Opiniões
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Prêmio
pra que te quero - II
Por
Ivson
Alves
"Bom,
semana passada vimos o que os jornalistas ganham com a proliferação
dos prêmios de jornalismo, que deram de aparecer a três
por dois de uns anos para cá: a grana do prêmio
e o prestígio que também pode se transformar mais
plata se houver interesse de outro veículo
de levá-lo - o que, no entanto, não é garantido.
E o que ganham as empresas, tanto as de comunicação
como as que financiam os prêmios?
Vamos
começar pelo mais fácil, as financiadoras. Estas
ganham por dois lados: a propaganda gratuita e uma certa blindagem.
O primeiro ganho é quase direto, é só ver
o espaço obtido pela empresa ao ter seu nome trombeteado
em manchetes pelos veículos cujos profissionais foram
laureados (ahá! Eu sabia que um dia ia conseguir botar
essa palavra num texto em homenagem ao Orlando Batista, o
mais laureado locutor esportivo). Repercussão essa
que se multiplica no caso dos prêmios que apresentam categorias
regionais, também efusivamente comemoradas pelos veículos
que têm profissionais vencedores nelas.
O
segundo ganho da empresa patrocinadora do prêmio é
mais sutil, mas não muito. Me diga lá: há
alguma chance de um jornalista ganhar um concurso patrocinado
por uma telefônica com uma reportagem sobre como o custo
absurdo das tarifas de telefonia fixa no Brasil impede a universalização
do serviço, provoca uma inadimplência enorme e
é a causa de o país ter 10 milhões de linhas
sobrando? É mais fácil você sair à
rua agora e achar uma galinha estraçalhando um cachorro
a dentadas, né?
Vamos
ser claros: os prêmios andam direcionando parte das coberturas.
Mais em umas editorias do que em outras, mas andam. Nenhum veículo
que esteja a fim de conquistar um galardão em um determinado
prêmio na editoria de economia, por exemplo, irá
fundo nos meandros do mercado de distribuição
de derivados do petróleo, positivo? Pode até fazer
boas matérias sobre aspectos desta indústria e
elas saírem até vencedoras num prêmio patrocinado
por uma petroleira - mas desde que os aspectos não sejam
estratégicos para o setor como um todo e que, se uma
petroleira for atingida na apuração, não
seja a que patrocina o prêmio.
E
é por este caminho que chegamos aos ganhos das empresas
de comunicação. Como se sabe, durante a década
de 90, os marqueteiros não ganharam prestígio
apenas entre os políticos. Nas sedes das empresas de
mídia eles também passaram a dar as cartas, primeiro
com aqueles atlas, dicionários e coleções
diversas (lembra?), que doparam as tiragens de alguns jornais
em alguns milhares de exemplares. Hoje, eles já mandam
tanto que decidem até sobre o que as redações
devem escrever - em pelo menos dois jornais aqui do Rio os marqueteiros
sentam à mesa na hora de decidir se um caderno especial
ou um novo produto (é assim que eles chamam as publicações)
será editado. E o que falam tende a ser levado mais em
consideração pelos executivos das empresas - normalmente
bons em contas, mas que entendem quase nada de jornalismo -
do que o dito pelos jornalistas.
Ora,
depois do fracasso de manter as tiragens dos jornais em alta
com anabolizantes de cultura show do milhão,
os marqueteiros descobriram que o produto que os
jornais entregam todo o dia nas bancas (e os telejornais e radiojornais
em casa) chama-se notícia, envolta num papel no qual
se lê em letras bonitas a palavra credibilidade. Bem,
raciocinaram os marqueteiros com aquela profundidade que é
apanágio da profissão, temos que arranjar
um tipo de credibilidade que facilmente possa ser reconhecida
pelo público e que possa ser sempre renovada.
A
descrição lembra-o/a alguma coisa?
Assim,
criou-se mais um tipo de matéria nas redações,
sejam de jornais, rádio ou tevês: a reportagem
para prêmio. Normalmente são trabalhos grandes
- até mesmo séries de matérias - sobre
assuntos importantes - um ganho inegável por este ângulo
- mas que tendem a ser sensacionalistas, pegando o aspecto mais
espetaculoso do assunto, a fim de se obterem manchetes ou chamadas
mais impactantes. Este, porém, é apenas um dos
problemas que as reportagens para prêmios - que acabam
por contaminar outras, pois, afinal, qualquer matéria
hoje pode ter veleidade de abiscoitar um premiozinho amanhã,
desde que seja escrita e editada de maneira bem palpitante.
Outros aspectos negativos existem e falarei deles na semana
que vem, quando pretendo encerrar essa série.
Sem
razão
A
reação do JB ao fato de ter recebido apenas R$
86 mil da campanha pelos 50 anos da Petrobras não se
justifica, em minha opinião. Afinal, infelizmente, o
jornal é cada dia mais relegado a segundo plano até
no Rio, tendo perdido leitores aos borbotões na última
década. Se ganhasse verbas na mesma proporção
de jornais muito mais lidos como Folha, O Globo e Estado de
São Paulo, aí sim seria um escândalo, não
é?"
Fonte:
Portal Comunique-se, 12/01/04.
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