Arquivo
Thomaz
Farkas:
lembranças de um fotógrafo
Por
Conceição
Freitas
Correio Braziliense
Exposição
no Rio de Janeiro exibe fotos da construção de
Brasília feitas pelo incansãvel Thomaz Farkas,
o húngaro que não se esquece da alegria dos operários
depois que terminavam as obras.
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Visitantes
no dia da
inauguração de Brasília
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O
álbum de fotografias da construção de Brasília
parece inesgotável. A cada dia surgem registros desconhecidos
do período, feitos por fotógrafos consagrados.
Assim é que Thomaz Farkas tirou de seus guardados fotogramas
da cidade sendo construída, juntou com outros feitos
no Rio de Janeiro e São Paulo e montou exposição
no Instituto Moreira Salles no Rio de Janeiro. Há também
fotos de Brasília dos anos 90.
Farkas veio pela primeira vez ao Planalto Central a convite
de um dos arquitetos que participaram do concurso do Plano Piloto,
Jorge Wilheim. Depois disso, seguiu acompanhando as obras da
nova capital, veio para a inauguração, deixou-se
levar pela alegria dos candangos. Lembra que eles entravam no
Palácio do Planalto, andavam entre as cúpulas
do Senado e da Câmara, abraçavam Juscelino Kubitschek,
numa euforia de vencedores, porque acabavam de construir uma
cidade. Percebi, emocionado, a felicidade que provocava
o final da construção.
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Primeiros
barracos no início
da construção de Brasília
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O
húngaro Thomaz Farkas, 77 anos, é um incansável.
Foi professor da Escola de Comunicação e Artes
da Universidade de São Paulo, fundou a Galeria Fotoptica,
a primeira no país dedicada exclusivamente à fotografia.
Fundou a Revista Fotoptica; produziu e co-produziu mais de 30
documentários de curta e média-metragem e oito
longas. É um dos fundadores do Museu de Arte Moderna
de São Paulo e atual presidente do Conselho da Cinemateca
Brasileira. Mas, por esses dias, está nos Lençóis
Maranhenses descansando e fotografando, porque, como ele mesmo
diz, não há como separar uma coisa da outra.
As imagens que Thomaz Farkas pôs no papel fotográfico
registram não somente as obras em construção,
mas o povo que se apropriava na nova capital, o modo de vida
dos candangos, os barracos de madeira na Cidade Livre. No início
do ano 2000, Farkas voltou a Brasília a convite do Correio
Braziliense e percorreu a cidade à procura de lembranças,
mas o que viu foi um outro espírito brasiliense: Agora,
as pessoas não estão mais construindo a cidade,
estão preocupadas em construir suas vidas.
Fotos dessa
visita recente também fazem parte da exposição.
As mais de 60 fotos de Brasília, Rio e São Paulo,
são, na verdade, um álbum de lembranças
das cidades onde vivi, trabalhei, encontrei amigos. São
fotos engraçadas, divertidas, saudosas. Seja o que mais
for, são as minhas lembranças de vida de um fotógrafo,
diz Farkas, o fotógrafo precioso que nem por isso se
preocupa em saber se o que faz é arte ou não.
Se fotografia é arte? Sei lá! O fotógrafo
tem que fotografar e pronto.
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Brasília
revisitada,
40 anos depois
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Alguns
dos fotógrafos que registraram a construção
de Brasília já eram consagrados quando aqui estiveram.
Eram e continuaram sendo. Farkas é um deles, mas há
também o francês Marcel Gautherot que veio fotografar
as obras de Oscar Niemeyer, a pedido do arquiteto, e produziu
as mais belas imagens da cidade que nascia. Essas fotos fazem
parte do arquivo que o Instituto Moreira Salles comprou da família
do fotógrafo, há dois anos. Morto em 1996, Gautherot
deixou perto de 25 mil negativos em preto-e-branco, registros
de suas andanças país adentro.
O brasileiro, filho de alemães, Woof Jesco von Puttkamer
fez mais de 5 mil fotos da construção de Brasília.
Como tradutor do Departamento de Relações Públicas
da Novacap, tinha por função acompanhar os muitos
visitantes estrangeiros que vinham conhecer o canteiro de obras
da cidade. Depois de 40 anos guardadas, as fotos foram recentemente
reunidas no livro Brasília sob o olhar de Jesco, publicado
pela Universidade Católica de Goiás e a Fundação
Assis Chateaubriand.
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As
estruturas monumentais
da cidade em construção
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Mas
se Farkas, Gautherot e Jesco passaram por Brasília e
seguiram em ascensão profissional, o piauiense Mário
Fontenelle teve triste destino. Mecânico de aviões,
veio para Brasília com Juscelino Kubitschek e passou
a fotografar a cidade. É o autor da foto histórica
dos dois eixos se cruzando no cerrado ainda inabitado, feita
em julho de 1957. É dele também a foto de Lucio
Costa e JK encostado numa placa de Avenida Monumental, em abril
de 1957.
Fontenelle fotografou a construção da cidade,
do primeiro ao último dia, mas morreu abandonado num
asilo, amargurado: Não tenho inimigos. Mas
se tivesse, não desejaria isso para eles, como não
desejo para ninguém. Um ano antes de sua
morte, procurado para uma entrevista, pediu ao repórter:
Me deixe em paz, rapaz. Não faça mais
perguntas. Tudo acabou. Tudo passou. Mário
Fontenelle morreu em 23 de setembro de 1986. Dois anos depois,
amigos e admiradores publicaram Minha mala, meu destino, livro
com algumas de suas fotos mais conhecidas.
Brasília,
domingo, 14 de julho de 2002.
Fonte:
Correio Braziliense.
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