Contributos
de Manuel Carlos Chaparro
ao jornalismo português... e não só
Por
Jorge Pedro Sousa*
Infelizmente
só este ano conheci pessoalmente Manuel Carlos
Chaparro. Já o conhecia de nome, pelas boas obras
que fez como homem, pesquisador, professor e jornalista,
mas as nossas vidas só se cruzaram pela primeira
vez, e momentaneamente, no nosso país natal, Portugal,
nos finais do passado mês de Abril, numa pequena
cidade de montanha, a Covilhã, por ocasião
do último Congresso Lusófono de Ciências
da Comunicação, o Lusocom.
Por
isso, para participar nesta homenagem, tive de recorrer,
como mandam, e muito bem, os manuais de jornalismo, a
várias fontes, pessoais e bibliográficas.
Como todo o jornalista, procurei, então, contrastar
as fontes pessoais.
Foi
tarefa inglória. As fontes não exibiam qualquer
contraste. Havia uma hegemonia de percepções
e cognições imposta pela força da
razão, do intelecto e da emoção,
ou seja, por uma classe intelectual dominante, ou, melhor
ainda, imposta por intelectuais com classe, designação
que me parece muito mais apropriada para designar as minhas
fontes.
E
qual foi a mensagem hegemónica transmitida pelas
minhas fontes, pelos meus pares, que justamente considero
intelectuais com classe? Muito simplesmente que Manuel
Carlos Chaparro foi e é um Homem com H grande.
De
facto, poucos se podem orgulhar, quando cumprem setenta
anos, de olhar para trás e contemplar uma vida
rica, produtiva e social e culturalmente consequente.
Manuel Carlos Chaparro, que hoje homenageamos, é
um dos homens que o podem fazer. E pode-o fazer porque,
como homem, jornalista, professor e pesquisador, teve
um percurso de vida em que a produtividade jornalística,
científica e docente só foi ultrapassada
pela dignidade e pela acolhedora e sorridente gentileza
que, disseram-me as minhas fontes confidenciais, Manuel
Carlos Chaparro sempre exibiu.
Quem
é, então, Manuel Carlos Chaparro?
Manuel
Carlos Chaparro, como muito bem o apelidou Marli dos Santos,
quando me convidou para esta sessão, é um
português, "brasileiro por opção".
Eu e os portugueses que escolheram o Brasil como país
de adopção percebemos e interiorizamos essa
escolha. A língua e o legado histórico e
cultural irmanam-nos e a natureza generosa, simpática
e acolhedora das nossas gentes facilita a nossa aproximação,
tanto quanto a beleza dos corpos possibilitou, há
vários séculos atrás, a nossa miscigenação.
Se
Portugal teve algum desígnio histórico,
ele chama-se, com toda a naturalidade, Brasil, um país
que atrai os portugueses como nenhum outro. Pediram-me
para falar dos contributos de Manuel Carlos Chaparro ao
jornalismo português. Pois o seu principal contributo
jornalístico e docente foi, precisamente, essa
aposta na interculturalidade, na projecção
do Brasil em Portugal e de Portugal no Brasil.
Manuel
Carlos Chaparro encarna, com toda a propriedade, uma redescoberta
do Brasil por Portugal e pelos portugueses e uma descoberta,
desta vez no sentido contrário, de Portugal pelo
Brasil e pelos brasileiros.
Ele
próprio aponta vantagens mútuas nessa redescoberta
do jornalismo português pelo jornalismo brasileiro
e vice-versa, redescoberta essa que só peca por
tardia, quando escreve, no livro Sotaques d'Aquém
e d'Além Mar, que "talvez um intercâmbio
responsável entre o jornalismo brasileiro e português
pudesse ensinar a elaborar aperfeiçoamentos recíprocos".
Infelizmente,
e como nós -portugueses- dizemos, "em casa
de ferreiro espeto de pau". Só nos anos 90
do século passado é que a comunidade universitária
das ciências da comunicação de Portugal
e do Brasil começou, de facto, a comunicar e a
comunicar-se, vencendo, de novo, o Oceano, cinco séculos
passados após a viagem de Cabral.
Manuel
Carlos Chaparro, a par de outro grande universitário,
José Marques de Melo, foi um dos pioneiros desse
descobrimento mútuo entre as comunidades brasileira
e portuguesa das ciências da comunicação,
que acompanhou, aliás, um percurso similar feito
pelas comunidades jornalísticas e publicitárias
dos dois países.
Como
pesquisador, Manuel Carlos Chaparro também ajudou
a lançar luz sobre o jornalismo português
e o jornalismo brasileiro, como muito bem se nota ao ler
o seu célebre livro Sotaques d'Aquém
e d'Além Mar, em que se manifesta a favor de
um enquadramento dos géneros jornalísticos
em esquemas narrativos, argumentativos e práticos,
ultrapassando a arcaica dicotomia anglo-saxónica
que distingue os géneros opinativos dos géneros
informativos e tenta separar a informação
da opinião.
Chaparro
mostrou também que as circunstâncias do mercado
influenciam mais os conteúdos e formatos do jornalismo
impresso brasileiro do que do português, já
que, em Portugal, o pólo intelectual no jornalismo,
na sua interacção com o pólo mercadológico,
teria mais força do que no Brasil. No entanto,
o conhecimento científico é apátrida.
Ao
lançar luz sobre a forma como o jornalismo é
praticado em ambos os países, Manuel Carlos Chaparro
ofereceu, afinal, novas ideias e conhecimentos às
ciências da comunicação universais,
pois é isso que, afinal, se espera de um pesquisador
do nosso campo científico. Neste sentido, Manuel
Carlos Chaparro é um homem do mundo, mas as implicações
das suas descobertas transformaram-no, também,
num homem que anda nas bocas do mundo.
É
importante também relembrar, em Manuel Carlos Chaparro,
o homem que se fez por si mesmo. Filho de operário,
o contacto com os livros estimulou nele o interesse pela
busca do conhecimento. Começou cedo a sua actividade
jornalística, em Portugal, como editor do jornal
Juventude Operária, da Juventude Operária
Católica. Mais tarde, também no nosso país
natal, trabalhou no Diário Ilustrado, tendo
rumado ao Brasil no limiar dos anos sessenta.
Quando
Manuel Carlos Chaparro rumou ao Brasil, encontrou um país
em pleno desenvolvimento urbano. Que contraste deve ter
sentido com a ditadura que amarrava Portugal ao subdesenvolvimento,
ao analfabetismo e à ruralidade!
Como
jornalista, ganhou logo vários prémios no
Brasil, tendo posteriormente optado por dedicar-se à
assessoria de imprensa e prosseguir os estudos que lhe
proporcionaram uma meritória carreira universitária
e o reconhecimento dos seus pares.
Não
são muitos aqueles que conseguem guindar-se cultural
e socialmente a uma posição superior unicamente
pelo mérito do seu trabalho, por isso há
que reconhecer a Manuel Carlos Chaparro as qualidades
de força, persistência e ambição
comedida que lhe permitiram singrar na vida profissional
e fazer dele um verdadeiro self made man, perdoem-me
o anglicismo.
Gostaria,
assim, de terminar como comecei. Também eu vou
emitir mensagens hegemónicas, também eu
me vou juntar à hegemonia, à classe intelectual
dominante, ou, como disse, aos intelectuais com classe.
Manuel Carlos Chaparro é um Jornalista com J grande,
um Pesquisador com P grande, um Docente com D grande,
um Brasileiro com B grande, um Português com P grande
e, afinal, um Homem com H grande.
Espero
por isso sinceramente que pelo menos nos próximos
setenta anos o professor Manuel Carlos Chaparro continue
a dar-nos o prazer da sua companhia e a engrandecer e
estimular a comunidade lusófona das ciências
da comunicação e do jornalismo. Muito obrigado
Prof. Chaparro e parabéns a você!
*Jorge
Pedro Sousa é professor associado e pesquisador
na Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal, tendo
vários livros e artigos sobre jornalismo e fotojornalismo
publicados em Portugal, Espanha, Brasil e Estados Unidos.
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