Nº 8 - Julho 2007 Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e Comunicação ANO V
 
 

Expediente

Vinculada
à Universidade
de São Paulo

 

 

 


 

 

 

 

 

 


DOSSIÊ: COMUNITÁRIO & POPULAR
   

Práxis jornalística em
contextos de cultura popular:

A experiência do jornal Notícias do Jardim São Remo

Por Dennis de Oliveira*

Resumo
Este trabalho é uma reflexão da experiência do jornal popular Notícias do Jardim São Remo produzido pelos alunos do primeiro ano do curso de Jornalismo da ECA/USP e destinado aos moradores do Jardim São Remo, bairro originado de uma favela urbanizada vizinha ao campus da USP. Utilizou-se nesta reflexão os dados empíricos de uma pesquisa realizada junto aos moradores sobre mídia, relação com a universidade e visões sobre o bairro e os conceitos teóricos de compreensão, vínculo e comunicação de Muniz Sodré e fragmentação dos espaços de sociabilidade de Zygmunt Bauman. Propõe-se uma revisão dos conceitos da relação comunicação e grupos sociais subalternizados como ponto de partida para edificar uma proposta diferenciada de jornalismo popular.

Palavras-chave
[Processos midiáticos e culturais / Comunicação e cultura popular / Comunicação e cidadania]


Introdução

O Jardim São Remo é um bairro formado pela urbanização de uma favela localizada atrás do campus Butantã da Universidade de São Paulo. Boa parte dos seus moradores trabalha na universidade tanto como funcionários públicos efetivos como empregados de empresas terceirizadas que realizam os serviços operacionais ou ainda nas lanchonetes particulares que funcionam no campus. Desde meados dos anos 90, a universidade desenvolve vários projetos de atendimento à comunidade.

Historicamente, há uma situação de proximidade e conflito dos moradores deste bairro, com todas as suas carências sociais, com a vizinha universidade, tida como a maior do país e que concentra pessoas de segmentos sociais privilegiados. Segundo levantamento ainda em conclusão feito pelo Projeto Alavanca (uma das ONGs que atuam no bairro) existem no Jardim São Remo cerca de 2.300 moradias e uma população estimada em 6.000 habitantes.

O Jardim São Remo insere-se teoricamente no conceito proposto por Zygmunt Bauman de espaço vazio. Bauman afirma que a liquidez da modernidade - termo que ele utiliza ao invés de pós-modernidade pois considera que o que houve no final do século XX foi uma aceleração de processos formais da modernidade porém sem a solidez dos seus valores éticos - fragmentou o espaço público em quatro lugares: lugares êmicos, lugares fágicos, não lugares e espaços vazios.

Por lugares êmicos, Bauman define os espaços constituídos como meras passagens, onde não há elementos culturais que apontam para uma fixação do sujeito. O êmico significa aqui expulsar, regurgitar o indivíduo. Por lugares fágicos, Bauman considera aqueles que se constituem de tal forma que engolem o sujeito, impedindo-o de expressar particularidades, como exemplo ele cita os shoppings centers, locais onde todos se deixam engolir pela cultura do consumo.

Já os não lugares são aqueles em que não se percebe elementos identitários que o caracterizam, pasteurizando-os de tal forma que se assemelham uns com outros. [1] Marc Augé cita como exemplo destes não lugares as alas internacionais dos aeroportos - todas se parecem tanto que na hipótese de uma pessoa viajar pelo mundo inteiro sem sair das alas internacionais terá a impressão de estar sempre no mesmo lugar. [2]

Estes três lugares produtos da fragmentação do espaço público são produto da crise do modelo de agir político do projeto da modernidade. É esta crise do chamado espaço público e da sociedade civil que caracterizam uma tendência a uma postura anódina do sujeito que se vê sem valores sólidos para sustentar sua construção de subjetividade. É uma crise do indivíduo renascentista, base para a edificação da sociedade liberal nos séculos XVIII e XIX e que se apresenta como uma crise da racionalidade ocidental. [3]

Porém, os espaços vazios expressam uma ambivalência neste momento de crise. Bauman define como os locais onde se concentra a grande massa de excluídos. Por esta razão, são lugares que não tem sentido na lógica liberal e se apresentam como "perigosos" para a ordem hegemônica. Porém, além disto, tais espaços são vazios porque suas lógicas não são compreendidas pelos valores estabelecidos na lógica hegemônica e, mais que isto, expressam, de diversas formas, maneiras de construção de subjetividades distintas da concepção renascentista de ser humano.

Esta outra lógica coloca um desafio para o discurso midiático-jornalístico, uma vez que este foi concebido tendo como pressuposto o atendimento de demandas desta subjetividade renascentista. As relações estabelecidas nestes universos têm outros valores distintos gerando relações diferenciadas com a mídia que ora podem ser aproveitadas pela indústria dos meios de comunicação de massa para ampliar seu alcance no sentido comercial, mas também que podem criar outros elementos não necessariamente controlados por estes grandes meios.

Assim, consideramos vazios tais espaços dentro da perspectiva liberal clássica, porém cheios de conteúdo a partir de uma ótica distinta.

O projeto do jornal Notícias do Jardim São Remo

O jornal laboratório Notícias do Jardim São Remo (NJSR) iniciou-se em 1994, no formato de jornal mural, idealizado pelo professor Manuel Carlos Chaparro na USP. A tiragem do mural era de 300 exemplares e afixado em locais públicos dentro da comunidade do bairro Jardim São Remo, na zona oeste da cidade de São Paulo. Este periódico é uma atividade desenvolvida com os alunos do primeiro ano do curso de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP e se insere na série de projetos de extensão desenvolvidos pela USP neste bairro.

 
Imagem 1. Notícias do Jardim São Remo, ano 14, nº 4, jun2007. [capa].  

Desde 2000, o jornal deixou o formato mural e passou a ser um standard de oito páginas, de periodicidade quinzenal, com 1.500 exemplares distribuídos gratuitamente na comunidade pessoalmente pelos alunos. Já em 2006, o formato do jornal foi alterado para tablóide, 16 páginas com a mesma tiragem e forma de distribuição.

O grande dilema deste projeto é a sua caracterização. Inicialmente, o periódico guardava traços de um jornal de bairro, limitando seus valores-notícia à proximidade geográfica com o público leitor. O próprio formato inicial, as pautas, a forte presença da prestação de serviços no conteúdo do jornal demonstrava esta característica.

Este formato apontou alguns problemas. O primeiro deles é que a mídia jornal impresso não é a principal pautadora dos debates públicos no Brasil, particularmente, nos segmentos populares. Venício Lima [4] já aponta em vários estudos que o grande produto midiático que pauta as discussões públicas no Brasil é a telenovela. O jornal impresso aparece muito mais como uma complementação de discussões e, no caso de jornais destinados a públicos populares, como instrumento de sedimentação de costumes já estabelecidos em outras mídias.

 
Imagem 2. Notícias do Jardim São Remo, ano 14, nº 3, mai2007. [capa].  

Diante disto, um jornal popular se consolida a medida que ele está articulado com outras dimensões comunicativas típicas de contextos populares. Para tanto, entendemos ser importante os conceitos de vínculo, comum e compreensão proposto por Muniz Sodré.

Só se compreende no comum.Compreender significa agarrar a coisa com as mãos, abarcar com os braços (do latim cum-prehendere), isto é, dela não se separar como acontece no puro entendimento (do latim in-tendere, penetrar) intelectivo, em que a razão penetra o objeto, mantendo-se à distância para explicá-lo. No entendimento explicativo, um fenômeno particular fica subsumido a uma lei geral, enquanto na compreensão o fenômeno guarda a sua singularidade, isto é, sua unicidade incomparável e irrepetível. [5]

Quanto ao comum (instaurador de vínculo) é precisamente esse plural manifestado na totalidade das vinculações humanas que não se deixa definir nem como uma unidade universal abstrata, nem como uma centrifugação de diferenças. Não se trata, portanto, de um mero estar-juntos entendido como aglomerado físico de individualidades (por exemplo, a comunidade enquanto massa gregária substancializada) e sim da condição de possibilidade de uma vinculação compreensiva. O comum é a sintonia sensível das singularidades, capaz de produzir uma similitude harmonizadora do diverso. [6]

Quando se pensa em comunicação, o sentido etimológico do termo articula as dimensões de ação/agir e tornar comum. Vattimo [7] defende a idéia de que comunicação pressupõe uma comunidade afetiva mantida por um acordo de gostos em torno do problema da partilha coletiva de vozes e sensações.

A comunicação está vinculada a um processo de compreensão da realidade e a contradição da comunicação jornalística reside no fato desta se originar em um contexto da emergência do ser humano renascentista que se centra na busca pelo entendimento racional. Daí que surge o entendimento de que os produtos midiáticos preferidos pelas classes populares são de "pior" qualidade porque não se centram nesta busca do entendimento racional e sua preferência dá-se por uma suposta ausência de instrução desta população.

Perde-se, com esta visão elitista, um universo de construção de sentidos importante que se centra na dimensão vinculativa e não relacional/contratual e que aponta para perspectivas diferentes do que a tão falada crise do projeto da modernidade.

Sentidos construídos no contexto do Jardim São Remo

Em março de 2007, alunos do curso de Jornalismo da USP realizaram uma pesquisa de campo com os moradores do Jardim São Remo visando coletar elementos que apontassem para este universo de construção de sentidos.

O momento de realização da pesquisa foi importante - cerca de 30 dias antes, na terça-feira de carnaval, uma moradora muito querida no bairro foi assassinada por um policial que disparou a esmo quando se viu envolto em uma "guerra de ovos" entre moradores, uma tradição que moradores do bairro praticam sempre no último dia de carnaval.

 
Imagem 3. Notícias do Jardim São Remo, ano 14, nº 3, mai2007. [p. 2].  

Este fato levou o bairro para a grande mídia - houve cobertura da Folha de S.Paulo, Jornal da Tarde, Agora SP entre os jornais impressos e os telejornais Brasil Urgente e SPTV. No sábado, logo após o carnaval, os moradores organizaram uma passeata pelo bairro e com direção até o quartel da PM do bairro para protestar e exigir justiça. A passeata teve um outro sentido, além do protesto - demonstrar a solidariedade à tia da moça assassinada e que a mesma fazia parte da comunidade. Sentimentos de revolta afloraram, expressando a compreensão da situação de exclusão social, de injustiça e do preconceito operado pelos aparelhos policiais e pela mídia.

Alguns dados da pesquisa:

  • 50,27% declararam que vieram morar no Jardim São Remo porque a família já morava no local e 69,72% declararam morar no bairro mais de 10 anos.
  • Estes dados mostram dois tipos de vínculo: o primeiro familiar, a escolha do local se deu por laços familiares o que torna o bairro uma extensão das relações familiares e o segundo de tempo/espaço, que, agregada ao vínculo familiar, coloca em planos semelhantes a história pessoal de vida (e seus vínculos mais primários) com o próprio bairro. Disto resulta que mais de 85% dos entrevistados declararam "gostar de morar no Jardim São Remo". A extensão da própria casa/lar ao bairro é também percebida na resposta à questão "o que faz nas horas vagas": a maioria (31,3%) afirmou que fica em casa, cuida dos filhos, da casa e 28,75% pratica atividades esportivas e lúdicas no próprio bairro. Percebemos um vínculo territorial com o bairro por parte dos moradores - o território do bairro é o local dos familiares, do lazer, da história de vida.
  • 30,81% declararam que "não existem problemas no bairro". Dentro dos que citaram algum problema, 14,05% citaram o lixo e o saneamento básico e 10,27% a falta de segurança.

Apesar de ser um bairro com muitas carências, a percepção dele ser a casa ou o lar muitas vezes intimida o respondente a citar problemas a um estranho - é como falar mal de sua própria casa. Percebe-se que este vínculo estabelecido cria uma apropriação do território público.

 
Imagem 4. Notícias do Jardim São Remo, ano 14, nº 3, mai2007. [p. 3].  

Esta apropriação cria, por outro lado, um estranhamento com outros territórios, ainda que vizinhos. Por exemplo, na pergunta "o que é a USP para você", 40,74% afirmaram ser um "hospital" (referência ao Hospital Universitário que atende os moradores deste bairro e está próximo geograficamente), 33,74% um lugar para a prática de esportes e atividades de lazer, 12,34% não sabem dizer o que é a USP e apenas 8,6% que é uma universidade e 4,32% o local de trabalho. O Hospital entra aqui como uma parte da USP que é apropriada pelo morador da São Remo tanto no sentido do seu aspecto utilitário como no geográfico - do bairro se avista o prédio do Hospital.

A satisfação aparente com o bairro não significa um comodismo por parte dos moradores. Na questão "qual é o seu maior sonho", 22,7% dos moradores responderam "mudar de localidade"; 14,5% melhorar o trabalho (entrando aqui também os sonhos de atividades glamourosas, como ser jogador de futebol ou artista), 14,05% ter a casa própria. Há aqui uma busca por melhorias no padrão de vida, ainda que o caminho é o de caráter individual - mudar de localidade ou conseguir um trabalho melhor remunerado.

Moradores do Jardim São Remo e a mídia

Os moradores do Jardim São Remo consideram que a cobertura dos meios de comunicação ao bairro é distorcida, razão pela qual 42,18% afirmaram não confiar nas notícias difundidas pela grande mídia (a maioria relativa, 46,8% diz confiar); 78,16% afirmaram que as notícias passam uma imagem negativa do bairro, apesar de 38,66% concordarem com os conteúdos contra 33,33% que discordam. Porém, mais que os números, os moradores destacaram as críticas aos programas de apelo policial, como Cidade Alerta e Brasil Urgente, que mostram que o bairro é um local de extrema violência.

Temos diante disto, as seguintes perspectivas:

a) que a mídia passa uma imagem negativa sobre o bairro e que esta imagem é real mas prejudicial à imagem do local, gerando uma insatisfação muito mais no sentido de alguém falando de um defeito da minha "casa" (lembrando aqui o fenômeno da apropriação);

b) que a mídia passa uma imagem negativa sobre o bairro e que esta imagem não é real e prejudica a imagem do local, gerando uma insatisfação muito grande por uma inverdade passada sobre a minha casa.

A grande crítica à mídia é a superexposição do problema da violência, não que ela não exista, mas que ela é gerada por fatores externos. Uma parcela amplamente majoritária (72,8%) afirma que se sente seguro no bairro e que a insegurança é gerada pela ação da polícia. Como os programas jornalísticos tratam, em geral, a polícia como a garantidora da segurança, os moradores percebem aí uma inversão de valores. Estas críticas foram construídas ainda sob o impacto do assassinato da moradora pelo policial que foi amplamente coberto pela grande mídia.

Esta apropriação do local de moradia como um lugar seu e as conseqüentes valorizações manifestadas pelos índices de satisfação reverbera quando os moradores foram questionados se já sofreram algum tipo de discriminação: a maioria (68,10%) afirmou não, mas entre os 27% que responderam afirmativamente, 74% disseram que o motivo foi por morar na periferia (índice bem superior à orientação sexual - 4% - e racial - 1,4%).

 
Imagem 5. Notícias do Jardim São Remo, ano 14, nº 3, mai2007. [p. 7].  

Desta forma, há uma postura de percepção de sentimento de exclusão do discurso midiático e de outros discursos oficiais por pertencerem a um lugar não hegemônico - um espaço vazio, apesar da apropriação deste local e da tentativa de construir valores positivos neste local de construção de subjetividades.

O Jardim São Remo e o jornal Notícias do Jardim São Remo

A cobertura do assassinato da moradora pelo jornal Notícias do Jardim São Remo teve como gancho a mobilização da comunidade para exigir justiça. A linha da cobertura adotada foi:

  • uma rediscussão do papel da polícia, expressa na opinião dos moradores sobre esta instituição e o artigo assinado por uma liderança comunitária que afirma que a polícia é "desnecessária" e a "segurança é resolvida pelos próprios moradores";
  • uma ampla cobertura da passeata com destaque as homenagens rendidas à tia que criava a moça assassinada (o jornal NJSR foi o único periódico a cobrir e noticiar este evento);
  • uma ampliação da discussão do fato com entrevistas com o ouvidor da Polícia e o jurista Hélio Bicudo, abordando a temática dos Direitos Humanos.

O gancho a partir da mobilização e o destaque dado ao olhar dos moradores e não dando ênfase ao aspecto institucional, embora este não tenha sido desprezado, recolocou o território ou o espaço vazio na centralidade desta discussão.Todos os demais atores convidados para este debate público foram para dentro da territorialidade do São Remo, o que os fez recolocar temáticas mais amplas, como a dos direitos humanos, dentro destas perspectivas.

Na pesquisa realizada, o jornal é ainda visto como um "jornal da USP" mas há uma paulatina incorporação dentro do universo dos moradores do veículo. 82,70% afirmaram conhecer o jornal e 74,05% têm impressões positivas dele (as negativas não saíram do 0%), índice bem superior ao da grande mídia. A seção preferida dos moradores é a infantil (São Reminho) com 17,04% seguida de esportes com 10%, mas a grande maioria (65%) não apontou uma preferência.

 
Imagem 6. Notícias do Jardim São Remo, ano 14, nº 2, abr2007. [p. 10].  

Infere-se que esta avaliação positiva foi muito motivada pela edição especial lançada do caso do assassinato da moradora pois apontou uma outra perspectiva de cobertura jornalística, fortalecendo a apropriação territorial e gerando vínculos de compreensão.

Considerações finais

Os vínculos de compreensão que fala Sodré são um importante conceito para entender como os processos midiáticos geram sentidos complexos particularmente em comunidades situadas nos chamados espaços vazios.

Tais vínculos estabelecem zonas de construção de sentidos para além dos entendimentos racionais ou de relações formalizadas ou contratuais, mas articuladas com perspectivas de vivência e transcendência nos territórios.

Disto resulta em processos de apropriação territorial e incorporação de elementos externos a estes territórios desde que tenham utilidade (não no sentido utilitarista, mas da apropriação crítica) na compreensão da realidade.

É assim que um jornal tido como "um jornal da USP" à medida que consegue trazer elementos informacionais externos a esta localidade para dentro desta territorialidade contribuindo para o fortalecimento destes vínculos de compreensão consegue legitimidade que outras mídias, apesar do alcance, qualidade técnica e estrutura não conseguem. Esta construção de laços mais sólidos deu-se, inclusive, pelos procedimentos de produção da matéria que não seguiram os cânones do jornalismo: mais que cobrir a passeata, o repórter participou dela, inclusive dos atos de demonstração de solidariedade a parente homenageada.

A partir deste ato, todas as demais edições do jornal foram interpenetrando na esfera territorial do bairro e se consolidaram como uma estrutura institucional que, embora não controlada pelos moradores, é apropriada e incorporada como parte do seu território.

Em outras palavras, os critérios de pertencimento vinculativo não se dão apenas por conteúdos ou aspectos formais (como, por exemplo, organizações clássicas de representação ou formas tradicionais de fazer política), mas por uma cumplicidade estabelecida em determinados momentos-chave da história do território.

A motivação para a cobertura especial do caso do assassinato da moradora não é explicável por nenhum dos manuais clássicos do jornalismo (o impacto já havia se perdido, a comunidade já estava suficientemente informada do episódio e haveria ainda o risco de uma exploração sensacionalista), mas por uma cumplicidade afetiva que é uma das principais armas para derrubar os muros dos espaços vazios.

Notas

[1] Cf. BAUMAN, Zygmunt.

[2] Cf. AUGÉ, Marc.

[3] Cf. SODRÉ, Muniz. p. 125-199.

[4] Cf. LIMA, Venício Artur.

[5] Cf. SODRÉ, Muniz, Op Cit, p. 68.

[6] Idem, p. 69.

[7] Cf. VATTIMO, Gianni, p. 39.

Referências bibliográficas

AUGÉ, M. Não lugares. São Paulo: Papirus, 2005.

BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

LIMA, V. A. Mídia - teoria e política. São Paulo: Perseu Abramo, 2003.

OLIVEIRA, D.; RODELLI, P. "Jornal laboratório: prática extensionista articulada com a dimensão ética do jornalismo". In: Revista Brasileira de Ensino de Jornalismo, Brasília, Vol. 1. nº 1, abr/jul 2007. p. 106-125.

SODRÉ, M. Estratégias sensíveis: mídia, afeto e política. Petrópolis: Vozes, 2005.

VATTIMO, G. Introdução a Heidegger. Lisboa: Edições 70, 1971.

*Dennis de Oliveira é professor do curso de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP, doutor em Ciências da Comunicação pela ECA-USP e coordenador do Centro de Estudos Latino-Americanos de Cultura e Comunicação (Celacc/USP). E-mail: dennisol@usp.br.

Voltar.


®Revista PJ:Br - Jornalismo Brasileiro [ISSN 1806-2776]