a imposição da velocidade informativa (Cf. ABRAMO, 2004: p.09).

E é justamente essa amnésia em relação à importância das tradições e ritos em celebração ao Dia da Pátria, que veio sendo trabalhada politicamente ao longo das últimas décadas no Brasil – especialmente nos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso – que se potencializa com a velocidade de produção e fragmentação de conteúdos na Web.

Mas não podemos esquecer que toda produção é voltada para um consumo e que talvez na visão editorial do Portal UOL o jovem internauta com idade média de 28 anos não esteja interessado em rituais militares e outros assuntos referentes a valores como nacionalismo ou patriotismo. Os indícios para essa conclusão podem ser encontrados em um dos cartões postais virtuais com link disponível na homepage no dia 5 de setembro.

No cartão há o desenho de um boneco com chapéu de jornal, segurando um cavalinho de cabo-de-vassoura. Através de uma técnica de animação, o boneco movimenta os braços e as frases no alto de sua cabeça se alternam formando a seguinte oração: “Mais que chapéus de jornal e cavalos de cabo-de-vassoura, a semana da pátria é sobre reavivar as memórias para nos fazer lembrar que nosso país é independente de qualquer outro, mas muito dependente da gente.”

O texto e o desenho com apelo infantil chamam atenção para outros valores, diferentes dos que permeavam as brincadeiras de marcha-soldado. Afinal, mais importante do que desfiles militares é o sentimento de que a sua pátria depende de você. Ainda nesse sentido, em um dos conteúdos referentes ao Dia da Independência, publicado na quinta-feira, dia 6 de setembro, uma crônica do colunista Zé Simão também depõem contra os desfiles militares – de forma muito mais direta do que no cartão virtual.

Na coluna denominada Monkey News, Zé Simão considera a Parada de 7 de Setembro como dia de cavalo fazer cocô na avenida, faz piada sobre o presidente Lula e afirma que o único dia da independência é 04 de julho, pois somente os Estados Unidos se tornaram realmente independentes da nação colonizadora.

Sobre os desfiles cívico-militares que aconteceram este ano no dia 7 de setembro, o Portal UOL optou por publicar apenas algumas fotos das paradas de Brasília, São Paulo, Salvador e Recife, com breves legendas. Nenhuma novidade, nenhum texto ou nota e apenas quatro cidades citadas em fotos. E nenhum critério que possa explicar a escolha dessas quatro cidades, o que nos leva a pensar novamente na disponibilidade, ou seja, publica-se o que casualmente ou por interesses implícitos está mais disponível no momento.

Potencialidades do jornalismo na Web

Muitos autores convergem entre si quando o tema são os atributos essenciais do jornalismo. Nesse sentido, tanto Franciscato quanto Otto Groth consideram essenciais a publicidade, no sentido de tornar públicos conteúdo de interesse das pessoas; a heterogeneidade, no sentido de oferecer conteúdos diversos; e a periodicidade, como regularidade da oferta de notícias garantindo a continuidade do debate. No entanto, Groth chama de universalidade o que Franciscato nomeia como heterogeneidade e acrescenta ainda a característica da atualidade, que no jornalismo ideal deveria caminhar em simultaneidade com a periodicidade, para a publicação imediata dos acontecimentos.

Ao estudar esses atributos do jornalismo ideal definidos por Groth, o pesquisador português António Fidalgo desenvolveu um artigo teórico cuja hipótese é de que o jornalismo on-line apresentaria possibilidades para uma maior aproximação em relação à realidade ideal do jornalismo. Afinal, na Web há potencialidade para uma sucessão mais rápida de notícias em tempo real, fundindo periodicidade com atualidade, além da extensão da rede possibilitar, ao menos teoricamente, maior publicidade e heterogeneidade de conteúdos, sem limites de espaço e sem fronteiras geográficas.

No entanto, ao analisarmos a aplicação dessas potencialidades no Portal UOL, não verificamos tal proximidade com o jornalismo ideal, até porque constatamos que nosso objeto de estudo não se trata de um portal exclusivamente de notícias, mas sim um portal de conteúdo na Internet, com textos, fotos, vídeos e animações, porém nem tudo com caráter jornalístico. Em relação à periodicidade, vimos que no linkUOL Últimas Notícias” há uma forte proximidade com o que é chamado na Web de publicação de notícias em tempo real. Mas esse conteúdo não é destacado na homepage, fazendo com que o portal aparentemente perca em termos de publicidade, apesar da grande atualidade de suas publicações.

Também em relação à universalidade ou heterogeneidade verificamos a possibilidade de se trabalhar melhor esse potencial, tendo em vista que da vasta extensão de conteúdo publicado na homepage durante os dias analisados, constatou-se pouca variabilidade de assuntos, tendendo à homogeneidade de discursos fornecidos pelas agências conveniadas ao portal.

Segundo Palácios e Mielniczuk, o jornalismo digital, mais especificamente, possui seis características que o distingue da prática em outros suportes e consideramos interessante avaliar o desenvolvimento desses atributos em relação à análise do Portal UOL. Destes itens, constatamos que a interatividade e a hipertextualidade ainda são elementos muito pouco explorados, sendo que a primeira se resume a algumas seções em que leitores respondem a enquetes ou publicam imagens em fotologs temáticos, e a segunda se caracteriza mais como uma intertextualidade com links remetendo a conteúdos do próprio portal, não havendo uma hipertextualidade propriamente dita. A personalização de conteúdo também é uma característica praticamente não observada.

Em relação à multimídia, vimos que é muito bem explorada e desenvolvida, sendo o UOL, inclusive, o primeiro portal a publicar um telejornal interativo na internet. Porém, a grande maioria dos conteúdos em multimídia só estão disponível aos assinantes do portal, com acesso negado aos demais usuários da Internet. Quanto à memória, percebemos um vasto arquivo de conteúdo histórico e contextualizador. E quanto à instantaneidade – última das seis características elencadas por Palácios e Mielniczuk – já foi dito que há uma atualização contínua das notícias do portal, porém estas não são destacadas na homepage com links que poderiam mostrar data e hora de publicação, como fazem outros portais mais primorosos neste sentido.

Considerações finais

Se pensarmos no processo político vivido pelos brasileiros nos últimos 20 anos, principalmente do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, em 1994, para cá, podemos constatar inúmeras mudanças que afetaram também os setores sociais e culturais de nossa sociedade. Plano Real, estabilidade da moeda, privatizações, política internacional globalização.

Tudo isso, de certa forma, pode ter contribuído para que o brasileiro tivesse mais confiança em seu país, mas ao mesmo tempo parece ter sido incutido um enfraquecimento do sentimento de nacionalismo e uma desvalorização de rituais cívico-militares que remetiam às memórias da ditadura. Afinal, um novo mundo globalizado abre espaço para a construção de novas formas de identidades, mais fragmentadas e desterritorializadas.

E a geração nascida anos nos 1980, que predomina entre os atuais usuários da Internet, se constitui por jovens que cresceram nesse ambiente com novas formas de subjetividade e novos valores em relação ao Brasil. Nesse sentido, consideramos que a superficialidade da cobertura da Semana da Pátria pelo Portal UOL seja conseqüência da suposição de que estes internautas não estariam interessados em ritos patrióticos e mitos nacionais.

Não entanto, não podemos desconsiderar que apesar de não destacar as paradas de 7 de setembro, que ainda acontecem em praticamente todas as cidades do Brasil, o Portal UOL dedicou um certo espaço, com textos não jornalísticos, para a valorização de identidades e mitos com raízes históricas, como vimos no cartão virtual e como pode ser observado nos textos didáticos sobre História do Brasil, que tiveram links nas homepages durante a semana analisada.

Em relação ao conteúdo jornalístico, concluímos que o portal optou apenas por oferecer dicas de como aproveitar o feriadão, em reportagens sobre meteorologia e trânsito. Também houve a publicação de uma matéria com sugestões de restaurantes nas cidades de Búzios, Angra dos Reis e Rio de Janeiro, porém seu caráter era mais comercial do que jornalístico, com links para uma seção temática do portal sobre gastronomia.

A cobertura do Dia da Independência ficou apenas nas fotos legendadas publicadas no final do dia 7 de setembro, abrangendo somente quatro cidades. Enfim, o que podemos concluir é que apesar de se considerar o melhor conteúdo da Internet e de se constituir como o maior portal em língua portuguesa, o UOL ainda explora muito pouco suas potencialidades, tanto em relação ao jornalismo, quanto em relação às características da Web.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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MACHADO, E.; PALÁCIOS, M. (Org.). Modelos de jornalismo digital. Salvador: Edições GJOL, Calandra, 2003.

TRAQUINA, N. Teorias do Jornalimo – Vol. 1. Florianópolis: UFSC/Insular, 2004.

___________. Teorias do Jornalismo – Vol. 2. Florianópolis: UFSC/Insular, 2005.

*Janaina de Oliveira Nunes é mestranda na Universidade Federal de Juiz de Fora e repórter do jornal Tribuna de Minas.


Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro [ISSN 1806-2776]