Percursos
de reconhecimentos
Por
Antonio Fausto Neto*
Manuel
Carlos da Conceição Chaparro, 70 de vida,
50 dedicados ao jornalismo, 43 anos vividos no Brasil,
entre o Nordeste e São Paulo. Personagem, talvez,
da última geração dos migrantes que
para cá vieram, e aqui reconhecido pelos efeitos
da naturalização - ato jurídico com
que acolhe aqueles que se instalam noutras terras - mas
sobretudo, pela trajetória de uma vida de trabalho
dedicada ao Brasil.
As
motivações que justificam homenagens deste
porte são de variadas razões, especialmente
quando partem de instituições nas quais
membros e pares externalizam as manifestações
de apreço, de respeito e de reconhecimento por
alguém a quem se preza e a quem se quer externar
um reconhecimento.
Assim,
antes de tudo, quero externar a minha mais profunda simpatia
por gestos humanos desta natureza, já pouco afeitos
às nossas comunidades que, por injunções
de outros protocolos, abandonam os bons hábitos
da cordialidade, dentre os quais a manifestação
destes gestos, colocando em seu lugar estilos e sentimentos
muitas vezes alheios à cultura da delicadeza, da
tolerância e do respeito.
Vejo,
pois, neste gesto, um duplo símbolo: reconhecimento
e acolhimento, e que evocam, dentre outras coisas, as
marcas através das quais se explicita o valor e
o mérito de trabalho de alguém, como os
de Chaparro, um protagonista dentre muitos migrantes,
cuja biografia e trabalho, além de silenciados,
são por vezes também diminuídos,
para não dizer, desconhecidos...
É
justo, importante e necessário que as comunidades
das instituições científicas festejem
estas realidades, pois suas vidas e trajetórias
são feitas pelos percursos, de afetos e de inteligências
do humano.
Homenagear
implica, além de reconhecer, evocar os valores
e as qualidades daquele que neste lugar é colocado.
Assim sendo, dentre as diferentes manifestações
hoje, aqui, celebradas, tomo a liberdade de recorrer a
alguns registros da trajetória biográfica,
humana, intelectual e profissional de Manuel Chaparro,
que a mim tocam, profundamente, por ser também
pertencente a esta comunidade/diáspora de migrantes.
Manuel
Chaparro, a exemplo de outros compatriotas, para cá
veio trabalhar, tentar a vida. Se outros vieram somente
com "a cara e a coragem", foram os incômodos
com a ditadura salazarista, que fizeram com que ele abandonasse
seu trabalho como repórter do jornal lisboeta Diário
Ilustrado.
E
como um trabalhador intelectual, desembarca no Nordeste,
no Rio Grande do Norte, sob efeitos de um primeiro reconhecimento:
veio, em 1961, na condição de jornalista,
e a convite do então bispo de Natal Dom Eugênio
Sales, para editar o jornal da diocese A Ordem.
Época em que a Igreja Católica publicava
jornais, alguns dos quais se constituíram em celeiros
de grandes talentos e de escola de experiências
jornalísticas.
Por
que um jovem, mas qualificado jornalista europeu, vai
se "esconder" em redação tão
modesta, como aquela do jornal natalense, que, além
de provinciano, é marcado por uma identidade confessional
- religiosa, perguntar-se-ia.
Como
toda biografia é situada social e historicamente,
Chaparro não vem para o Nordeste por acaso, apesar
do que ali por ele é "achado". Na sua
juventude, ao lado do jornalismo, tinha ele uma história
anterior de militante operário em Portugal, na
Juventude Operária Católica, um braço
de fortes movimentos católicos (JAC, JUC, JIC e
JOC), e que na década de 50 representava, em Portugal,
uma vanguarda do catolicismo de esquerda.
Neste
contexto, encontra a sua porta de entrada no jornalismo
profissional, pois foi editor do "Juventude operária",
jornal da JOC que incomodava muito a censura de quase
quarenta anos de Oliveira Salazar, experiência aquela
que serve como ponte para o afloramento de uma sensibilidade
voltada para o jornalismo social.
Ao
lado deste aspecto, um outro elemento, num certo contexto
biográfico, explica a singularidade para este percurso
migracional: os anos 60, especialmente o período
que antecede à revolução, são
muito importantes para se entender, a abertura - nos anos
futuros - da Igreja Católica para uma pauta social,
como por exemplo, a questão da Teologia da Libertação.
O
Nordeste, em função dos desafios impostos
pela estrutura agrário-política e econômica
à vida de seu povo, é laboratório
social de arrojadas experiências de mudanças
e de mobilização social, como a criação
da SUDENE; um dos primeiros movimentos sociais do campo,
as Ligas camponesas; o primeiro projeto de educomunicação,
que foi o MEB; o método Paulo Freire, muitos deles
que ficaram no meio do caminho por conta da implantação
e dos efeitos do ciclo autoritário.
É com esta realidade, que Manuel Chaparro se defronta,
ao chegar a Natal, em 1961.
A
história, especialmente a dos homens, muda, mas
alguns fatos permanecem como referências irretocáveis.
Nestes termos é preciso fazer justiça, lembrando
que no Estado do Rio Grande do Norte, especialmente na
sua capital, se processa, sob a orientação
do então administrador apostólico Dom Eugênio
Sales, uma das mais arrojadas experiências de movimentos
sociais do Brasil, à época.
Diz
o próprio Chaparro, evocando este momento: "sob
seu comando (de Dom Eugênio Sales), a Igreja católica
criou a sua mais importante obra social, da qual fazia
parte um fantástico programa de alfabetização
pelo rádio, que alcançava todas as paróquias
do RN, envolvendo, creio eu, cerca de oito mil alunos
e centenas de monitores. Nos bastidores havia uma aliança
entre Dom Helder e Dom Eugênio e dessa aliança
resultou, entre outras coisas, o apoio forte do MEB ao
movimento de Natal (assim internacionalmente reconhecido)
e a criação da CNBB, que teve em Natal o
seu primeiro e mais importante laboratório."
"Foi
em Natal, e só lá, como experiência,
que se realizou a primeira Campanha da Fraternidade. Foi
em Natal que nasceu e se desenvolveu para o Brasil o sindicalismo
rural, com base na formação de lideranças
sindicais e comunitárias, com base no programa
de formação de lideranças sindicais
e comunitárias que a diocese mantinha e a desenvolvia.
Havia uma rede de cooperativas de apoio à atividade
artesanal. Além disso, por meio de centros sociais
comunitários, disseminados pela malha de paróquias,
desenvolvia-se um esforço permanente de educação
de base, na perspectiva da promoção humana".
No
bojo do "Movimento de Natal", a igreja dali,
externando as primeiras preocupações com
questões de políticas de comunicação,
reformula os papéis pedagógicos e editoriais
do seu sistema de comunicação radiofônico
e jornalístico. O primeiro é colocado a
serviço da educação rural, e é
neste contexto que as primeiras emissões do MEB
se constituem em "recepção cativa",
por meio de monitores distribuídos nas comunidades
rurais.
No
âmbito do jornalismo, registra-se a reformulação
do jornal diocesano A Ordem, já existente,
para o qual Chaparro é convidado a promover reformas:
"Faltava (na Obra de Dom Eugênio) um jornal
dinâmico, de orientação católica,
mas sem cheiro de sacristia, para que, pelo discurso jornalístico,
e sem preocupações de auto-propaganda da
obra social, se fizesse a revelação e o
debate da realidade injusta contra a qual se lutava. Para
isso vim, para ajudar a fazer do A Ordem um jornal
vinculado às lutas sociais", lembra Chaparro.
O
que significa fazer jornalismo independente numa região,
na época em que o "grande patrão"
era o Estado e os meios de comunicação pertencentes
às famílias de políticos tradicionais
ou dos grupos industriais locais? Também num contexto
em que as condições de produção
dos jornais, em termos técnicos e industriais,
eram bastante modestas, se levarmos em conta o fato de
que A Ordem era um jornal para lá de pobre,
com duas linotipos e uma impressora rotoplana. Não
havia dinheiro para nada e o modelo de jornalismo local,
provinciano, estimulava a acomodação ao
noticiário e ao colunismo de pequenas intrigas
e pequenas questões, como o buraco de rua que incomodava
os senhores dos automóveis", testemunha Chaparro.
Nestas
condições adversas, somadas ao peso da influência
da malha política, pratica-se no Nordeste algo
que deveria ser hoje objeto para os estudos de jornalismo,
uma singular experiência de jornalismo investigativo,
e que certamente vem servir de referência para os
grandes marcos que vão, na seqüência,
constituir esta tendência. Experimentou-se, no A
Ordem, um jornalismo de reportagem que contextualizava
as questões locais na problemática do Nordeste
e, quando era o caso, na problemática nacional,
cita Chaparro. Para tanto se fez importante a figura de
Dom Eugênio, assim definida por ele:
"Dom
Eugênio que passou à história como
bispo conservador, era, na verdade, um prelado muito avançado
e independente, sob o ponto de vista social e político.
Não dava colher de chá aos políticos
e fazia o que achava que devia fazer, qualquer que fosse
o conflito decorrente.(...) A Ordem, do meu tempo, gerava
problemas semanais com as suas reportagens agressivas,
e Dom Eugênio jamais ficou contra o jornal ou o
questionou. Como disse antes, jamais me perguntou qual
seria a manchete da próxima edição",
acrescenta.
O
jornal A Ordem foi uma experiência precursora
de reformas editorias havidas em outros jornais católicos
nordestinos, como a que foi feita no O Nordeste,
de Fortaleza, anos depois. Cercados por grandes grupos
políticos e econômicos, enveredaram estas
experiências por um jornalismo mais voltado para
o debate, graças a sensibilidade dos dirigentes
religiosos e também de uma geração
de jornalistas já marcada por outras preocupações
técnicas e éticas.
Tecnologicamente
mais modestas, e acossadas por múltiplos processos
de concorrencialidades, estas experiências, como
foi o caso do A Ordem, em muito influenciaram a
discussão pública sobre a realidade destes
contextos. Diz Chaparro: "A Ordem, apesar
de pequeno, de tiragem inexpressiva (no máximo
cinco mil exemplares) (...) Tinha grande influência
na opinião pública local e projetava um
discurso cristão de fundamento social muito forte,
até porque assentado no sucesso do Movimento de
Natal, era uma experiência de intervenção
não paternalista na realidade, baseada em formação
de lideranças populares".
Graças
a este, definido por ele, de jornalismo social, que preferia
a reportagem ao colunismo, Chaparro foi quatro vezes distinguido
com o Prêmio Esso: uma menção Honrosa
(1962); dois Prêmios Esso de reportagem na região
Norte e Nordeste (1963/64); e um prêmio Esso de
Jornalismo e de informação Econômica
(1966), escrevendo sobre questões do Nordeste.
Modesto
na avaliação dos efeitos desta experiência
editorial, Chaparro não os assinala, mas possa
testemunhar a importância que teve a implantação
da "reportagem-debate". Num momento do jornalismo
nordestino, de onde eu vim também, pessoalmente,
participei da experiência de reforma editorial do
jornal da arquidiocese de Fortaleza, O Nordeste.
O
grupo que lá estava em muito se espelhou no projeto
do A Ordem, apesar dos contextos e condições
de implantação terem sido distintos. Se
estes efeitos foram localizados, porque anos depois as
dioceses se desfazem dos seus jornais, na medida em que
mudam os ventos políticos, contudo, os ecos destes
projetos modernizadores do jornalismo migram para outros
lugares, vão com seus mentores: uma legião
de jornalistas migra para constituir a diáspora
nas redações jornalísticas do chamado
Sul do país.
Outros
vão se dedicar à universidade, outros, à
luta política. Chaparro, lá permanece e
vai para o "outro lado da redação".
De editor, redator, repórter- militante engajado
no jornalismo social, como uma causa, converte-se em Assessor
de Imprensa da emblemática SUDENE, em Recife, para
onde foi em outubro de 1964, logo depois do golpe militar
para implantar o setor de comunicação, convidado
que foi pelo cearense, técnico em desenvolvimento
agrário João Gonçalves de Souza -
civil que substituíra um militar que, após
o golpe, ocupara o lugar de Celso Furtado, forçado
a deixar aquela casa para se exilar na França.
Chaparro
leva para SUDENE, onde ficou por dois anos, as vivências
e aprendizado que lhe permitiram "desenvolver aquilo
que talvez possa ser considerado a primeira grande experiência
de assessoria de imprensa de natureza jornalística.
"Sem
preocupações com a propaganda, funcionávamos
como as extensões das redações; adotamos
a política de não gastar um tostão
em publicidade para que a informação jornalística
não ficasse condicionada por interesses não
jornalísticos; tínhamos uma equipe enxuta,
de apenas três repórteres, que trabalham
com a perspectiva de que a SUDENE nada deveria ser secreto:
e pusemos em prática procedimentos e comportamentos
que valorizavam a independência dos meios, o fácil
acesso às informações e uma relação
de honestidade e respeito com as redações
e os repórteres credenciados. Por decisão
minha, a SUDENE foi o primeiro órgão do
Recife a recusar o pagamento de jeton aos repórteres
credenciados", lembra.
No
resgate da história, é preciso assinalar
que a SUDENE gera várias e imorredouras experiências
voltadas para a reflexão do conhecimento aplicado
ao Nordeste. E também, no campo da comunicação
isso ocorre se considerarmos que o que é relatado
por Chaparro, como experiência laboratorial de um
jornalismo voltado para uma sensibilidade social, se faz
às expensas de uma agência do estado, encravada
no Nordeste e acossada pelos incômodos da nascente
ditadura.
Nestes
tempos ainda foi possível para a sociedade nordestina
- via seus grupos de pressão - elaborar um discurso-possível,
pós-revolucionário, identificado com a idéia
de um "Novo Nordeste", espécie de um
discurso desenvolvimentista surgido das alianças
entre o episcopado, no qual Dom Helder foi um dos mentores,
entre 64/66, ao lado de empresários e políticos
considerados modernizadores-progressistas. Estas teses
pressionam as práticas da SUDENE, mas duram pouco,
pois "tudo isso acabou quando o Costa e Silva e a
ala dos quartéis ganham a eleição
e os militares voltaram a tomar conta da SUDENE",
pontua Chaparro.
Em
1967, Chaparro volta ao jornalismo e ao "militantismo
possível". Vai coordenar a reforma editorial
do Jornal do Commércio, uma bela e quase centenária
escola que arrojou em um vasto projeto editorial jornalístico
no Nordeste. Depois vai para o Diário de Pernambuco
- o grande jornal "Associado" no Nordeste, para
desenvolver, ao lado de Calazans Fernandes, o que seria
a mais importante experiência de jornalismo de análise
sobre a região, por meio da reportagem e da coluna
"Alta Prioridade".
Isso
lhe vale o Prêmio Esso de informação
Econômica, com a matéria "As dez mãos
do artesão", sobre o artesanato nordestino
e a sua importância para a renda das famílias
artesãs. Como jornalista militante, voltado à
sensibilidade social e à cidadania, colaborou na
elaboração, como redator principal do célebre
documento formulado pela sociedade nordestina, apoiado
por Dom Helder Câmara, "Nordeste, desenvolvimento
sem justiça", que teve repercussão
internacional, e que representa a ruptura de setores sociais
avançados com o modelo vigente.
Nele,
se formula uma análise crítica "de
enorme densidade, colocando em questão o racionalismo
técnico das políticas, projetos e programas
da SUDENE, aos quais faltava a perspectiva humanista",
lembra ele.
Fazendo
do jornalismo a sua nau de civismo e de postura analítica
sobre as questões regionais, desenvolve na sucursal
nordeste da Folha de S.Paulo, dirigida à
época por Calazans Fernandes, inovadora experiência
de projetos editoriais temáticos, lamentavelmente
depois desvirtuada por finalidades inescrupulosas, e que
colocaram em cheque à sua natureza jornalística.
Como
se sabe, naquela época, diferentemente do projeto
da Folha, as "edições especiais"
das revistas Manchete e O Cruzeiro sobre
o Nordeste eram espécie de matérias pagas
disfarçadas que se voltavam para promover governantes
e empresários. Diferentemente desta via promocional,
que de certa forma alimentavam as receitas das empresas
de comunicação com os recursos das instituições
públicas e privadas da região, o projeto
editorial da FSP concretizava assim uma ambição
do jornalismo de pesquisa e de debate.
Chaparro
lembra que "os suplementos das Folhas eram projetos
editoriais pensados, escritos e controlados por jornalistas
sem qualquer interferência da publicidade".
Este
projeto fez escola e gerou efeitos de várias naturezas.
E em termos de jornalismo regional, representou uma das
últimas iniciativas voltadas para o jornalismo
investigativo, pois, vários fatores levam à
morte o jornalismo de análise voltado para a reflexão
sobre as questões nordestinas.
Chama
a atenção o fato de que, de certa forma,
no Nordeste suas forças internas, especialmente
as suas elites jornalísticas, não conseguiram
auto-formular um discurso jornalístico social e
político sobre a problemática regional,
à exceção de alguns jornalistas,
e, em momentos pontuais, as chamadas edições
especiais, atravessadas que eram por motivações
comerciais.
Foi
preciso que uma fala deslocada - do centro-sul -, de um
jornal paulistano, construísse discursos sobre
o Nordeste. Com isso, dizia para as elites dali que se
ela tinha projetos, não sabia fazer da comunicação
a instância das suas mediações.
Tal
circunstância, dentre outras, determinou a transferência
para São Paulo de toda a equipe da sucursal da
FSP do Nordeste, sediada em Pernambuco, e uma outra migração
de Manuel Chaparro, pois acompanha os companheiros que
para o Sul vieram, a fim de dar a amplitude a este projeto
editorial.
E
assim, a experiência que tem o Nordeste como objeto,
gera um filhote e enseja a criação do departamento
de suplementos especiais da Folha, dando-se, aí,
o esgotamento deste ciclo, pois o Nordeste deixa de se
constituir numa questão de agenda midiática,
pelo menos, nos termos das estratégias editoriais
realizadas na segunda metade dos anos 60.
Chaparro
parte para outras migrações na geografia
e no continente do próprio jornalismo, levando
consigo referências humanas, éticas e políticas,
adquiridas e vivenciadas no Nordeste, conforme ele mesmo
diz: "da experiência vivida no Nordeste ficaram
marcas fortes que influenciaram meus rumos. O Nordeste
me revelou, por exemplo, os malefícios que pode
causar à sociedade um jornalismo dependente do
poder político. O fato de entrar no Brasil, pelas
portas do Nordeste, permite a Chaparro elaborar significado
de um aprendizado que influenciaria seus rumos no Brasil",
conforme ele mesmo lembra.
"Um
aprendizado de Brasil que foi fundamental para a definição
de uma visão de país e de nação,
e também uma visão de mundo que ainda hoje
determina as minhas escolhas e perspectivas". Um
aprendizado que dá origem a uma atitude de reflexividade
acerca de uma auto-compreensão sobre o próprio
trabalho jornalístico, compreendido por ele como
"espaço de conflitos, onde é preciso
dar ver e voz à expressão discursiva dos
mais fracos".
Compreensão
radicalmente ética ao externar o papel e os limites
do lugar do jornalismo, diante do outro, o leitor, o cidadão,
e sobre o que ele assim pensa: "significa o entendimento
de um jornalismo em que o importante não é
o que o jornalista diz, mas o que os sujeitos sociais
têm a dizer e podem dizer, pelo que fazem e falam".
Certamente,
Chaparro já fez, em diferentes oportunidades, balanços
sobre esta primeira experiência que o traz ao ambiente
e à vida brasileira, tornando-o um cidadão
singular deste país, pois envolve dimensões
da sua vida, da sua qualificação profissional
e da sua sensibilidade social. Mas, um pormenor importante
deve ser lembrado.
É
o rico gesto de reconhecimento para com a realidade que
muito lhe ensinou e que se externa em meio a uma dose
de generosidade, afeto e humildade: "guardo dessa
época como lembrança mais acalentada, a
certeza de que é possível fazer jornalismo
comprometido com valores, quaisquer que sejam as condições
materiais. Guardo, também, um amor e uma fidelidade
radical ao Nordeste, ao seu povo e à sua cultura.
Foi um enorme privilégio ter entrado no Brasil
pelo Nordeste e ter conhecido a realidade brasileira pela
perspectiva nordestina".
Chaparro,
a riqueza de sua vida é celebrada e assim reconhecida
neste fórum celebrativo. E nele você faz
sobrar algo do ético e do humano que há
em você para também prestar o seu reconhecimento
às terras que lhe acolheram nos tempos da sua vida.
Ao fazer do Nordeste uma referência para a sua vida,
não se trata apenas de uma confissão, mas
também o reconhecimento compartilhado com o chão
e o povo que algumas coisas lhe ensinaram.
Como
migrante, você sabe perfeitamente que se acha sempre
alguma coisa, que lá está a nossa espera
pedindo ou manifestando reconhecimentos. Talvez o maior
capital da migração, a sensibilidade para
manifestar estes percursos.
*Antonio
fausto Neto, professor-titular do programa de pós-graduação
em Ciências da Comunicação-UNISINOS.
Consultor junto às agências de pesquisa (Fapesp,
CNpq, Capes, Fapece). Fundador da Compós, onde
ocupou as funções de vice-presidente e de
secretário.
|